Nigel tentou ligar para Miranda e pedir um grande favor: convencer Andrea a não ir a um país tão instável como a Síria. Pelo menos não num período conflituoso entre aquela região e os Estados Unidos. Se eles tivessem de ameaçar banir sua carreira, que o fizesse, então. Mas além de não conseguir entrar em contato com La Priestly, ainda caiu em si e percebeu que nem Miranda faria isso, por mais que nutra um afeto inominado pela garota, e nem o deixaria terminar de falar, já que o assunto aparentemente não lhe diz respeito. Ou então — e este pra ele é o mais provável —, ficaria extremamente chateada com sua tentativa de influenciá-la a passar por cima da capacidade civil da ex-funcionária. Na surdina, ainda menos.
Miranda pode ser difícil, mas jamais duvidaria da capacidade de alguém que um dia julgou competente. Se esse alguém for Andy Sachs, torna-se intermitentemente intangível. Bom, pelo menos foi isso que ele pensou.
Andrea, por sua vez, inventou de ir dar continuidade ao seu trabalho, mas agora especificamente sobre crianças que teriam sua vida inteira marcada por resquícios de uma guerra interna constante. Além do envelhecimento de todos naquela região por causa dos anos e anos de tensões entre países vizinhos, ainda tinha cicatrizes oriundas de bombardeios e tantas outras afrontas à sua paz. Seria o trabalho da vida de Andrea. Ela não tinha nada a perder. Nigel acompanhou seus e-mails e entendeu que o desejo de fazer diferença na vida de alguém era latente em sua amiga. Por mais medo que tivesse, se ela não tinha, não seria ele quem iria interferir. Não diretamente e nem pessoalmente, talvez outra pessoa e ele sabia exatamente quem.
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Na vida, muitas vezes, só queremos que alguém nos abrace e diga que tudo irá ficar bem. Às vezes, queremos que nos digam o que fazer. No fundo sabemos — nem sempre estamos tão perdidos —, mas ter alguém que legitime o que temos em mente já é suficiente pra dar o primeiro passo. Pode ser a mãe, o pai, o amigo, a amiga de décadas, o senhor que encontramos no ônibus ou a moça com quem dividimos o táxi. Basta uma palavra alheia em concordância com a nossa conversa interna e "pronto!", decidimos fazer acontecer.
Até mesmo as pessoas mais autossuficientes, precisam que as digam que nem tudo dará errado, que às vezes uma ideia louca faz algum sentido.
Existem pessoas que são conhecidas por serem grandes pensadoras, conseguem destrinchar qualquer teoria densa e modificá-la, recriá-la, melhorá-la. Existem pessoas que são conhecidas pela praticidade, pela grande e invejável capacidade de tirar do campo das ideias projetos inacreditáveis.
Miranda era a junção desses dois tipos de pessoas. Ter quem a dissesse que ela estava deixando as coisas acontecerem sem tomar as rédeas, ainda que numa parte relativamente pequena em sua vida, ela não aceitaria de bom grado. Porque mesmo que seja um assunto pouco ou quase nunca revisitado, ela sabia que algo precisava ser feito e que partiria dela.
Isso de encontrar o momento perfeito, para os impulsivos, não passa de bazófia, de balela. Mas mesmo nos mais intempestivos, há o entendimento de que alguns movimentos devem ser feitos de maneira sábia. Sem pressas desnecessárias. Se levar tempo, tudo bem. Ninguém o controla, mesmo que muita gente manipule relógios. Acontecerá o que tiver de acontecer, e ela faria por onde acontecesse. Sabe ela o quê.
Esses pensamentos arquejam até nos dias em que tudo parece muito corriqueiro...
— Meninas, não tem negócio. As aulas voltarão mais cedo esse ano. Preparem-se, pois já sabem que quero todo esforço necessário pra manutenção do padrão de notas que a mamãe gosta. Espero que estejamos de acordo. — ela diz, direcionando os olhares para as filhas sentadas ao seu redor.
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Você não vê [em hiatus]
FanfictionNinguém abandona Miranda Priestly e fica vivo para contar o conto. Ninguém. Até Andy. "Faz 6 meses desde Paris e eu não consigo lembrar a última vez que sorri de verdade desde lá. Faz 6 meses que tenho mentido pra mim na esperança de um dia poder...