Capítulo IX - First things first

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A última vez que Miranda esteve em Londres, não foi uma ocasião interessante de se recordar. Sempre que estava em solo inglês, milhares de perguntas rondavam sua mente intermitentemente. Tantos anos depois e pouco parece ter mudado. Alguns dos poucos amigos de infância se tornaram amigos de sua família, outra parte já deve ter morrido pelo vício descabido em cigarro. Um povo tão viciado em chá não deveria morrer por causa de tabaco. Até o tipo de droga é chato.

Vir a trabalho era bem mais confortável do que isso, mas ela precisava superar essa aura estranha que ainda pairava nessa cidade. E o mais importante, desmistificar a cidade também para suas filhas. Talvez pudesse começar a apagar algumas lembranças através de uma figura bastante familiar, parada, à espera de algum cortejo. A única pessoa que dividia seu sobrenome por quem ainda tinha apreço. As meninas o avistam e, apesar de um pouco reticentes, vão em sua direção. Quão clichê ser recebida no aeroporto! Isso nunca aconteceu. O que eu fiz de errado pra receber isso? Ainda bem que aqui não vão me reconhecer tão rápido. Thanks God! E lá vamos nós...

— Mira! Quanto tempo... — aquela voz familiar e o sotaque carregado lhe soava tão real, agora em sua frente, que podia jurar sentir a língua abraçar o tom e revelar sua origem.

— Um longo e precioso tempo, meu caro. — o encara por alguns segundos antes de ser tomada num abraço. Quem diria que teria que sair dos Estados Unidos pra receber um abraço de outro adulto em outro país. O azar era porque ela nem sabia mais como ser abraçada de forma sincera, ainda que desajeitada.

Tensa do jeito que estava, não conseguiu relaxar no abraço. Parece que esses dias seriam longos...


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— Você pretende mesmo fazer isso? — olha um tanto descrente — Digo... Logo você?

Ela estuda os traçados do assoalho, envolve as duas mãos na caneca fumegante e deixa o ar entrar e sair, quase numa meditação.

— Pensei muito... Já está resolvido. Não vim te pedir conselho e nem estou aberta a críticas ou sugestões, que fique claro — diz olhando pra ele.

— Hum... Como queira — encara um canto do sofá mas volta seu olhar pra ela — As meninas sabem? — questiona.

— Minhas meninas querem o melhor pra mim, tenho certeza disso, e o melhor pra mim é estar perto delas. — diz tentando parecer convicta. O que ela estava, mas é sempre bom não deixar margens pra dúvidas.

— Claro que sim, Mira... — ele percebe o deslize quando ela volta o olhar pra ele — Miranda. Esse é o seu nome, me desculpe. Não imaginava que depois de tantos anos você ainda teria mágoa de um apelido carinhoso.

— Não seja ridículo! Não é mágoa. Você sabe que não há carinho nisso, Michael. Não vamos discutir a respeito. — diz com firmeza.

— Miranda, olhe pra mim. — ela o faz — Eu não sei o que mais preciso dizer pra que você entenda que não é igual à mamãe. Nem de longe. Essas lembranças não deveriam te acompanhar até hoje, depois de tantos anos. — ela abre a boca pra falar e ele a impede — Nós sabemos que as meninas vivem muito bem, que veem em você um modelo de mulher e de mãe. Você não precisa abrir mão de uma coisa pra poder ter a outra.

— Puf! Não vamos falar em abrir mão, ok? — exaspera.

— Sim, sim, sim. Saia dessa defensiva, eu não estou te julgando. Quero o seu bem, sempre quis. — bufar não era tão comum dela quanto se revelava nos últimos 30 segundos — Nossas vidas seguiram rumos diferentes. Foi mais confortável pra mim, eu sei disso, e a mamãe não foi pra você o que foi pra mim. — toma um gole de chá e encara o rosto à sua frente — Mas veja o que você fez! Mostrou a todos nós que era forte o suficiente pra cuidar da própria vida. Papai não valia muita coisa, mas sempre acreditou que seu lugar era na América. Mamãe odiava qualquer lugar que excedesse seu lugar de origem.

Você não vê [em hiatus]Onde histórias criam vida. Descubra agora