eighteen - a year without rain

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São 7:52. Estou apenas deitado. Confuso, perdido, de coração partido. Demorou horas até conseguir sequer adormecer, a chorar. Não conseguia, não tinha o teu conforto. Estava sozinha quando não o podia estar. Não tinha o teu abraço ou o mais remoto sinal de afeição da tua parte.

Acordei de um sonho perturbador. Tudo à minha volta se estava a desfazer em pedaços. Eu tinha de passar um teste que decidi fazer do nada e pensei para mim que tinha de te contar sobre isso... e percebi que não podia. Ao longo do sonho, falhei em todas as maneiras possíveis e imaginárias. Fui o único que não o completou, deixando-me a questionar se era uma metáfora para algo maior. Acordei assustado. Após uma noite horrível, tinha terminado de uma forma insuportável. Mas aí, apercebi-me de que o meu pesadelo estava somente a começar, porque não estavas lá...

[Matthew]

- Autumn, não, não quero – resmunguei, tentando convencer a rapariga mais teimosa do mundo.

- Vá lá, preguiçoso. Levanta-te dessa cama.

- Não quero. Não há nada melhor do que esta cama.

- Claro que há. Existe um mundo para além dessa cama.

- O mundo não presta – respondi – É cruel, insensível e aborrecido.

- Acho que não temos vivido no mesmo mundo. Vá lá, Matt. Temos de fazer algo. Não vais passar a tarde toda aí. É domingo, vamos fazer algo divertido.

- Mas eu...

- Nem venhas com a história de que tens de estudar, sei perfeitamente que não tens – ela interrompeu-me antes que tivesse oportunidade de dizer o que quer que fosse.

- Como?

- Nash.

- Ele tem sempre de estragar tudo, é impressionante as capacidades que ele tem de arruinar a minha vida.

- Que vida? – ela perguntou – Tu querias passar um domingo à tarde neste quarto. Como é que ainda podes achar que tens uma vida?

- Também não precisas de ser assim – fingi-me ofendido.

- Vá lá – Autumn abanou-me e a minha voz tremia quando tentava reclamar. Começo a achar que era esse o seu plano inicial, tornar-me incapaz de reclamar.

- Porque é que queres tanto que saia daqui?

- Não te posso dizer.

- Como assim não me podes dizer? – eu perguntei confuso.

- Eu prometi que não te dizia – ela disse rindo.

- A quem?

- Lá está outra coisa que não te posso dizer – ela respondeu e riu-se de novo.

- Autumn, que é que está a acontecer?

- Estou prestes a levar-te para uma armadilha. Esse sempre foi o meu plano inicial. Nunca gostei de ti – ela falou.

- Sabes que, devido a experiências do passado, eu ainda duvido quando dizes que não gostas de mim? Não devias fazer isso – eu disse.

- Desculpa. Não tinha noção de que te sentias assim. Mas não devias ficar tão ligado ao passado. Ou àquilo que eu digo. Acho que conta mais aquilo que eu faço.

- Depende. Tu não és um tipo específico.

- Como assim? – Autumn questionou.

- Tu nem és uma pessoa de ações nem uma pessoa de palavras. Acho que és a perfeita mistura. Ficas no meio e sabes quando agir e quando não o fazer. É estranho, não sei sequer como fazes isso.

- Não tinha consciência disso, por isso, é inútil perguntares-me. Sei tanto como tu – ela riu-se – Quer dizer, na realidade, acho que sei menos. Sempre achei, e continuo a achar, que me conheces melhor do que eu mesma. Quando eu duvido de mim és tu a pessoa que acredita que vou conseguir fazer algo, de alguma maneira acho que sabes que vou conseguir. Eu é que não sei como fazes isso.

- Conheço bem os teus pontos fortes e as tuas limitações. Acho que isso torna a tarefa bastante fácil. Por exemplo, sei que neste momento gostarias, e aposto que já te passou pela cabeça, de me atirar com água. Porém, sei que não o farias porque tens demasiada compaixão pelos outros.

- Não me testes, Espinosa.

- Autumn, por favor – eu falei despreocupado – Sei perfeitamente que nunca farias isso. Até porque, com todas as cócegas que eu te faria de seguida, não irias poder contar essa história.

- É esse o teu grande plano? Matar-me com cócegas? – ela falou num tom de troça e riu-se.

- Não me testes. Sabes bem do que sou capaz – fiz um sorriso malicioso e Autumn sorriu.

- Sei? Acho que não serias capaz – ela desafiou.

- Boa tentativa. Só queres que eu saia da cama.

- Não se chama "tentativa" se resultar – Autumn continuou no mesmo tom.

- Não vai resultar, por isso, sim, é uma tentativa.

- Alguém tem medo. Temos uma galinha aqui – Autumn começou a cacarejar.

- Muito crescida que tu és.

- Deixa lá. Gosto de ser assim.

- Não sei porquê – provoquei-a.

- Talvez porque sou a melhor pessoa que alguma vez já conheceste.

- Achas mesmo isso? – perguntei com um claro tom de brincadeira.

- Claro – ela respondeu de forma confiante.

- Parece que alguém tomou uma dose grande de ego ao pequeno-almoço.

- Não se chama ego, mas sim amor próprio. E acho que também devo ter tomado um bocadinho de soro da verdade ou algo do género.

- Foi o que pensei. Achei que soaria estúpido dizer isso em voz alta mas tu fizeste isso por mim. Já não sou eu que pareço estúpido, ao menos isso.

- Por favor, tu pareces sempre estúpido.

Assim que Autumn terminava de falar vi que esta estava prestes a tropeçar. Levantei-me o mais depressa que consegui e, por sorte, consegui agarrá-la. As nossas respirações estavam ofegantes e tudo pareceu desaparecer por um momento.

- Sabes que se eu não estivesse aqui poderias ter-te magoado muito? Estavas prestes a bater com a cabeça, poderia ter sido grave – eu disse e ela assentiu.

- Parece que afinal te levantaste da cama.

- Parece que sim – respondi.

Os meus braços seguravam-na com toda a força do mundo. Só conseguia pensar no que poderia ter acontecido se eu aqui não estivesse. O meu instinto protetor tomava conta de mim e não conseguia largá-la. Não podia deixar que se magoasse.

E como se não o conseguisse controlar, como se uma força maior estivesse a governar todo o meu corpo, não consegui impedir-me de beijá-la. Quando dei por mim já o estava a fazer. O seu beijo estava carregado de saudade e eu sentia exatamente o mesmo. Por momentos, senti que, até agora, não tinha noção do quanto sentira a sua falta. Era um sentimento maior do que eu, sentia que não caberia dentro do meu pequeno corpo. Sentia que ultrapassava tudo e todos e não havia nada que pudesse ser dito, que pudesse ser feito, para aquele sentimento se alterasse. Senti que era maior do que o próprio universo. Eu amava aquela rapariga com todas as minhas forças, tanto que o temia. E temia ainda mais nunca ser capaz de viver sem ela novamente.

Autumn parou o beijo por falta de ar, mas eu sabia que isso era o que menos lhe importava. Estávamos envolvidos em tanta saudade e paixão que sentia que podíamos sufocar e não daríamos por isso. Olhei-a nos olhos e queria dizer-lhe tanta coisa. Queria dizer-lhe que a amava mais do que tudo, que nada nem ninguém alguma vez se iria comparar a si ou a este sentimento, que ela era a minha vida e não podia continuar sem ela. Porém, não o fiz. Este momento era nosso. Apenas nosso. Não merecia ser estragado ou interrompido com as nossas complicações. Se falássemos tudo ficaria pior. Ali, naquele momento, olhando-a profundamente nos olhos, eu sabia que ela era tudo o que importava para mim, e só esperava que ela sentisse o mesmo.

Trust (Autumn's Sequel) | MEOnde histórias criam vida. Descubra agora