— PASSADO.
— Filha? - Ouço meu pai chamar do outro lado da linha, com um tom preocupado, fazendo com que eu me disperse completamente do que estava procurando.
— Sou eu. Tá tudo bem?
— Sim! Só queria saber quando você volta.
Dou uma risadinha, pois apesar de parecer másculo e tudo mais, meu pai é bem carente as vezes.
— Já tô saindo. Vou dar tchau para os meninos e chego aí rapidinho.
— Hmm... - Ele fica um pouco em silêncio, fazendo com que eu consiga ouvir sua respiração calma - Tô com saudade...
Sorrio ao ouvir isso.
— Já está sentindo minha falta, é? - Rio fracamente.
— Se você continuar me acusando, eu não vou mais admitir isso! - Ouço o barulho de algumas coisas caindo.
— Tudo bem, parei! Você quer que eu leve alguma coisa?
— Trás algo de chocolate, por favor. - Diz desatento.
— Ok. Já já estou aí.
Encerro a chamada e volto para dentro da cafeteria, peço um donut de chocolate para o papai e volto para a mesa onde Susan e James estão me encarando.
— Desculpa a demora, meu pai estava ligando.
— Relaxa, Kath. - Diz James.
— O que ele queria? - Interroga Susan.
— Queria saber quando eu volto para a casa, e chocolate, é claro.
— Mas ele pode ficar comendo esses doces? Por causa do... - Ela olha para os lados, claramente desconfortável - Você sabe.
Suspiro.
— De vez em quando, não faz mal. Eu estou sendo boazinha com ele ultimamente, já que ele fica muito sozinho.
— É... - James diz.
Após essa fala, fica um silêncio incômodo. Como sempre, já que não é algo que eu goste de conversar, e por ser um assunto delicado eles também não se sentem a vontade.
— Bom, eu tenho que ir agora. Beijos - Digo ao ver meu pedido pronto, e mando um beijo para eles.
— Tchau, até amanhã. - Susan responde.
Levanto, e ando até o balcão para pegar o pacote do donut. Saio do recinto, e coloco meus fones, porque isso me distrai dos pensamentos que não quero ter.
Chamo um táxi, e em alguns minutos chego em casa.
Casa.
Minha casa não é tão grande, mas ela é muito aconchegante e bem colorida, apesar de não parecer se você estiver olhando de fora, pois a fachada da casa é toda em branco. Ela tem um quintal bem florido, e um cercadinho envolta. Já por dentro, é quase um arco-íris, pois meu quarto é em um tom de azul celestial, a sala é verde musgo, a cozinha amarelo e o quarto do meu pai é vermelho, mas não um vermelho forte, e sim um vermelho... pastel?
O motivo dessa paleta de cores, é a minha mãe, é claro. Ela dizia que devíamos ser alegres e fortes, igual as cores do arco-íris, independente do que acontecer.
Mas depois de sua morte, as vezes fica difícil. Meu pai sofreu mais do que eu, tanto que lhe causou sequelas. Mas eu nem tenho muitas memórias dela, porquê eu tinha apenas seis anos.
Apesar de tudo, eu me mantenho forte e saudável pelo meu pai, e em partes, por ela.
Abro a porta, entro, e enquanto a tranco vou tirando meus fones deixando todo o ambiente silencioso, o que é estranho.
— Pai? - Chamo por ele.
Não obtenho respostas.
— Pai? Agora não é hora de brincar de esconde-esconde. - Digo mais alto, e ouço um barulho na cozinha.
Vou correndo até lá, e encontro todo o cômodo revirado. Pilhas de panelas, pratos e copos quebrados, e ele no meio de toda essa bagunça com os olhos inchados e o rosto vermelho.
Imediatamente, me aproximo dele, ouvindo sua respiração ofegante.
— Ei... o que houve? Hmm? - Digo baixo e calmo.
Ele olha para mim como quem pede desculpas, e começa a tagarelar.
— Me perdoe, eu não queria ter feito tudo isso, eu... eu não queria te dar trabalho! Me desculpa!
Seguro suas mãos, e o puxo para um abraço.
— Relaxa, certo? Está tudo bem agora. - O mantenho em meus braços até ter certeza de que ele se acalmou.
Me afasto e percorro meu olhar pelo seu corpo, para ver se acho algum ferimento.
— Você se machucou? - Pergunto preocupada.
— Só na minha mão - Ele vira a mão direita, e posso ver um corte não tão fundo, e com sangue seco ao seu redor.
Ajudo ele a levantar, e o tiro do meio daquele caos. Sento ele na minha cama, e pego a caixa de primeiros socorros dentro do meu guarda roupa. Seguro novamente em sua mão, e começo a limpar e preparar o curativo.
Ao terminar, vejo ele me encarando, e me sinto um pouco desconfortável, mas nada que me atrapalhe.
— Fica aqui, vou buscar um remedinho para o senhor.
Ele assente, e pego duas cápsulas, um copo de água e o donut dele. Volto para o quarto e encontro o mesmo olhando o porta retrato em cima do criado-mudo ao lado de minha cama. Estávamos nós três na foto.
— Pronto, esses dois remédios vão melhorar sua dor, pega - Entrego o remédio e ele o toma.
Bom, ele não precisa saber qual dor vai aliviar.
— Eu trouxe um donut recheado de chocolate para você! Gosta? - Pergunto enquanto entrego o pacotinho.
— Muito! - Ele diz baixinho. - Obrigado.
Vejo ele comer, e quando termina, se deita, logo, não demora muito para ele dormir.
Respiro fundo, e cubro ele com um cobertor, sei que ele precisa descansar, então saio do quarto. Vou até a cozinha e começo a organizar toda a bagunça, dando-me conta de que ficamos em um prejuízo de louças.
Preciso acompanhar o comportamento dele, pois se ele piorar, será mais difícil que da última vez, e também preciso de comprar copos de plástico, assim não tem o perigo de ele se machucar de novo.
Ao terminar, tomo um banho, deixando a pressão psicológica e tudo o que me afeta escorrer junto da água do chuveiro, o que me deixa mais leve, de certa forma.
Quando me preparo para dormir na sala, tenho a sensação de que amanhã será um longo dia, mais até do que hoje foi.
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Elements;; [HIATUS]
Misterio / SuspensoÉ possível sentir que algo terrível está por vir? E que não importa o que você faça, isso vai acontecer? Odeio me sentir impotente, e isso vem me atormentando a dias. Não quero pensar muito nisso, pois se eu pensar vou entrar em uma teia de aranha...