- O tal hippie-padre – Dizia Regis – pode nos fornecer um pouco de dinheiro.
- O que? – perguntou o próprio, enquanto o suor ainda lhe escorria pela testa, o que não parava de acontecer. Ele fingiu não ouvir. – Podiam me ajudar com o pneu, camaradas? Não é comum isso, mas é uma ótima oportunidade de demonstrarem sua caridade. Espero não estar sendo abusado.
- Claro amigo – disse Regis. – Assim que você passar todo o seu dinheiro pra nós. Um pré-pagamento, uma entrada pelo serviço.
- Sim, claro – eu disse, sorrindo como uma criança banguela.
- Hein?
- Você está com azar, bicho – eu falei, enquanto o cara passava a carteira.
- Tchau, sortudo! – Regis sorriu antes de cantar pneu e deixar o cara para trás, sem a carteira. Mas o que fazer quando se tem uma 44 apontada para você?!
- Regis, na carteira dele só tem cinquenta centavos.
- O que?! Isso é patético. Vamos voltar e atropelar ele.
- Não!
- Qual é?! Está ficando bonzinho?
- E quando eu fui uma pessoa má em minha vida? Você parece estar me interpretando de forma equivocada, caro amigo. Não o culpo, uma vez que sua mente parece já estar em um estágio de sordidez sem volta. Só acho melhor dar um tiro em cada perna e largar ele no meio da pista, idiota.
- Ótima ideia. Faremos isso depois de uma sova, é claro.
– Pronto. Naquele momento a minha alegria e a de Regis estavam feitas. Não seria uma sessão comum de espancamento; seria uma oportunidade única de praticar vários tipos de artes marciais com algo que era um pouco mais ágil que uma boneca inflável. Uma experiência excitante e animadora, ótima para começar um dia difícil. Quebramos todos os dedos da mão esquerda dele e pisamos só umas duas vezes em sua cabeça, para que não parasse de se mexer muito rápido. Por fim ficamos exaustos e com forças suficientes apenas para voltar para o carro. O tiro nas pernas foi uma ideia legal. Eu atirei e deixamos o padre-hippie no chão, semimorto. Regis me parabenizou pelos belos tiros, dados a uma distância de uns quatro metros.
- Sim, foram belos tiros. Eu sei, eu vi. É um prazer cheirar essa pólvora.
- Mas João... Você não disse que estava sem suas balas? – estranhou Régis.
- Sim, mas peguei algumas do chefinho. Na verdade todas. Vi que ele guarda no armário da garagem. Ele não sabe ainda que eu peguei, nem saberá.
- Não é perigoso?!
- Não se preocupe com isso. Ele não usa aquela arma há uns dois anos ou mais, concorda? Depois eu compro outras balas e coloco no lugar. Só tem um pente, o mesmo pente, e eu deixei o pente e tirei as balas...
- Você é quem sabe. Um momento, eu estou apertado. Preciso mijar!
Naquele momento eu esperava que não, mas aconteceu de novo. Eu fiquei só, o padre-hippie desmaiado, Regis atrás da pedra... As criaturas apareceram e me importunaram de uma forma nova e terrível eles queriam sugar os líquidos das minhas orelhas ou algo assim. Quando entramos no carro, eu estava branco de medo, confesso, e Regis estava com uma coloração estranha. Ele acelerou como um psicopata e correu muito, enquanto dizia que precisava viajar urgentemente. Então ouvi o som apavorante de buzina na minha cabeça, mas já havia ouvido antes...
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A Alcatéia
Ficción históricaChapada Diamantina, anos 70. Dois assassinos de aluguel não muito discretos percorrem estradas caçando vítimas a esmo e planejando novos crimes. No caminho encontram todo o tipo de figuras e compartilham suas histórias, mau-humor e falta de educação...