Capítulo V

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As águas geladas tragavam seu corpo cada vez mais fundo, deixando-a completamente submersa. Seus pulmões queimavam, sentindo o terrível gosto salgado invadindo sua garganta, sufocando-a cada vez mais. Lizzie tentava nadar, tentava mover seus membros de forma coordenada, mas tudo o que via eram as brumas criadas pela água do mar, lhe envolvendo e lhe consumindo.

Precisava respirar... Precisava que o ar inflasse seus pulmões... Precisava acordar!

Com um grande suspiro, Lizzie abriu os olhos e sentou-se ereta na cama. Respirava de forma ofegante enquanto tentava convencer a si própria que tudo não passara de um pesadelo, mas por algum motivo suas mãos continuavam tremendo e seu rosto estava coberto por uma fria camada de suor. Ela sentia o pânico correndo por suas veias enquanto seu coração batia disparado, como sempre acontecia quando tinha aquele tipo de pesadelo... Sem pensar duas vezes, levantou-se da cama e foi até a terrina de cerâmica que ficava próxima à janela, onde lavou o rosto com água fria na obvia intenção de despertar totalmente.

Céus... Até quando continuaria tendo aquele tipo de pesadelo? Por que sua mente teimava em fazê-la reviver o maldito naufrágio? O pior de tudo é que nunca saberia se aquelas recordações realmente aconteceram ou se tudo não passava de sua imaginação fértil lhe pregando peças.

-Vou acabar ficando louca. – Sussurrou para si mesma enquanto ia até a lareira e remexia as brasas com a ajuda de um atiçador.

Podia ouvir a chuva caindo lá fora de forma torrencial e isso lhe fazia desejar que o dia amanhecesse o quanto antes. Não podia voltar a dormir. Tinha medo de que os sonhos voltassem, mas também não queria ficar ali sozinha com seus pensamentos...

Desde que a imagem de sua mãe fora maculada por acusações como furto e adultério, Lizzie passava a maior parte das noites em claro, tentando por sua mente em ordem. Não podia aceitar aquele fato... Não podia acreditar que era fruto de um caso extraconjugal! Logo ela, que sempre se orgulho de ser filha de uma mulher honrada e que mesmo viúva trabalhou de forma honesta para conseguir seu próprio sustento.

Mas agora tudo o que sabia sobre sua própria mãe poderia ser apenas mentiras. Como Lauren pôde fazer isso com ela? E se aquela história absurda era mesmo real, então o que aconteceu com seu verdadeiro pai? Quem era esse misterioso marinheiro com que quem supostamente sua mãe fugiu? Oh... No final das contas, nada fazia sentido!

Como se tudo aquilo já não fosse o bastante, Lizzie também tinha que lidar com os sentimentos confusos que vinha nutrindo por Lorde Hector desde que os dois trocaram carícias tão íntimas naquela maldita carruagem. Por sorte, ela não tornou a ver seu patrão nos últimos dois dias, pois ele passava a maior parte do tempo trancado em seu quarto ou em seu salão privativo. Mas Lizzie sabia que mais cedo ou mais tarde teria que encarar Lorde Hector novamente, e aquela perspectiva fazia com que sentisse um verdadeiro turbilhão em seu interior.

Céus, o que estava acontecendo com ela afinal?! Por que sentia como se houvesse um buraco no fundo de seu estômago quando se recordava do toque suave da mão dele sobre seu rosto? O que diabos sentia por Lorde Hector?

A chuva lá fora parecia cair com mais ferocidade, e quando Lizzie viu o clarão entrando pela janela de seu quarto, esperou pacientemente para o estrondo que sempre sucedia ao raio. Detestava trovoadas... Faziam com que relembrasse o naufrágio, e aquilo deixou seus pelos eriçados. De forma impaciente, começou a dar voltas pelo quarto como se fosse um animal enjaulado, e sem conseguir ficar trancada ali por mais um segundo se quer, Lizzie vestiu seu penhoar por cima da camisola e saiu do quarto segurando uma única vela para iluminar o caminho.

O corredor lá fora estava vazio e escuro, mas ela o atravessou sem medo ou temor, seguindo pela escada até que chegou à cozinha. Pensou em ficar ali um pouco, comendo algo para passar o tempo, mas recordou-se da vez em que encontrara Lorde Hector ali e achou que talvez não fosse uma boa ideia. Sendo assim, Lizzie continuou vagando pela casa, como se fosse mais uma das assombrações de Silverstone, até que chegou ao salão principal e teve suas divagações interrompidas por um som. Parecia ser o choro de uma criança que vinha de longe, abafado pelo barulho da chuva que caia lá fora.

Brumas de SalOnde histórias criam vida. Descubra agora