Segunda Parte: Capítulos 8

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Claude ficou parado sem fôlego nas escadas que levavam à taberna barulhenta, sabendo que não tinha permissão para entrar. Pela janela, viu enormes pilares sustentando velas do tamanho de toras. Observou as mesas, mantidas juntas por pinos de madeira, com suas superfícies marcadas por décadas de abuso de batidas de canecas. Também pôde enxergar a luz que se filtrava através dos frascos de vinho pendurados, que projetavam aros redondos e vermelhos nas mesas abaixo, vermelho-escuro.

Viu tudo isso, mas descobriu que não conseguia proferir uma única palavra. Apenas passou pela soleira e esperou.

A mãe de Claude e Roxanne, Marguerite, estava muito ocupada carregando duas bandejas em cada braço e se desviando de bêbados desordeiros. Parou por apenas um instante, ao passar pelo filho.

- Estou trabalhando! - Ela o deixou indeciso à porta, sentindo-se rejeitado.

O barulho da taberna era ensurdecedor. Não sabendo mais o que fazer, com medo que ninguém ouvisse, Claude gritou. Tinha o rosto de um homem muito mais velho, com vincos profundos que se estendiam das narinas até os cantos da boca. Sua pele era manchada, e as pessoas não gostavam disso, sentindo que era a marca visível de uma alma imperfeita. E ninguém estava interessado em ouvir.

Marguerite surgiu, agitada, em direção ao ruído.

- Como ousa? - ela perguntou cruelmente, cortando o silêncio.

Claude emudeceu, respirando pesadamente, sentindo um rubor vermelho surgir em seu rosto sardento. Vendo que ele não causaria mais problemas, Marguerite virou-se para entrar novamente.

Mas Claude puxou com força uma dobra de seu vestido.

- Criança maldita - murmurou.

A taberna silenciou. Ela ficou surpresa: ele havia sido muito violento. Ele permaneceu ali, paralisado, chocado com suas próprias ações, sentindo-se exposto.

Entretanto, alguém riu, rasgando o silêncio e incitando um festival de gargalhadas estridentes. Por trás de suas risadas, Claude sabia, estava o medo. Sua própria mãe suspeitava dele e o via como um forasteiro. Ela não entendia de onde ele havia vindo.

Perguntou-se se o Lobo teria medo dele da mesma forma que os outros aldeões tinham. Agora, tanto ele quanto Marguerite estavam envergonhados. Afastou-se, tentando recuar.

O esforço o esgotara. Começou a sair, mas irrompeu de volta. O que ele queria dizer era "Lucie está largada no campo de trigo, foi maltratada até morrer."

Gaguejando, porém, tudo o que conseguiu dizer foi:

- L-L-Lobo.

Finalmente, eles escutaram.

Não demorou muito para que o sino começasse a soar.

***

O sino tocava mais alto, quatro badaladas de cada vez, à medida que Valerie se aproximava no encalço dos aldeões. Correu através dos campos, evitando os fardos de feno da véspera.

- Não acreditem no menino - alguém dizia.

- Claro que não. Nós todos sabemos muito bem que faz vinte anos, e que o Lobo nunca rompeu a paz - outro sujeito gritou, acima do clamor, apressando-se pelos campos destruídos. - Provavelmente ele só viu um cão selvagem e ficou confuso.

As crianças puxavam os braços de suas mães, apressando-as. Elas queriam ver qual o motivo de toda aquela agitação. Temiam ter perdido algo, embora não tivessem certeza do quê.

Valerie corria à frente deles, antecipando seu destino. Alcançando o centro do campo, ela viu que alguns aldeões já estavam lá, divididos em grupos. Ao olhar para ela, aquietaram-se e detiveram-se, respeitosamente. Podia se ouvir uma mulher na parte de trás da multidão, tentando conter o soluço de choro. Valerie não conseguia ver nada em meio ao aglomerado de capas estampadas cinzas e marrons, mas encontrou Roxanne, Prudence e Rose juntas em um abraço, cada qual amparando as outras duas.

- Quem é? - ela quis saber.

Elas se viraram para Valerie sem desmanchar o abraço.

Ninguém conseguia dizer nada.

A multidão se afastou para que Valerie pudesse ver sua mãe e seu pai em pé sozinhos, com os rostos horrorizados. Soube antes mesmo de Roxanne sussurrar para ela.

- Sua irmã.

Ela correu e caiu diante do corpo inanimado de Lucie, agarrando desesperadamente pedaços de feno. Ainda não tinha coragem de tocar a sua irmã.

Lucie estava com o seu melhor vestido, mas o tecido estava rasgado e mal servia para prender seu corpo. Seu cabelo, uma trança formal de quatro mechas, tecida com tanto cuidado na noite anterior, havia se soltado em mechas embaraçadas.

A coroa de ervas ainda estava presa ao seu cabelo. Valerie despiu-se de seu próprio xale e cobriu Lucie. Então, ergueu a mão da irmã para seu rosto e sentiu alguns fragmentos de papel na palma fria, entregando-lhe um segredo final. Pareciam os restos de um recado, mas era impossível decifrar a escrita. Valerie enfiou os pedaços no bolso.

A mão estava úmida de orvalho e viscosa com o sangue coagulado. Finalmente cedeu à expressão do luto, permitindo que ele a enterrasse como uma camada de neve, de modo que tudo parecesse abafado e distante.

Logo Valerie sentiu mãos anônimas interferindo na sua presença diante da irmã morta. Não podia largá-la, pois não sabia se sua irmã já havia deixado o corpo; não tinha certeza da velocidade em que a partida acontecia. Teve de ser levada à força do lugar, com seus joelhos manchados de marrom da terra, sangue e solo invernal, e as lágrimas escorrendo pelo seu rosto.

Enquanto era afastada, a primeira neve da estação começou a cair.

O inverno chegara cedo.












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