Capítulo 14

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alma! — resmungou o cocheiro para os cavalos, enquanto a C carruagem negra freava aos poucos.

Valerie ouviu cascos ressoando no chão nevado quando uma dúzia de soldados, com rostos determinados e montando garanhões poderosos, chegou. As armas cintilavam ao sol da tarde. Um arqueiro mascarado era conduzido por um majestoso corcel branco. O homem usava um elmo pesado e tinha ao ombro uma besta1 enorme. O temível grupo de homens transportava atrás de si um enorme elefante de ferro e carroças repletas de seus materiais: armas, livros, instrumentos e equipamentos científicos. O elefante, rebocado com brutalidade, era enorme e parecia um bloco com a tromba curvada como uma serpente e os olhos ameaçadores. Valerie viu que os outros aldeões se perguntavam sobre a sua utilidade; não parecia correto que aqueles homens grandes trouxessem um brinquedo. Ela notou uma porta articulada em seu ventre de ferro e estremeceu.

Viu suas amigas na praça, mas antes que pudesse chegar até lá, a caravana havia parado no local. Ela acenou para Roxanne, mas Rose e Prudence não a viram. Ou isso, ou elas queriam manter distância por causa de seu noivado.

O cocheiro parecia um pouco enjoado por causa da estrada irregular.
 
1 Arma medieval. (N.E.)

Havia sido uma jornada longa e rápida, evidentemente, e os cavalos orgulhosos, com os olhos cansados do mundo, deixavam transparecer sua frustração. Seus freios tilintando eram os únicos sons quando a multidão já se dispersava pela praça e, silenciosa, aguardava os acontecimentos.

As mulheres olhavam das varandas e por trás das cortinas, tentando enxergar pelas barras de ferro das janelas da carruagem, moldadas em forma de cruzes. A taberna havia se esvaziado, e os homens esperavam para ver se o recém-chegado honraria a sua reputação. Daggorhorn era uma cidade acostumada com a decepção.

Peter estava longe de Valerie. Eles não se olharam. Era bom ter muito mais coisas para olhar.

Ela percebeu, porém, que o risco talvez não valesse a pena. Sabendo da aflição do segredo de sua mãe e do trauma provocado pelo amor, não queria sofrer daquele jeito. Amor, desejo — era tudo tão horrível.

Esqueceria Peter, decidiu, e esqueceria Henry. Viveria uma vida em reclusão, morando na floresta, como a Avó; sozinha, virando-se sozinha.

Chega de, amor.

Um burro maltratado da aldeia trotou com desânimo para fora do caminho, provavelmente pensando que preferiria ter sido um cavalo. As crianças depositavam pequenos objetos, bolotas e bonecas de palha, nos sulcos gêmeos que as rodas da carruagem escavaram na neve. Elas se dispersaram, porém, quando levantaram o olhar e viram o exército que havia se reunido.

Alguns homens grandalhões descarregaram
a carruagem, desamarrando baús de madeira e empilhando-os ao lado da rua. O resto dos soldados ficou imóvel, à espera de ordens. Até mesmo o macaco alerta, empoleirado nos ombros de um lanceiro, parecia estar esperando uma ordem.

— Apresentando Sua Eminência... — um soldado começou. Era um mouro magnífico, diferente de todos que Valerie já havia visto. Seu cabelo fora cortado rente, tão rente que parecia ter sido puxado de seu crânio; ele tinha um tom de cinza em vez de preto. Portava urna espada de dois gumes, pendurada de modo elegante em seus ombros. Suas mãos eram enormes e pareciam capazes de estrangular alguém com facilidade. Ele manteve uma delas ao lado enquanto caminhava, descansando-a tranquilamente sobre o cabo de um chicote preto. Era o capitão.

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