Pais e Filhos - Legião Urbana

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— Eu quero que vá para casa agora, entendeu Giulia? — ela disse, ríspida.
— Mas mãe, você não entende, é perigoso. Estamos nós duas em perigo e...
— Filha, você tem noção do problema que está gerando? — atrás dessa barreira, a voz de minha mãe tremia — Eu não vou discutir com você. Diga que vai, por favor.
— Eu vou — disse, suspirando.
— Ótimo! Filha? — ela disse, depois de um certo tempo de silêncio — Eu te amo. Muito.
— Eu também te amo, mãe.
— Tire o cachorro da garagem, tchau.
Ela desligou sem que eu pudesse questioná-la. Cachorro? Não tínhamos um cachorro.
— Sabe que eu prefiro que você fique, não é? — Leo disse, tirando o cabelo dos meus olhos.
— Eu vou voltar lá. Preciso de uns remédios também, enfim. É a minha casa, se minha mãe não quer acreditar em mim, eu preciso fazer o possível para provar.
.
Entrei em casa e logo decidi precisava sair. Carlos estava no sofá com uns dois amigos completamente bêbados cantando algum sertanejo ridículo. Odeio sertanejo. Aquela só poderia ser a visão do inferno! Passei pela sala de estar, mas acho que ninguém notou a minha presença. Fui até a cozinha pegar o que era meu e corri até meu quarto, deixei malas prontas, para qualquer emergência.
Meu pai começou a gritar:
- Anne! Anne!
- Oi meu amor! - ela respondeu.
- Traz mais uma!
“Bêbado ridículo”, pensei.
Logo me lembrei do comentário estranho da minha mãe ao telefone. Saí de casa pela porta de serviço e entrei na garagem, procurando pelo tal cachorro. Me encostei no carro e passei a mão por meus longos cabelos pretos. Estava calor e o dia tinha sido de todo cheio. Na minha frente, tinha uma parede lotada com bagunça e graxa. Parecia cobrir uma parede desenhada.
Tirei tudo aquilo de vagar, para não fazer barulho. Era uma longa pintura, surrada pelo tempo. Ao indentificar o que era, minha respiração parou. Um cachorro. Mais que um simples desenho na parede, aquela era uma porta, portanto, girei a maçaneta e respirei fundo. Minha mãe fizera um ótimo trabalho.
Entrei em um pequeno quarto cor- de-rosa com desenhos de pequenas borboletas na parede. Tinha o perfume dela e um quadro com fotos antigas, de quando ela era jovem. Minha mãe sempre foi linda. Tinha fotos dela com amigas do interior. Também com meus avós, fotos do pessoal da faculdade e também com um namorado. Um rapaz bonito, moreno. Eles pareciam se amar muito. Abri um sorriso. Aquilo parecia um porto seguro para a minha mãe, como a música para mim.
Comecei a vasculhar outros lugares. Uma escravinha branca cheia de cadernos e uma carta. Uma carta muito bem elaborada.
"Para Giu", não hesitei e logo abri.

Filha,
Me desculpa por ter sido tão enigmática quando conversei com você, mas é que agora todo o cuidado é pouco. Não sei se você já sabe toda a verdade, mas você é uma garota inteligente, sei que vai entender.
Uma semana atrás, descobri que Carlos e Anne planejavam me sequestrar para pagarem uma dívida.
Não sabia como te deixar segura junto comigo, então pedi um pouco de ajuda. Serão tempos difíceis minha pequena, mas é o necessário até que esse monstro seja detido.
Estamos um passo à frente, se você está lendo essa carta, mas todo cuidado é pouco. Quero que saia dessa casa, agora. Seu avô está na cidade. Na casa da tia Mariana, quero que vá até ele. Ele vai te mandar para um lugar melhor. Não use nenhum cartão. Sobre essa mesa, vai achar um cartão de crédito no nome de uma amiga e certa quantia de dinheiro.
Filha eu te amo muito e eu quero o seu bem, então por favor faça tudo que eu estou mandando, será melhor assim. Você já bem crescida, tenho certeza que sabe cuidar um pouquinho de você. Eu te amo muito. Estou com saudades desde já. Mas eu te imploro, não me procure. Nunca. Não importa o que digam na internet, estarei bem.
Grandes beijos , mamãe”.

Eu Apenas EsqueciOnde histórias criam vida. Descubra agora