Eu observei seu rosto enquanto dirigia. Por um segundo sequer eu volto ao meu estado naquela ilha, com aquela criança gelada nas minhas mãos e o médico me avisando que ela estava realmente morta. Não sei o que está passando na minha mente. Fixo meu olhar no seu, e não ouço mais nada que saí da sua boca. Minha mente ainda está na ilha, e eu me lembro dos gritos que eu dei procurando aquele homem. Lembro da Sophie sorrindo enquanto me ajudava a cuidar do meu pé. Viro para a janela e deixo algumas lágrimas caírem inconscientemente. Não sei o que dizer para ele, ainda. Ele continua sua fala, me toca algumas vezes mas eu estou paralisada. Observo todo o caminho e quando chegamos na casa dele, eu desço, entro e deito no sofá. Ele agacha na minha frente e se pega fazendo carinho no meu cabelo por alguns minutos. Eu olho para ele e sorrio, mas continuo chorando. Entendo que as coisas que já foram, são passado, mas não consigo entender o porque que todo mundo resolveu mentir para mim, tanto relacionado a ele, ou a Sophie:
-Onde ela está? -Eu olhei para ele enquanto fazia carinho
-Eles não me falaram, ainda não. Estou esperando notícias. -Ele me olhou.
-E porque eles avisaram você e não a mim? -Eu continuei olhando para ele
-Eles tentaram te ligar, acho que a hora que eu estava indo te pegar, mas você não atendeu. Deve ter acabado sua bateria. -Enquanto ele fala isso, o seu telefone toca. Pelo jeito da conversa, eles tinham chego com a Sophie.
A realidade sobre a Sophie era que ela tinha catalepsia. Naquela manhã em que ela estava gelada, tinham levado ela para um hospital especializado e que, na verdade, ela estava sob algum medicamento que havia deixado ela em coma. Pelo que o Anderson havia me explicado, o enterro foi simbólico, os avós denunciados pois autorizaram a introdução de remédios nada efetivos que a deixaram assim. Com os pais mortos, e os avós denunciados, ela não tinha mais nenhum parente próximo e que pudesse cuidar dela. É uma história confusa demais para acabar com ela indo para qualquer orfanato.
Ele me leva para o carro e corremos para o aeroporto. Chego lá eu a vejo segurando um coelho amarelo, e na outra mão segurava a mão da assistente social. Ela estava de costas, eu me aproximei calmamente, agachei e dei uns toques no ombro dela:
-Posso saber o que essa menina, tão linda, faz aqui com esse coelhinho? Está perdida? -Eu falei baixinho
-TIA! -Ela virou e logo me abraçou. Eu não consegui segurar as minhas lágrimas naquele abraço tão pequenininho mas aconchegante.
-Oi meu bem… Como você está? -Eu fiz carinho no cabelo dela, nem acreditando que ela realmente estava ali
-Eu to bein… eu tenho 5 anos agora -Ela mostrou com os dedinhos
-Verdade né? E nem me convidou para comer bolo! -Eu sorri
-Ah tia, eu quelia, mas eu não sabia onde você estava. -Ela olhou para os seus pezinhos.
-Ah, mas tudo bem! A gente faz outra. -Eu sorri para ela, que consentiu com a cabeça sorrindo também
O Anderson foi conversar com a Assistente social enquanto eu ainda estava deslumbrada com ela ali na minha frente. Passaram basicamente uma hora conversando sobre os processos de adoção. Ficamos brincando de tudo que tínhamos em nossas mãos, observei em seu rosto a sua felicidade por estar naquele lugar. Ela me passava paz. Enquanto eu estava com ela, eu virava uma criança. Não existiam problemas perto de mim, eu estava apenas curtindo meu tempo com ela. Eles se aproximam de mim, e dizem que está na hora delas irem embora. Sophie fixa seus olhos nos meus e diz que não quer ir embora. Seus olhinhos estão cheios de lágrimas e eu não sei o que fazer. Estou sem caminho. Ela grita pelo meu nome enquanto a levam embora. O Anderson tenta me chamar de volta pra vida, mas estou fixada nela. Volto aos poucos, estou em desespero por dentro. Corro atrás dela, e a abraço. Ela está com medo, está sozinha, não sabe o que irão fazer. Sinto seu medo no abraço. Tento acalmá-la, mas não quero deixá-la ir. O Andy me abraça por trás enquanto estou com ela no colo, e diz que precisamos deixá-la ir. Meus olhos não negam a minha tristeza:
-Tia, não me deixa -Ela disse no meu colo
-Eu não vou, eu vou… te visitar. Eu vou tentar te adotar, ta bom? -Eu olhei em seus olhinhos chorosos
-Vai mesmo? -Ela olhou para mim.
-Vou, eu prometo. -Eu sorri e beijei a testa dela, colocando-a no chão.
Ela segurou na mão de outra assistente social, e enquanto saía do aeroporto acenou rapidamente para mim. Um pequeno sorriso foi apagado pela porta do carro que se fechou instantes depois. Outra assistente social se aproximou de nós dois e começou a falar sobre o processo de adoção:
-Vocês são casados? -Ela olhou para nossas mãos dadas
-Não. Não somos -Eu disse brevemente.
-A adoção da Sophie será bem mais fácil se vocês forem casados.
-Nós pode…- O Anderson começou a falar e eu o interrompi
-E adoção para solteiros? - Eu disse
-É um processo tranquilo, mas demorado. Vocês dois tem condições estáveis juntos, poderiam criar ela facilmente. Vejo que estão juntos, porque não fazem um casamento básico no cartório e … entram com a papelada para adotar a Sophie? Ela tem todas as características favoritas na hora de adoção, principalmente a idade.
-É uma boa ideia, amor. -O Andy sorriu.
-Amor…? Ok eu vou pensar. Tem algum contato? -Eu pedi e logo ela me entregou seu cartão e entrou no carro junto com a Sophie.
Na volta pra casa eu e Anderson conversamos sobre a possibilidade de nos casarmos. Eu tento explicar para ele a minha desconfiança. Tento explicar o meu medo, e ele entende. Sei que ele mudou, mas mesmo assim eu tenho medo:
-Isa, perdão. -Ele parecia cansado
-Eu te perdoo, Andy. -Quando eu disse isso, ele se alegrou. -Mas não sei se é o suficiente ainda pra um casamento, desculpa. -Eu olhei para o farol que estava vermelho e pensei em sair do carro
-Mas Isa…-Ele encostou a mão dele na minha -É pela Sophie.
-Nunca é apenas por ela, queria eu que fosse. Mas há muita coisa em jogo. -Eu parei de olhar em seus olhos e voltei para a janela
-E se…-Ele tentou falar de novo.
-Andy, é melhor eu ir-Eu abri a porta e voltei andando pra casa
É como se o mundo não estivesse na mesma órbita em que eu estou. Sei que as coisas acontecem rapidamente, mas não sei se tenho coragem de tentar agora. Meu corpo e minha mente estão desgastados, e eu não sei mais o que pensar. As minhas tentativas de estar feliz por completo, se foram. Penso em tudo que mais preciso, e tudo se resume a ela. Entro em casa, estou sozinha. Deito na minha cama, desligo meu celular. Eu não quero mais que o tempo passe.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Se meu amor é um merda, eu também sou.
HumorEm meio a tantas fanfictions em que casais são formados romanticamente no Tuca, são felizes pra sempre ou tem uma história dramaticamente ruim, para no fim terem seus lindos filhos, apresento-lhes: Meu love é um merda. Eu também. Essa história é vol...