Perfeição É Para Os Fracos

Hipocrisia

 Hipocrisia: qualidade do hipócrita; fingir concordar com ideias contrárias às que se tem; ação contrária àquilo que o agente prega, acredita ou pensa. Ou seja, "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço". Meu irmão, Rafael, jamais fora um santo em sua vida. Vivia com várias garotas ao seu dispôr, apesar de sempre acabar dispensando-as, embora eu realmente achasse que elas eram até legais. E jamais admitisse, claro. Na verdade, achava que meu irmão não merecia nenhuma garota. Tipo, nenhuma mesmo. "Mas, Amanda, você mesma não disse que ele é perfeito?", vocês podem perguntar. É diferente. Eu simplesmente não vejo meu irmão trazendo flores para alguma garota ou se ajoelhando e se declarando para ela. Na verdade, todas elas saem magoadas e um tanto depressivas após serem dispensadas por ele.

 Porém, isso é para referência futura. Vamos voltar à minha situação atual: eu estou aqui, no colo do Mathias (detalhe: de pernas abertas, sentada sobre um volume suspeito) enquanto meu irmão está parado na porta da sala, me encarando com raiva.

  - O que significa isso? - perguntou Rafael.

 Eu corei, me afastando de Mathias. Ou melhor, tentando. Porém, ele praticamente rosnou e apertou ainda mais minhas coxas. Ele não esperava realmente que eu fosse... Continuar o que estávamos fazendo com o meu irmão na sala, não é? Será que ele gosta de ser assistido? Céus, me ajudem! O que eu faço agora?

  - Você sabe muito bem o que é isso. - respondeu Mathias calmamente, erguendo uma sobrancelha para Rafael.

 Eu encarei os dois, confusa e envergonhada. Claro que ser pega no flagra, no meio de um (muito bom!) amasso pelo meu irmão estava na lista das coisas agradáveis que queria fazer durante o dia. Mas, permiti que a vergonha desse um tempo, para que a curiosidade me guiasse. Como assim, o meu irmão sabia muito bem o que estava acontecendo? Será que ele anda por aí com alguma dessas estudantes quaisquer do nosso colégio? Eu me sentia extremamente burra, enquanto olhava de Mathias para Rafael, tentando entender a situação em que me encontrava.

  - Você acha que... Por que viu aquilo... - Rafael estava com raiva e envergonhado ao mesmo tempo, uma mistura completamente nova para mim - Você pode pegar a minha irmã? A minha irmã caçula?

 Como assim, por que viu aquilo? E por que ele tinha que falar "pegar"? Eu não sou um objeto, gente, sou a irmã menor dele. Custava um pouco mais de respeito? Porém, mais uma vez, deixei os outros sentimentos darem espaço para a curiosidade.

  - Aquilo o quê? - perguntei.

  - Não é da sua conta. - me repreendeu Rafael, lançando-me um olhar assassino.

 Mathias realmente rosnou à minha frente, agora. Ele parecia simplesmente fora de si, embora eu não soubesse o motivo daquilo. Na verdade, eu não sabia mais o motivo de nada. É, caro leitor, ao pouco estou entendendo como é ser burro. Ou simplesmente normal. Como você convive com isso? É um saco!

  - Não vou deixar que seja hipócrita com a sua irmã. - disse Mathias - Ela tem todo o direito de saber.

  - Ela não tem direito de saber de nada. Nem você tinha! - Rafael gritou.

 Eu só tinha visto meu irmão perder a paciência uma vez, que foi quando um bando de garotos me fizeram chorar no ensino fundamental. Naquela época, eu estava em crise e me fazer chorar não era, na verdade, um grande feito. Porém, Rafael havia partido para a briga com o grupo de meninos. E, apesar de voltar realmente machucado, havia também deixado vários feridos. Eu olhei surpresa para ele agora. Ele não estava pensando em bater em Mathias, estava? Por que, se estava, eu não ia deixar. Que absurdo, a vida é minha! Eu saio com quem quiser, e me amasso com quem quiser, e ele não vai controlar isso. Não mesmo. Entretanto, ignorando meu olhar de aviso, Rafael se aproximou de nós, me tirando do colo de Mathias com violência por um puxão no braço.