Perfeição É Para Os Fracos

Melhor Amiga e Pior Inimiga

 Eu e Rafael estamos, oficialmente, ignorando um ao outro. O que, na verdade, é uma novidade um tanto angustiante. Eu nunca percebi o quão era ligada ao meu gêmeo até parar de falar com ele. Encaremos os fatos, em dezessete anos de vida, eu e ele nunca brigamos a esse ponto. E é claro que eu o odiava secretamente, mas ainda assim o amava. Deve ser uma coisa de gêmeo e toda a mitologia sobre as almas que foram separadas.

 Por fim, eu reparei que Rafael não é perfeito. Ele, na verdade, tem muito mais defeitos do que eu. E isso me reconfortou e me confundiu ao mesmo tempo. Tanto, que decidi largar o meu antigo hábito mais importante: ser igual ao meu pai. Se meu irmão mais velho não é perfeito, nada me impede de ser, e de fazer as pessoas ao meu redor mais felizes comigo. E eu mesma, também. Eu sei que é uma grande mudança e que provavelmente não vou conseguir ser simpática como era antes por um bom tempo, mas estou relativamente empenhada nisso. Nisso e em alertar Larissa.

 Veja bem, eu não estou mais com raiva do meu irmão. Eu vou perdoá-lo assim que ele requisitar o perdão, porém, eu tenho que deixar Larissa de sobreaviso. Claro que ela sabe sobre as aventuras de Rafael, mas quero esfregá-las na sua cara antes que ela possa se chocar com isso. Afinal, terapia de choque sempre foi minha terapia predileta. E eu pretendia aplicá-la na minha melhor amiga assim que tivesse a oportunidade.

  - Você está melhor? - perguntou uma voz conhecida.

 Virei-me, surpresa, para dar de cara com Mathias. Percebi que, como sempre, ele estava lindo. Porém, o que era uma novidade chocante, parecia cansado. Afinal, assim como Wallace, ele era o brincalhão e o desastrado feliz. Franzi a testa, preocupada com ele. Ele estava sério e tinhas olheiras debaixo de seus olhos, o que me surpreendeu mais do que tudo. Mathias passava a impressão de ser alguém que se importa com sua imagem e, no pouco que eu havia convivido com ele, não parecia o tipo de pessoa que iria simplesmente passar uma noite em claro.

  - Amanda. - ele estalou os dedos na frente dos meus olhos - Está melhor?

  - Sim. - eu balancei a cabeça, tentando clarear as ideias - Você que não me parece bem.

 Eu pensei que ele fosse negar, mas, quando abriu a boca, um enorme bocejo saiu dela, e ele se espreguiçou devagar. Ele deu de ombros, então, como se não fosse nada demais. Como se aquilo acontecesse todo dia.

  - Eu fiz o trabalho de ontem. Continuei de onde tinha parado e... Bem, fiz a sua parte também. - ele disse, me entregando algumas folhas.

 Eu encarei as folhas de papel pautado que ele havia colocado delicadamente em minhas mãos, surpresa. Não acredito no que vejo. Ele simplesmente havia feito tudo isso, por mim? Mas ele mesmo havia me dito que não era bom nisso. E que era desagradável para ele.

  - Eu também fiz o trabalho. - admiti - Mas muito obrigada, Mathias. É muita gentileza de sua parte. - lhe sorri timidamente.

 Me chamem de desumana ou de projeto de corna mansa, mas eu realmente não havia pensado ainda sobre ontem e tudo o que aconteceu com Mathias. No momento, a possível ruína da minha melhor amiga me ocupava a mente. Nem por isso eu deixei de terminar o trabalho ontem, com mais raiva e motivação do que tudo, antes de chegar às minhas atuais conclusões. Mas meu possível namorado ter se lembrado de tal detalhe e se empenhado tanto, me fez sentir uma onda de calor no peito. Não me entenda mal, meus pais me amam. Mas ser cuidada assim, é algo completamente novo para mim. E me fez bem.

  - Desculpa, então. - Mathias coçou a nuca, corado - Eu só quis lhe poupar do trabalho.

  - Não... Obrigada. Sério. - eu sorri honestamente - Eu vou conferir os trabalhos, de qualquer modo. E...

 Então, eu a avistei. Com sua habitual calça colada e a mochila xadrez, Larissa estava entrando na escola. Imediatamente, meus olhos se esbugalharam e eu agarrei o braço de Mathias. Por mais que eu quisesse ficar ali e conversar com ele, assuntos urgentes estavam me esperando.