O tique-taque incessante do relógio de cabeceira ressoava alto entre as paredes do pequeno quarto localizado no segundo andar daquela silenciosa residência. Um único frágil feixe de luz penetrava por uma fresta da cortina parcialmente fechada para ser refletido sobre a superfície lustrada da escrivaninha à janela. Imerso na escuridão do gélido ambiente, o rapaz deitava-se imóvel sobre a colcha de retalhos coloridos da cama de solteiro, suspirava profundamente com frequência enquanto focalizava o olhar vagamente em um ponto qualquer ao chão.
Não importava-se com o barulho distante de um rádio tocando uma música tradicionalmente natalina, nem com os latidos do cachorro a perseguir um pássaro ou outro pelo grande quintal, nem com as vozes abafadas dos outros residentes daquele endereço, vindas de algum dos cômodos do andar inferior. As usuais três batidas contra a porta de madeira não teriam sido um incômodo relevante se o garoto tivesse lembrado-se de girar a chave da fechadura na noite anterior, mas não sentira-se insultado ao observar uma silhueta baixa delinear sua sombra entre o clarão que invadia o ambiente.
Silenciosamente percorrendo a pequena distância entre o batente e a cama de solteiro, depositou seu peso sobre o colchão ao lado da figura ainda imóvel e inexpressiva do menino de cabelos castanhos. Com o coração apertado por ainda vê-lo com o semblante tão desanimado, sob a penumbra instalada no quarto, levou as mãos à testa do filho para aconchegá-lo em um carinho.
"Tenho certeza de que ela não ficaria feliz em saber que está assim tão triste"
"Não estou triste, mãe" - respondeu a voz rouca pelo desuso do rapaz - "Só estou preocupado"
"Pensei que sua filosofia fosse a de que preocupar-se significa sofrer em dobro" - a mãe brincou, fazendo o menino esboçar um sorriso leve - "E não temos nem certeza de que ela realmente quer sair com esse rapaz hoje, Newt"
"Não é isso" - o rapaz ergueu-se para sentar de frente para a mãe - "Só estou pensativo sobre a avaliação do meu livro, nada mais"
Sob o olhar descrente a ele direcionado, Newt baixou os olhos para as mãos em seu colo. Sentia-se mais vazio a cada dia que aproximava-se daquela tão incolor sexta-feira devido a falta de conhecimento sobre o que passara-se com sua melhor amiga ao longo daquela semana. Os olhos da mãe acompanharam o trajeto do jovem pela casa durante todos os dias, entristecidos por encontrar no filho a postura encurvada e a quietude anteriormente habitual enquanto fitava, pesarosamente, qualquer ponto fixo por um longo período de tempo.
"Não tenho o direito de me sentir assim, mãe" - encarou as pontas do cabelo vermelho que descansavam sobre o ombro da mais velha - "Tina é livre para fazer o que ela quiser, e certamente sabe escolher aquilo que é melhor para ela"
"E você não acha melhor dizer a ela como se sente?"
"E colocar em risco a amizade que temos?" - sibilou a voz aguda do menino - "Tina é, antes de qualquer coisa, minha melhor e única amiga e não pode sequer imaginar qualquer uma dessas coisas, mãe. Não quero arriscar que ela se afaste"
Em um suspiro resignado, a mais velha acariciou as bochechas do filho com as costas da mão antes de levantar-se em direção à janela para abrir a cortina de tecido bege. Contemplou a paisagem tipicamente acinzentada daquela sexta-feira gelada de dezembro, uma neblina baixíssima escondendo o topo dos pinheiros e da majestosa caducifólia de sua propriedade. Um sorriso nostálgico coloriu suas expressões.
"Seu pai foi um grande amigo de minha adolescência" - observou o cachorro malhado de patas longas farejar algo à grama do jardim - "Quando o conheci, sua família estava de mudança para uma das casinhas ao final da rua em que eu morava. Na época eu namorava um rapaz, Sebastian era seu nome, ele era bonito mas um completo idiota"
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The 5's Romance
RomanceEm um cenário essencialmente britânico, embarque com o jovem Newt Scamander no romance menos provável de ser encontrado na mais simpática e excêntrica livraria de Canterbury.