Capítulo 4

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    Newt bufou pelo que deveria ser a quinta vez nos últimos dez minutos ao encarar a folha de papel cheia de anotações e rabiscos aleatórios e apressados feitos a lápis. Estava trabalhando há horas no penúltimo capítulo de seu manuscrito na mesinha sob a janela de sua acomodação e encontrava uma enorme dificuldade em organizar suas observações em um parágrafo coerente.

    Em verdade, a primeira semana de novembro havia consumido o rapaz com a chegada dos exames e a rapidez com que o prazo para a entrega de seu manuscrito aproximava-se. Estava física e mentalmente esgotado pelas noites em que passava em claro, ora revisando as propriedades medicinais de raízes para a fisiologia dos mamíferos, ora lendo artigos sobre o estabelecimento da hierarquia em espécies de sociedade complexa, ora dissertando sobre a importância da conservação dos locais de instalação dos ninhos de martas para a sobrevivência da espécie perante à constante caça pela sua pele.

    Pensou em levantar-se da mesinha para ir até a pia de cozinha do pequeno flat alugado e preparar uma bebida quente que o aquecesse contra o frio da garoa que caía pelo vidro da janela e que o aliviasse, nem que fosse por um momento, de sua inesgotável frustração.

    A acomodação estudantil que habitava era composta por apenas um banheiro pequeno e uma área comum onde o rapaz instalara sua cama, um armário de médio porte, uma geladeira, um fogão e uma pia de cozinha, além de uma pequena televisão que permanecia desligada na maior parte do tempo.

    O relógio pregado à parede marcava dez minutos passados das quatro horas da tarde de terça-feira e Newt olhou, através do vidro marcado pelas pequenas gotas de chuva, para o final da Jowett Walk por onde, a qualquer momento, uma silhueta familiar estaria passando de volta para casa.

    Não demorou muito mais do que o esperado para que a sombrinha de tom azul bem escuro virasse a esquina da St. Cross Road e caminhasse pelo meio fio em direção ao prédio de quatro andares, de onde era observada. Desviava das poças de água no asfalto enquanto encolhia-se embaixo de sua proteção, o rosto e os cabelos curtos totalmente fora do campo de visão do rapaz. Enquanto fechava o portão de grades e desaparecia sob a janela de vidro, Newt chegou à conclusão de que a presença do habitual aroma de café com leite seria uma boa adição aos seus planos de esfriar a cabeça.

    Tinham desenvolvido uma rotina nas últimas três semanas. Newt e Tina deixavam as acomodações todos os dias perto das sete horas e trinta minutos da manhã, desejavam um ao outro uma boa aula e seguiam para seus respectivos destinos. Ele seguia pela Jowett Walk à esquerda, contornando o parque Balliol College Recreation pela Mansfield Road para chegar até o Departamento de Zoologia. Ela seguia pela Jowett Walk à direita e caminhava pela St. Cross Road até o prédio da Faculdade de Direito. O rapaz costumava voltar para a casa à uma hora da tarde, enquanto a moça retornava todos os dias próximo das quatro e quinze.

    Quando não encontravam-se atarefados demais pelos trabalhos que levavam para casa, sentavam-se no muro baixo que rodeava o pequeno prédio simplesmente para jogar conversa fora. Quando chovia ou as correntes geladas de ar tornavam insuportável para a dupla permanecer em suas observações da estreita rua bem arborizada, conversavam na escadaria interna entre o segundo e o terceiro andares até que algum dos vizinhos colocasse a cabeça para fora da porta em sinal de reprovação.

    Newt passara os últimos finais de semana sozinho em Oxford, uma vez que Tina voltava todas as sextas-feiras após a aula para trabalhar em Canterbury no final de semana. Confidenciara ao garoto que uma das razões pelas quais submetia-se às suas condições na livraria era que o senhor Abernathy sênior concordara em empregá-la mesmo com sua necessidade de ausentar-se para frequentar a universidade durante os cinco dias letivos semanais. Tina sabia que seria uma tarefa difícil encontrar outro emprego que lhe oferecesse tal possibilidade e aceitou de imediato a vaga que o simpático senhorzinho estendia a ela de bom grado. Ainda que reduzindo seu salário proporcionalmente ao tempo ausente, a quantia ganha era somada ao auxílio estudantil que recebia da universidade e tornava-se, então, suficiente para pagar suas despesas.

The 5's RomanceWhere stories live. Discover now