Não Somos Irmãos

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—Eu estou falando... O príncipe estava no mercado—Daniel relata as aventuras da realeza à mãe.

—Mas o que o príncipe estaria fazendo no meio da ralé?—Marta não esconde seu desprezo ao falar das pessoas de Erie, que para falar a verdade tinham a mesma condição financeira que a madrasta má.

—Não sei... Mas parece que ele não devia estar ali—ele se joga na poltrona—A cavalaria logo invadiu o mercado, procurando por ele.

—O que está parado olhando, Elio?—a madrasta esbraveja, vendo que o enteado estava parado na entrada da sala, com a vassoura em sua mão—Não sabe que não deve ouvir a conversa alheia. Vá limpar a casa—ela ordena e Cinderelio continua seu serviço.

Elio chega em seu quarto morto de cansaço após limpar a casa toda. Sua cama e seus livros eram o consolo de seus dias de tormenta. Não havia nada que não se resolvia com uma boa leitura a um novo universo.

—O que está lendo hoje?—ele olha para o batente da porta e encontra Anastasia, se equilibrando em saltos plataforma e trajando um vestido florido que ia até suas canelas.

—Não é da sua conta—a resposta afiada fez a garota entrar em seu quarto e arrancar o livro de suas mãos.

—Vou ter que queimar esse livro aqui também, Cinderelio?—ela olha para a capa— "Orgulho e Preconceito". Você tem gostos estranhos, garoto. Quem te deu esse aqui? Foi a mamãezinha querida... E morta?

—Por que é tão cruel? Sou seu irmão—Elio esconde a decepção na voz.

—Não somos irmãos, Elio—ela joga o livro na parede e sorri diabolicamente—Não ouse colocar algum parentesco entre mim e você. Um rato de rua. Um órfão esquecido. Não somos família—ela sai do quarto, brava o suficiente para quase derrubar Daniel, que passava no corredor.

—Está tudo bem por aqui?—Daniel espia dentro do quarto, ainda parado no corredor. Elio pegava seu livro do chão e verificava se nenhuma página tinha sido arrancada no vôo solo que Jane Austen havia dado até a parede.

—Anastasia, como sempre—ele coloca o livro em uma pilha na escrivaninha —Eu achei que podíamos ser irmãos um dia, mas não vai acontecer.

—Não somos irmãos, Cinderelio—Daniel ri—Viemos para cá com uma proposta do seu pai. Proposta financeira, não um acordo familiar. Não viemos aqui constituir alguma família com vocês. Espero que eu tenha sido claro—a voz rouca e autoritária de Daniel fez Elio arrepiar. Um arrepio de medo que não havia sentido ainda.

—Mas eu achei...

—O que você acha não me diz respeito—ele sorri—Ah, eu acho que a sala está suja, acabamos de usar a lareira e está cheia de cinzas. Vá limpar, Cinderelio.

Daniel olha para o fim do corredor. Sua mãe estava com um enorme sorriso de satisfação em seu rosto e acena com a cabeça para o rapaz. O filho mais velho de Marta olha para baixo e se retira, indo para seu quarto.

Elio faz o que Daniel pediu. Sabia que mais tarde Marta lhe pediria a mesma coisa e não teria como fugir da tarefa.

Os únicos amigos que tinha na casa, três ratinhos, o acompanhavam na tarefa.

—Queria que esse pesadelo tivesse um fim—o loiro comentava com os animais.

Após a limpeza da lareira e da sala, Elio se encontrava cheio de pó e cinzas, que originaram seu apelido anteriormente.

—Terminou?—Daniel surge na sala com suas mãos nos bolsos da jeans escura.

—Já, sim—Elio praticamente joga o pano que usara na limpeza no filho de Marta—Mais alguma coisa, Tremaine?

—Não—ele suspira e Elio sai de sua vista.

A tarde passara rapidamente enquanto Elio se aventurava nos romances de Jane Austen. Marta não havia mais lhe enchido o saco e nem seus filhos.

Elio tentava convencer a si mesmo que sempre soube que Daniel não era uma pessoa boa. Que era igual a mãe e a irmã. Mas a decepção ainda pairava sua mente.

—Esquece isso, Elio—ele fecha o livro e pousa o mesmo sobre a escrivaninha ao lado de sua cama.

O loiro levanta de seu descanso e vai até a cozinha, não sem antes alimentar Lucifer, o gato de sua madrasta.

O cheiro de café invade a cozinha depois que Elio torra alguns grãos e joga na água fervente. Ele adiciona leite e faz um belo redemoinho de chantilly em sua xícara.

—Pra mim? Obrigada—Anastasia rouba a xícara da bancada e sai tomando o café pela sala. Elio apenas revira seus olhos e faz outra xícara para si.

Batidas são ouvidas na porta e Lady Tremaine atravessa a sala correndo para atender. Elio logo se junta a ela e seus filhos do lado de fora da casa.

As roupas ornamentadas e cheias de brilho mostravam que aquele era um agente real. A sela do cavalo não mentia. O jovem rapaz ergue um pergaminho e começa a ler o que estava escrito.

—Venho anunciar que, na próxima segunda feira, haverá um baile real no palácio de Erie. Todos estão convidados e todas as jovens damas do reino terão uma chance de dançar com o Príncipe Thomas. O mesmo estará escolhendo sua própria Rainha no evento. Isto é tudo—ele fecha o pergaminho e entrega um convite dourado lacrado na mão de Marta. Vai embora em seguida.

—Vocês estão ouvindo?—ela vira para seus filhos—Estão ouvindo os sinos da esperança batendo na nossa porta? Essa é a chance que precisávamos para sair desse beco, dessa ralé. Nós vamos ao baile e você, Anastasia—ela aponta para a filha—Tem que fazer de tudo para conquistar o coração do príncipe—o plano de Tremaine a fazia sorrir. Esse baile era tudo o que ela tinha para mudar de vida.

Elio (Cinderela)Onde histórias criam vida. Descubra agora