23(Pt1) - "Crossover" - Lana.

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Parte 1.

Quando pisei os pés na rua, senti o vento frio esbarrar minha face. Quanto mais rápido andava, mais meu cabelo bagunçava. A noite, naquele horário, era fria e perigosa na cidade de São Paulo. Dane-se.                                                                                                                                                                    O apartamento de Benjamin era algumas ruas perto do meu e ambos tinham a praça das flores como ponto de encontro principal. Tarde da noite, os estabelecimentos fechavam compulsivamente, mas o cheiro de jantar saído das casas ainda exalava nas ruas da cidade. Andando apressada, eu sentia o jeans da minha calça enrijecer com o frio e a minha bolsa tira-colo balançar atordoada. 

O caminho todo, andei pensando sobre tudo o que estava acontecendo. Lembro-me do meu pai conversar diversas vezes comigo sobre "escolher suas batalhas" na vida. Sempre muito sábio, ele dizia que devíamos sempre avaliar quais escolhas valiam nossos esforços, quais dores iríamos suportar nas nossas vidas e quais batalhas iríamos travar. Benjamin era um cara diferente, mas não utópico. Era o tipo de cara que toda garota já conheceu uma vez na vida, mas que o deixou passar. Nas minhas aventuras de ensino médio, conheci muitos caras e fiz muita besteira, mas essa Lana estava aos poucos ficando para trás. Com certeza, se eu não tivesse passado por todas essas experiências como a morte do meu pai, arrumar um emprego na cafeteria e ver a vida de forma mais responsável, eu não teria evoluído tanto e, talvez, eu teria rejeitado que Benjamin entrasse na minha vida. Talvez eu ainda ficasse com caras babacas e estaria ficando a cada dia mais fútil, mas escolhi amadurecer e florescer de uma maneira diferente.

                                                                                               ...

Chegando perto do apartamento de Ben, já era possível avistar o prédio quando uma jovem de cabelos pretos e cara afinada veio cambaleando na minha direção. Enquanto eu atravessava a rua, a garota tombou em mim e por pouco não foi ao chão. Eu a segurei, vendo que ela não parecia bem. Estava suja, machucada, com um olho roxo e marcas no pescoço.

— Ei, o que... fizeram com você? — Perguntei, segurando a garota pelo braço.

A jovem escorregou seu braço das minhas mãos de forma arrogante. Não julguei, ela parecia confusa e revoltada.

— Eu tô bem! — Foi tudo o que ela disse. 

Eu me afastei, não sabia o que fazer. A garota de lindos cabelos negros me deu as costas e caminhou cambaleante em direção ao apartamento de Benjamin, como se estivesse embriagada. Naquele momento, eu entendi. Aquela não era qualquer garota.

— Clara?! — Berrei.

A garota parou de caminhar e virou lentamente de frente pra mim. Eu andei afobada até ela. 

— ... O que diabos aconteceu contigo?

— Por acaso eu te conhe... — Clara se calou e encarou o nada, procurando minha identidade em seus pensamentos confusos. — ... Oh, sim... Você é a Lana, não é?

É mole? — Pensei. Mesmo espancada, essa atirada não perde a arrogância. Ela é exatamente como eu imaginava, uma burguesinha com cara de deboche.

                                                                                              ...

Clara estava totalmente acabada. Ela era mais nova do que eu imaginava, mas tão árdua como Ben descrevia. Eu e ela estávamos no elevador, presas em nossas próprias desconfianças. A cada segundo que o elevador subia, uma encarava a outra de relance. Sutilmente, percebi gotas de sangue seco escorridas em suas juntas. 

 

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A Graça das FloresOnde histórias criam vida. Descubra agora