Capítulo dois- Lições de uma verdadeira amizade!

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A irmã Quitéria, como eu a chamava, era uma pessoa de princípios, os meus ainda estavam em construção, eu e Quitéria tínhamos muitas coisas  em comum,  uma delas era que nós amávamos gatos, ela sempre tinha em sua casa não só os gatos dela, mas também os dos vizinhos que insistiam em se abrigar em sua casa. Por volta dos meus nove a dez anos eu e Quitéria já tínhamos uma boa amizade, jamais havíamos mentido um para o outro, e eu nunca havia mentido em minha vida ou pegado nada que não me pertencesse ou sem autorização (até hoje não fiz isso) por isso eu sempre tive sua confiança, ela me mandava ao mercado, me confiava seu dinheiro, mas nunca eu imaginaria que nossa amizade pudesse ser testada, e foi testada, por um gato. Como assim? Talvez se pergunte, deixe-me explicar.

Certo dia uma das gatinhas que se abrigava na casa da minha amiga teve alguns filhotinhos, depois de muita diplomacia com meus pais, eles permitiram que eu adotasse um dos gatinhos , então a irmã Quitéria, embora um pouco relutante, me deu um filhote, e eu passei a cuidar dele levei-o para casa, passaram-se algumas semanas e eu sempre cuidava muito bem dele e o estado do gatinho era sempre assunto em nossas conversas. Até que algo trágico aconteceu, eu lembro- me bem daquele dia sinistro ao ser acordado por minha tia que tem quase a mesma idade que eu, me falaram que meu gatinho estava morrendo, eu não podia acreditar no que estava ouvindo nem pude acreditar no que veria a seguir, o pobre gatinho estava agonizando com suas vísceras de fora! Parece que ele havia escalado o muro e se cortado nos vidros, mas até hoje não entendo o que aconteceu, meu pai teve que sacrificá-lo, pois ele estava sofrendo muito. Eu não sabia como contar aquilo pra irmã Quitéria, minha mãe disse que eu não deveria contar, mas guardar segredo, então pelos motivos certos eu fiz uma coisa ruim, eu contei minha primeira mentira pra minha amiga.

Por algum tempo eu conseguir omitir, mas logo tive de mentir sobre o ocorrido, quando eu ia a casa de Quitéria durante minhas visitas de leitura sempre se seguia o mesmo roteiro eu lia na sala para ela depois íamos para cozinha e ficávamos sentados em volta de sua mesinha de madeira tomando cevada, ou um suco e conversávamos e ela perguntava:

-"Como vai o gatinho? " E eu respondia –bem, vai bem.

Então ela perguntava –"Ele está comendo direitinho? "

Eu respondia olhando em seus olhos que sim, que ele estava ótimo.

Mas eu sabia que aquilo era errado, eu não devia ter mentido pra minha amiga eu não conseguia voltar atrás, as mentiras cresceram e saíram do meu controle, mas, mentira tem perna curta.

Certo dia minha irmã que não sabia de nada, contou tudo que havia acontecido com o gato detalhadamente (inclusive os detalhes das vísceras e da eutanásia) para Quitéria, da próxima vez que ela me viu ela estava chorando pegou na minha mão e disse:

 -"não faça mais isso meu filho, eu estou muito triste e Deus também". ''

Aquilo foi como uma facada no meu peito! Eu até tentei me justificar, mas, não havia desculpas! A mentira mesmo que piedosa, também magoa. A irmã Quitéria me ensinou que, mesmo quando sabemos que vai doer, precisamos sempre falar a verdade para nossos amigos. Eu guardo essa lição no fundo do meu coração até hoje, as vezes uma simples mentira, pode sim destruir uma amizade. Ainda bem que, nossa amizade foi mais forte que isso, felizmente ela me perdoou e aos poucos fui recuperando sua confiança. Eu queria ter uma memória perfeita pra me lembrar de todas as lições que aprendi com minha amiga, por isso eu as registro aqui, tenho medo de perdê-las em minha memória.

Quitéria me ajudou a entender que ser velho não significa só a quantidade de anos de vida, pois mesmo beirando os cem ela nunca se deixava abater, ela não era velha ela tinha a mesma vontade de viver que eu, talvez até mais que eu, minha amiga só estava presa em um corpo que não a acompanhava mais.

Uma amizade inesperadaOnde histórias criam vida. Descubra agora