Singularity

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- Bom dia, hyung – Ele disse com uma voz sonolenta que refletia o sorriso escondido pelo amontoado de cobertas onde estava deitado de bruços. Os cabelos castanho-escuro caíam sobre seus olhos e se espalhavam ao longo de suas costas nuas. Um par de mãos macias apesar das cicatrizes abriu caminho por entre os fios para expor a pele bronzeada abaixo deles. Fios negros se misturaram aos fios castanhos quando o rapaz se debruçou para beijar carinhosa e sensualmente a pele que expusera.

- Bom dia, Taehyung-ah – Respondeu Jimin, de encontro a sua orelha. Taehyung virou-se de repente e puxou o rapaz para si com agilidade e ambos riram antes de se entregarem num beijo que levou a vários outros caminhos.

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- Hyung... Você acha que um dia isso vai acabar? – Taehyung murmurou para Jimin de onde estava deitado no acampamento. As feridas do ataque anterior estavam enfaixadas depois de receberem um tratamento improvisado. Jimin se remexeu sobre o futon e puxou Taehyung para perto para que dividissem um dos poucos cobertores que foram distribuídos entre os soldados.

- Vai, sim. E quando acabar, vamos nos mudar pra uma ilha e viver tranquilos sem toda essa politicagem e essa guerra. – Ele murmurou de volta, discretamente pegando a mão do guerreiro mais novo sob o cobertor. – Sem ninguém pra ficar nos dando ordens também. – Eles trocaram um olhar cúmplice e sorriram ao pensar nesse cenário. Taehyung entrelaçou os dedos nos de Jimin e eles dormiram muito bem apesar de onde estavam.

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- Hyung...? – Taehyung disse fracamente, olhando sem acreditar para a espada que atravessava o peito de Jimin e o acertava no seu. Não deu importância ao próprio sangue, mas ver o de Jimin descendo por suas costas e encharcando o traje da nobreza que usava o estava deixando em pânico. Ninguém dizia uma palavra ao redor e parecia ao jovem guerreiro que seu mundo havia parado por completo. Jimin o olhou por cima do ombro e deu um sorriso fraco enquanto sangue brotava dos cantos de seus lábios.

- Desculpe, Taehyung-ah. Eu quis decidir meu futuro por mim mesmo, mas... – Ele tossiu um pouco e cambaleou. Taehyung se livrou da espada que o perfurava e mal sentiu quando a lâmina rasgou mais ainda sua pele. Segurou Jimin em seus braços, e com uma mão trêmula tentou limpar o sangue do rosto do rapaz. – Mas não quero um futuro que não tenha você. – Completou, tão baixo que Taehyung foi o único a ouvi-lo. Viu seus olhos perderem o foco antes de fecharem para sempre e sentiu como se algo dentro de si houvesse quebrado...

O lamento solitário de Taehyung se propagou pela praia deserta quando ele externou toda sua dor em plenos pulmões. As lembranças de sua antiga vida chegavam em torrentes o atingiam sem que ele pudesse fazer nada para impedir. As cenas mudavam muito rápido e se misturavam antes de finalmente se ajustarem. Aquilo era sufocante em todos os aspectos possíveis e o ceifeiro temia que não fosse suportar mais em breve.

Correu para o mar e caiu de joelhos sobre a areia molhada, a respiração ofegante saindo em nuvens à sua frente por conta da baixa temperatura. As ondas o atingiram e encharcaram suas roupas até pouco acima da cintura, as gotas geladas penetrando o tecido feito milhares de agulhas. Não precisava sentir frio se não quisesse, mas ignorou esse privilégio de bom grado e usou aquela dor congelante para clarear sua mente.

Encolheu-se abraçando o próprio corpo, tremendo de frio, seu organismo reagindo sozinho àquela sensação desconhecida para ele há tanto tempo, mas estava funcionando. Já percebia seus pensamentos se organizando melhor, então permaneceu ali por um bom tempo, por mais doloroso que fosse. Em algum momento seu corpo parou de protestar sobre a temperatura, nisso Taehyung deitou-se na areia molhada e apenas deixou que as ondas viessem enquanto observava o céu cinzento, tentando se focar em qualquer outra coisa até conseguir processar todas aquelas memórias.

Nunca tinha ficado tão cansado quanto naquele dia. O frio era cortante, a dor de cabeça era insuportável e as ondas não davam trégua, mas Taehyung não conseguia juntar forças o suficiente para sair dali. Sentia-se dormente em um estranho estado de alívio em meio àquilo tudo. Finalmente recuperou o que faltava em si mesmo todo aquele tempo. “Mas que merda eu faço com isso?”, perguntou-se, numa dúvida genuína.

Ficou parado daquele jeito por mais tempo do que poderia contar. As nuvens cinzentas agora estavam ainda mais escuras e a neve acumulada nelas finalmente fez sua aparição. Estava de olhos fechados antes e os abriu quando sentiu os leves flocos presos em seus cílios molhados – àquela altura ele não tinha certeza se por causa do mar ou do choro que não conseguia impedir.

- Feliz aniversário, Taehyung-ah – Jimin disse baixinho, tão próximo ao mais novo que ele sentia sua respiração contra as bochechas, que estavam muito vermelhas – não apenas por causa do frio. Seu coração de 13 anos batia descontroladamente enquanto Jimin se aproximava cada vez mais.

O primeiro floco de neve caiu entre os dois garotos e com ele também veio o primeiro beijo de Taehyung, o melhor presente que Jimin já lhe dera até aquele dia.

Suas roupas estavam pesadas e davam mais frio do que evitavam, havia gelo se formando em seus cílios e neve grudada em seu cabelo molhado, mas Taehyung sentia o peito estranhamente aquecido. “Então é por isso que eu gosto tanto de neve”, pensou, rindo para si mesmo. Era uma lembrança tão pura que ele nem se sentia no direito de tê-la depois de tudo que fizera.

Sentiu antes de ouvir aquela presença agora familiar com seus passos calmos pela areia. Permaneceu como estava até que o recém chegado fizesse todo seu percurso até ele. A água que o atingia antes cessou e ele apenas a ouvia em volta de si, como se o contornasse. Quando abriu os olhos, viu que se tratava disso mesmo e não ficou nada surpreso com o fato, já que RM estava de pé ao seu lado com as mãos nos bolsos.

- Oi, Namjoon. – Cumprimentou V, dando um sorriso de canto e sem usar sua voz. Não queria correr o risco de soar tão cansado quanto estava. O ceifeiro mais velho arqueou as sobrancelhas, surpreso com o quão amistosa fora a recepção do mais novo. – Não me olhe assim, eu sabia que você viria.

- Não foi tão fácil te achar – Começou ele, agachando-se perto do garoto deitado. – Sua presença mudou. – V inclinou a cabeça, intrigado, e Namjoon riu do gesto. – Quer se livrar dessa areia e clarear melhor a mente? Tá bem bagunçado aí, eu mal te entendi. - Rindo sem muita força, Taehyung apenas assentiu e se apoiou nos cotovelos para se sentar. RM teve que ajudá-lo, mas nenhum dos dois se incomodou com isso. Saíram da praia logo depois, o mar tratando de apagar qualquer registro de que eles sequer tivessem passado por ali.

Estava na água outra vez, mas num contexto bem diferente. Suas roupas sujas estavam jogadas em algum lugar do banheiro cheio de vapor, logo voltariam para quem quer que pertencessem como se nunca tivessem saído de lá. A banheira redonda estilo ofurô estava cheia até a borda e respingava água quente para todo os lados toda vez que Taehyung se mexia. O cabelo estava puxado para trás e ele apoiava o queixo nos joelhos, pensativo. Ouvia Namjoon conversando tranquilamente com a senhora que os acolhera no cômodo ao lado, mas estava exausto demais para se perguntar como aquilo era possível. Apenas presumiu que a senhora era como Jin, fosse lá o que isso significasse. 

- V? Tudo bem aí? – Namjoon perguntou, sua voz levemente abafada pela divisória de madeira e papel que os separava. – Tem umas roupas do Jin aqui pra você, talvez fiquem meio grandes, mas não fica estranho.

- Qualquer coisa está bem. – V respondeu, mas apenas para Namjoon. Levantou da banheira, nada incomodado com o choque térmico que o atingiu no torso e nas pernas enquanto a água quente escorria por eles. Encarou por um momento seu novo reflexo no espelho embaçado, sem realmente reconhecê-lo. Seu corpo era o mesmo, seu rosto era o mesmo, a cicatriz ainda se destacava na pele escura, mas aqueles olhos não estavam daquele jeito antes.

Qualquer resquício do cinza que o identificava se fora, sobrando apenas um azul tão escuro que era quase preto e brilhava numa luz nova e intrigante. Perdera as madeixas prateadas e foram substituídas por um azul claro que ele entendeu menos ainda. Passou uma mão pela superfície lisa do espelho, deixando um rastro úmido que borrava seu reflexo, e saiu do banheiro vestido num roupão preto grosso. Olhou para fora do quarto pela porta de correr entreaberta e viu Namjoon sentado na varanda com um semblante um tanto tenso.

Juntou-se a ele depois de se trocar, levemente incomodado pelo jeans preto um pouco longo. As mangas do casaco azul escuro cobriam parcialmente suas mãos e havia um sobretudo cinza com listras pretas finas se cruzando dobrado em um banco, mas o deixou lá. Ficou sentado de pernas cruzadas na varanda de madeira que dava para um amplo jardim de pedra começando a ser coberto de neve. Nem ele nem Namjoon disseram nada por um longo tempo, apenas observaram a neve cair em silêncio.

- Já se lembrou de tudo, não foi? – Começou o ceifeiro mais velho, não exatamente esperando uma resposta. – Essa parte pode ser um pouco difícil, mas você parece bem mais calmo do que eu esperaria.

- Há quanto tempo você tem essa aparência? – V soltou, subitamente, puxando um fio solto da manga de seu casaco com um olhar distante. – Quando foi me buscar naquela época, já tinha tudo isso aí – ele gesticulou para o cabelo e os olhos de Namjoon. – e isso faz mais de 300 anos. Eu não tinha pensado muito nisso até agora, mas...

- Mas aí algo parecido aconteceu com você. – RM concluiu por ele, com um sorriso de canto. Ele voltou a olhar o jardim, com a expressão indecifrável. – Sabe onde estamos? – Olhou V esperando uma resposta e continuou quando ele negou com um aceno. - É a casa da família do Jin. Esse lugar existe há quase tanto tempo quanto eu e é meu único porto seguro. Nada entra aqui a menos que eles permitam, é uma boa linhagem desse tipo de humanos. Talvez a melhor. Mas eu não os acompanho há tanto tempo por causa disso, acabou por ser uma boa coincidência. Eu só cheguei até eles porque achei Jin.

“Não o que você conhece hoje. Naquele tempo ele tinha outro nome e outra vida. A primeira que eu consegui achar desde que o perdi da primeira vez. Não é relevante dizer como o perdi, nem quanto tempo eu esperei. O que interessa é que eu me tornei o que sou pra ter o poder de procurá-lo. Soa familiar pra você?”

- Não tem como isso ser coincidência. – V disse, sem o mínimo tom de brincadeira ou descrença, era uma constatação. Namjoon riu, dando de ombros.

- E não é mesmo. – Confirmou. – Estou nesse ramo há mais tempo do que muita gente existe, Taehyung. Sei o quão raro é quando duas almas se tornam uma. Sei o quão maravilhoso isso pode ser, sei o quão terrível pode ser também. Tentei evitar que sofresse muito quando ofereci esse caminho, tentei de novo ao apagar suas memórias, fiquei do seu lado o quanto você permitiu quando soube de Jimin. Por mais que eu tenha interferido, não tenho controle nenhum sobre o que você escolhe ou o Universo decide.

“Já encontrei Jin duas vezes, mas não posso exigir nada que ele não queira fazer. Ajudar pessoas faz parte dele tanto quanto ser um Guia faz parte de mim, por isso ele continua voltando e não quero que a ligação que temos seja o que interfira que ele faça isso. Minha missão nesse mundo ainda não acabou e a dele naquele também não. Quero poder ajudá-lo o quanto ele me ajudou e nem sequer sabe.”

Namjoon pausou, pela primeira vez Taehyung sentindo o quanto eram parecidos. Não havia mais aquele abismo que sempre parecia ter entre os dois. Ele passou a mão pelos cabelos e suspirou. V pensou que talvez aquela história fosse mais difícil de contar do que o mais velho esperava.

- Desculpe. Acabei falando demais. Sobre como eu fiquei assim... Eu não sei por que é essa cor ou por que muda de cor, pra começo de conversa. – Continuou, cansado. – É só como o contato com aquilo que nos pertencia quando vivos se manifesta. Quando deixamos o mundo dos vivos, não viemos por completo, uma parte de nós continuava com aquele que perdemos. Se tocarmos nessa parte de um jeito familiar outra vez, volta pra nós. Isso nos torna diferente dos outros Guias e é tão raro que sinceramente você foi o primeiro em algumas centenas de anos que achei.

Antes que Taehyung pudesse dizer algo, uma senhora bem vestida num yukata florido e vibrante veio andando com passos calmos, saindo de um dos quartos com uma bandeja com dois copos de chá fumegando. Ela sorriu para os dois, simpática, e em seus olhos arredondados Taehyung viu traços que Jin herdara.

- O banho estava bom? Eu sei o quanto é difícil vocês acharem um lugar agradável para essas coisas, então pode vir aqui quando quiser! – Ela deixou a bandeja entre os dois e pôs as mãos na cintura, relaxada. – Eu gosto da companhia nessa casa enorme, também fico feliz que nosso Namjoon tenha trazido um amigo. Jin-ah sempre diz o quanto o acha solitário.

Viu Namjoon rir sem jeito e coçar a nuca com um olhar entretido, jamais esperaria isso dele. O chá tinha um aroma agradável e estava doce. Coisas simples assim eram o bastante para inundá-lo de mais memórias, as mais lindas e as piores, mas todas suas. Olhou Namjoon, tímido e parecendo não muito mais velho que ele, se perguntando se com ele também foi assim. E se realmente foi, como ele conseguiu lidar com tudo sozinho? Foi questão de costume? Esperança? Desistência? Pelo modo como Namjoon o olhou, Taehyung percebeu que estava pensando alto demais e deu um sorriso de desculpas.

- Já te disse que conversar assim na frente dos outros é rude – Repreendeu a velhinha, beliscando a orelha de Namjoon sem muita delicadeza. O ceifeiro se desculpou e fez uma careta quando ela o soltou.

- É só que o Taehyung ficou um pouco tímido – Ele disse, resolvendo colocar a culpa no mais novo. – Ele ainda não está acostumado a conversar com mais ninguém além de mim.

- É ótimo saber que agora eu tenho opção, pelo menos. – Rebateu, com as sobrancelhas arqueadas para RM deixando claro sua provocação. A senhora riu da ameaça de soco que veio do mais velho depois e fez um gesto amenizador para os dois ceifeiros.

- Vocês com certeza ainda têm muito o que conversar, vou lá dentro organizar algumas coisas para a visitação de amanhã. Fiquem à vontade – Ela disse, já andando até uma das portas de correr que levavam a outros cômodos. Antes que a porta fechasse, Taehyung viu algo que capturou sua atenção.

- Com licença, - Chamou ele, incapaz de se deter e sem tirar os olhos do objeto que estava naquele quarto. – eu posso... Eu posso ver isso? – Continuou, sem jeito, quando a senhora o olhou de forma interrogativa. Ela viu o item que ele apontava e deu um sorriso nostálgico antes de pegá-lo com cuidado nos braços.

- Você gosta de música tradicional? Não me admira pela sua idade, mas é raro que algum de vocês se lembre! – Ela deixou o instrumento de cordas perto de Taehyung, que não tirava os olhos do objeto. – Há um tempo ninguém toca, mas eu sempre deixo afinado, então deve soar bem. Se souber tocar, vai ficar me devendo um show de vez em quando. – A senhora deu uma piscadela e retomou seu percurso de antes, deixando os dois ceifeiros sozinhos.

Namjoon observava em um silêncio curioso enquanto Taehyung deslizava os dedos ao longo da madeira polida e enfeitada do instrumento entre os dois. As cordas não pareciam novas, mas estavam bem conservadas e emitiram uma melodia agradável quando o ceifeiro mais novo se atreveu a dedilhá-las. Confiante com o som que produziu, ajeitou a postura, dobrou um pouco as mangas longas do casaco e posicionou as mãos sobre as cordas.

As notas vieram para seus dedos como o ar para seus pulmões. O gayageum parecia ganhar vida sob o toque do jovem ceifeiro e seu som suave se propagava pelo jardim coberto de neve como se pertencesse àquele cenário desde sempre. Ele parecia calmo e cantarolava enquanto tocava e por um momento Namjoon viu nele o garoto de 22 anos que fora buscar tantos anos antes. Aquele mesmo garoto com uma vida tão incrível e uma personalidade tão cativante que teve um fim que não merecia. Desviou os olhos para o jardim e suspirou audivelmente, mais uma vez indignado pelo rumo que os acontecimentos levaram para Taehyung.

- Eu posso te ouvir. – V disse, pausando um pouco a música para retomar outra logo depois. – Sei que está preocupado, mas não tem motivo pra isso. Não vou repetir meus erros quando sei o quanto eles me fizeram mal.

- Está dizendo que... – Começou Namjoon, mas foi interrompido.

- Estou dizendo que não quero esquecer mais nada, - Taehyung falava calma, porém firmemente. – nem vou fugir. Não sei por que tudo isso aconteceu comigo, também não vou tentar descobrir. O que interessa eu já sei. – Ele parou outra vez, agora olhando para cima como se ouvisse algo. Deu um sorriso de canto indecifrável e voltou a tocar, agora com as notas familiares da música que RM o mostrara não muito tempo antes. Toda a partitura estava gravada em sua mente junto da letra, então cantou inteira em um tom baixo e único enquanto a neve caía agora mais lentamente, como se a paisagem acompanhasse a música.

O tempo todo Namjoon apenas o observava, pela primeira vez não tendo muita certeza do que dizer. Viu Taehyung perdido em seu próprio mundo enquanto interpretava a canção que combinava perfeitamente com sua voz e viu quando ele finalizou ainda sem dizer nada. O mais novo recolheu as mãos e puxou o casaco de volta, levantando-se logo depois.

- Já vai? – Perguntou RM, levantando também. – Eu posso avisar pra halmeoni se não estiver bem pra falar com mais gente.

- Estou bem. – Garantiu, mais uma vez com um sorriso impossível de ler. Levou o gayageum de volta para o quarto e pegou o sobretudo que deixara lá antes. Vestiu-se, calçou os sapatos e se virou para olhar Namjoon com as mãos nos bolsos. Analisou com cuidado o garoto de madeixas azuis na sua frente, pensativo. 

- Você mudou, seu punk. – RM deu um sorriso de canto quando V apenas deu de ombros. – Até duas horas atrás eu não esperaria nada do que estou vendo.

- Acho que vou continuar te surpreendendo por um bom tempo, hyung. – Ele riu do olhar arregalado que recebeu e voltou para o jardim. Foi seguido por um ainda chocado RM e parou um momento, contemplando as pedras cobertas de neve e o pequeno lago congelado com outros olhos. – Jimin está vivo, não sinto mais o elo de morte entre nós. – Anunciou, voltando-se para Namjoon. - Ele tem a segunda chance que ele merece. Eu lembro de tudo agora e finalmente estou completo. – Ele sorriu e naquele brilho novo Namjoon viu uma determinação que só vira uma vez naquele garoto, um dia 300 anos antes. – Essa é minha segunda chance também.

- Sinceramente eu estou com medo do que isso quer dizer. – Namjoon confessou, e ambos riram.

- Vamos ver. – Foi tudo o que disse. – Tenho que ir. Embora seja estranho continuar com o mesmo rosto quando tenho que Guiar outra pessoa. – Ele cutucou a própria bochecha com a cabeça um pouco inclinada e o cenho franzido numa expressão que o deixava bem mais novo do que era.

- Essa não vai ser a única coisa que vai achar estranho a partir de agora, confie em mim – RM riu, ainda sem processar muito bem tudo aquilo.

- Confio. – V  o surpreendeu mais uma vez com a resposta direta demais. – Espero que confie em mim também quando eu digo uma coisa. – Ele encarou o mais velho profundamente por um momento. – Às vezes o que você quer fazer e não faz te dá mais dor de cabeça do que se tivesse feito.

- Está arranjando uma desculpa pra ser imprudente, seu punk? – Brincou RM, sem acreditar no que estava ouvindo.

- Está arranjando uma desculpa pra ser medroso, hyung? – Recebeu um peteleco na testa por isso, mas aceitou rindo.

- Quem vai me dar dor de cabeça é você.

- Talvez. – Ele deu de ombros. – Mas não se preocupe, não estou com pressa pra arranjar confusão. – Deu uma piscadela e virou-se para ir embora sem dizer mais nada. Havia sumido antes que RM pudesse dizer algo. Sabia que veria aquele garoto de novo em breve, mas se perguntava quem realmente encontraria da próxima vez. Ele era praticamente uma força da natureza e Namjoon sentia que não seria capaz de acompanhar nem se tentasse.

Uma parte dele ficava preocupada e outra torcia para que pudesse ser um pouco como Taehyung. Tendo em mente o conselho que recebera, Namjoon se deslocou já sabendo para onde ir. Para quem ir.

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