Prólogo

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Mesquinho e humilde livro é este que vos apresento, leitor. Sei que
passará entre o indiferentismo glacial de uns e o riso mofador de outros, e
ainda assim o dou a lume.
Não é a vaidade de adquirir nome que me cega, nem o amor próprio de
autor. Sei que pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e
mulher brasileira, de educação acanhada e sem o trato e a conversação dos
homens ilustrados, que aconselham, que discutem e que corrigem; com uma
instrução misérrima, apenas conhecendo a língua de seus pais, e pouco lida,
o seu cabedal intelectual é quase nulo.
Então por que o publicas? – perguntará o leitor.
Como uma tentativa, e mais ainda, por este amor materno, que não tem
limites, que tudo desculpa – os defeitos, os achaques, as deformidades do
filho – e gosta de enfeitá-lo e aparecer com ele em toda a parte, mostrá-lo
a todos os conhecidos e vê-lo mimado e acariciado.
O nosso romance, gerou-o a imaginação, e não o soube colorir, nem
aformosentar. Pobre avezinha silvestre, anda terra a terra, e nem olha para
as planuras onde gira a águia.
Mas, ainda assim, não o abandoneis na sua humildade e obscuridade,
senão morrerá à míngua, sentido e magoado, só afagado pelo carinho materno.
Ele semelha a donzela, que não é formosa; porque a natureza negou-lhe
as graças feminis, e que por isso não pode encontrar uma afeição pura, que
corresponda ao afeto da sua alma; mas que, com o pranto de uma dor sincera
e viva, que lhe vem dos seios da alma, onde arde em chamas a mais intensa e
abrasadora paixão, e que embalde quer recolher para a corução,
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move ao inte-
resse aquele que a desdenhou e o obriga ao menos a olhá-la com bondade.
Deixai pois que a minha Úrsula, tímida e acanhada, sem dotes da natu-
reza, nem enfeites e louçanias de arte, caminhe entre vós.
Não a desprezeis, antes amparai-a nos seus incertos e titubeantes
passos para assim dar alento à autora de seus dias, que talvez com essa
proteção cultive mais o seu engenho, e venha a produzir coisa melhor, ou, quando menos, sirva esse bom acolhimento de incentivo para outras, que
com imaginação mais brilhante, com educação mais acurada, com instrução
mais vasta e liberal, tenham mais timidez do que nós.

ÚrsulaOnde histórias criam vida. Descubra agora