5.

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— Jaqueline, vem fechar a porta aqui pra mim! — grito, tentando retirar a minha carteira do bolso e equilibrar a bandeja de comida com a outra mão.

Ela vem correndo, ao perceber meu tom de voz meio desesperado. Minha meia quase ficou presa entre a porta e a parede, mas to viva e sã e salva. Minha irmã fechou a porta, resmungando algumas coisas que eu não prestei muita atenção.

Nem tive tempo de colocar uma roupinha mais apresentável, afinal, é a primeira encomenda que eu vou entregar aqui no prédio.

Aí você me pergunta, mesmo percebendo que eu não to muito no clima de falar disso, pois estou quase derrubando a comida do bonitinho no chão do corredor: Ficou ocupada fazendo o que, pra não ter tempo de se arrumar?

Dormindo.

E sonhando com a minha carreira de cantora que nunca vai dar certo pois não sou talentosa. É isso aí colegas, a vida é injusta.

Por que eu to falando disso?

Chego no andar de cima, assoprando um pouco de cabelo que cai sobre meu rosto. To precisando dar uma aparada nessa franja.

To querendo dar uma de apresentável? Logo eu, que zoei o pobre do moço?

To chamando ele de moço de novo *jura? Mas vai saber qual a idade dele?

Chego na porta do apartamento dele, e ajeito a postura antes de tocar a campainha. O nome dele. Meu deus, o nome dele! Qual o nome dele?

Pedro. Pedro? É, Pedro. Ok. Nossa essas horinhas de sono que eu tirei não serviram de nada, porque eu continuo lerda feito uma porta *ofendi a porta.

Longos segundos depois da campainha ser tocada, a porta finalmente se abre, e eu *sem querer fiz uma cara meio estranha. Sei lá o que foi aquilo, eu simplesmente juntei as sobrancelhas ao ver o clarão da lâmpada da sala de estar dele aparecer de repente.

E lá estava ele. Com uma cara de sono um pouco pior que a minha, e o cabelo inexplicavelmente bagunçado.

— Moça dos Lanche, é você?! — ele grita, mudando totalmente sua expressão sonolenta para uma surpresa, antes de rir rapidamente.

— Em carne e osso! — eu digo, levantando o braço o qual segurava a minha carteira, fazendo a mesma voar pra dentro do apartamento dele. Por sorte ele desviou — Ou só osso... — eu resmungo baixinho, depois de perceber o que acabei de fazer.

Pedro dá meia volta e pega a minha carteira, me devolvendo em seguida, meio sem graça.

— Desculpa. — eu digo, rindo.

— Tudo bem, eu já imaginei que você ia fazer alguma besteira. — ele resmunga, sorrindo.

— Nossa, fiquei ofendida. Mas aqui tá a sua janta. — eu entrego a bandeja, e ele coloca na mesinha de vidro próxima á sua porta.

— Valeu. Me espera aqui que eu vou pegar o dinheiro. — ele diz, antes de entrar meio atrapalhado em seu apartamento, sem fechar a porta.

Confesso que dei uma espiada. Fiquei lembrando dele se gabando, dizendo que eu poderia reconhece-lo da internet. A sala não me lembrava nada, mas o rosto dele...acho que já tinha visto antes.

Ele tem a minha idade, e a gente se trata como se fôssemos de épocas completamente diferentes. Estranho, mas engraçado.

Ele voltou, e me pegou fazendo outra cara estranha. Olhando para o teto da casa dele. Parabéns Lúcia, tá certinha mesmo.

— Você tá me devendo um nome. — ele diz, me dando o dinheiro.

— Um nome? Lula. — eu brinco, guardando o dinheiro na minha carteira *recuperada.

— O seu nome. É sério. — ele diz, aparentando realmente curioso. Eu bufo, já convencida.

— Eu não lido bem com seriedade. — dou de ombros, ajeitando meu piercing no nariz — Meu nome é Lúcia.

Ele ri, de cabeça baixa.

— E sou eu que tenho nome de idoso, né? — ele arqueia uma sobrancelha, sorrindo.

— Só nome mesmo, porque a cara é de um bebê de treze. — brinco. — Brincadeira, você parece um mendigo que vive bêbado. Sem ofensa aos mendigos, claro.

— Ah claro. E você é a adolescente rebelde que ouve Pink Floyd e Avril Lavigne... — ele diz, num tom sarcástico.

— Olha o preconceito, vovô. — balanço meu dedo em frente ao seu rosto.

Me assusto ao ouvir meu celular vibrar no meu bolso. É a minha irmã que tem nome de marca de produto de beleza. Piadinha interna entre nossas primas e eu.

"que demora
vem logo que temos mais clientes"

Reviro os olhos, antes de guardar o celular.

— Tenho que ir, bonitinho. Minha irmã Produtos Ivone tá me chamando. — eu digo, num tom mais alto do que eu planejava.

— ...Tá. — ele responde, meio confuso — Mas você não me conhece de nenhum lugar, mesmo?

— Claro que conheço! Daquele dia que eu achei que um velho safado queria me levar pra Turquia, mas na verdade era você. — eu brinco, e ele revira os olhos.

Pedro fecha a porta, e eu rio sozinha enquanto volto para o elevador. Chega outra mensagem da minha irmã.

"cadê você????????"

Eu me irrito, e respondo, um pouco antes de sair do elevador.

"EU VOU PAGAR JEQUITI!!
SE CONTINUAR ASSIM EU VOU PATROCINAR A NATURA AGORA"

A maturidade deve me odiar tanto, porque ela nem passa aqui pra me dar um oi, né? Ui ela é serelepe. Que vergonha, Lúcia. Nossa, lembrei daquela música do Rei Leão *eu acho que é do desenho, me corrijam se eu estiver errada.

"Vergonha, desgraça..."

Não lembro o resto. Só essa parte ficou na minha memória a vida toda.

dinner [orochinho]Onde histórias criam vida. Descubra agora