9.

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Por que as pessoas trabalham? Isso é horrível. Passei o dia perambulando pelo meu prédio, carregando comida pra lá e pra cá. Se algum dia a minha irmã reclamou da minha sedentariedade, hoje ela devia estar orgulhosa.

Se tem alguém que conheceu cada canto desse prédio, sou eu.

E falando em conhecimento, sabiam que beber água é importante? Já beberam água hoje? Se hidratem, a tia Lúcia agradece.

Passei um pouco do horário, mas tenho que entregar o jantar do Pedro, antes que ele me mande mensagem cobrando. É legal conversar com ele, apesar de que por algum motivo ele não quer que eu saiba que ele é um youtuber com milhões de inscritos.

Mas tudo bem, todos temos segredos. Até eu, que pareço ser uma pessoa super transparente.

Ouvi um pouco de All Star enquanto penteava meu cabelo e fazia um rabo de cavalo no mesmo. Agora to com um pique pra entregar comida.

Coitada da minha irmã. Cozinhou tanto hoje que não aguentou e dormiu sem nem tomar um banho. Não pense que vamos ficar só nós duas nesse negócio pra sempre. Pretendo chamar mais umas pessoas pra ajudar em breve, dependendo do dinheiro que conseguirmos. Talvez uma, mas ainda não é certo.

Toquei a campainha duas vezes, por algum motivo. Irritar ele, talvez?

A porta se abre rapidamente e uma garota loira me olha de cima a baixo, enquanto masca um chiclete. Eu acompanho seu olhar, pra ver se tenho algo sujo na minha roupa, porque o jeito que ela tá me olhando assusta qualquer um.

— Uma torta salgada. — eu sorrio, ignorando a cara dela e estendendo o prato.

Ela olha rapidamente para o prato, e vira sua cabeça um pouco pra trás. Parece ter mais gente na casa, porque ela sussurrava alguma coisa estranha.

Não demora muito e o proprietário da casa, senhor Pedro *mentiroso aparece na porta e sorri fofo pra mim.

— Bianca, pode pegar a torta. — ele diz para a garota, que dá de ombros em seguida e faz o que ele pediu.

A garota entra no apartamento, e outras vozes se manifestam. Realmente tem mais pessoas lá dentro.

— Bem simpática ela, né? — eu brinco, em um tom mais alto do que esperava, mas não me arrependo.

— Ela só tá em um dia ruim. — ele torce o nariz, me entregando o dinheiro da torta — E você pelo jeito tá bem o contrário, né? — ele cruza os braços, levantando uma sobrancelha.

— Não mesmo. Passei o dia que nem uma mula de carga, mas sobrevivi e passo bem. — balanço meu rabo de cavalo, dando de ombros — E você tá em uma reunião de amigos, né? — eu brinco, mas acho que ele levou a sério.

Surubis?

— Mais ou menos. Você pode entrar, se quiser... — ele abre espaço pra eu entrar, mas eu nego com a cabeça.

Isso não daria certo de muitas maneiras. Esses amigos podem ser youtubers, e eu não saberia agir de como que eles não saibam que eu sei que eles são youtubers. Deu pra entender? Eu to nervosa.

Se aquela garota foi daquele jeito quando me viu, imagina os outros? Não quero nem arriscar.

¡Dios me libre de esa maldición!

— É melhor eu voltar pra casa, mas você não parece muito animado pra quem tem um monte de amigos na própria casa. — eu digo, reparando na expressão desanimada totalmente notável dele.

— É que eu...briguei com eles. Com os meus amigos. — ele diz rapidamente.

— Ah, mas não precisa ficar triste por isso. — eu digo, reconfortadora.

— Como não? — ele pergunta, meio indignado, mas parecendo ansioso pela resposta.

— ...Eu não tenho uma boa resposta. — eu digo, percebendo que realmente não sou boa em reconfortar pessoas.

Ele ri, e eu o acompanho. Legal, fiz uma pessoa feliz e fiquei feliz instantaneamente com a felicidade dela.

Ai Lúcia, cala essa boca!

— Quer um abraço então? — eu pergunto, abrindo os braços, e dando de ombros — Não sei se vai ajudar muito, porque você é mais alto que eu. Só que não, né homem de 1,40?

— Que mentira, eu tenho 1,80 no máximo. — ele faz uma cara de cu. — Tanto faz. — Pedroca responde sem graça, e me abraça rapidamente.

Minha cabeça fica por cima de seu ombro, e eu consigo ver umas pessoas sentadas no sofá da sala. Não tive tempo pra reconhecer todas e dizer se são do YouTube ou não, porque a garota loira de antes ficou me olhando como se eu tivesse comido o chocolate que ela deixou na geladeira pra depois.

Por que eu pensei nisso?

Nos separamos do abraço de uma forma meio estranha, porque eu já estava contando os segundos pra assistir a minha morte lenta e dolorosa.

Nos despedimos, e eu nunca pensei que um dia fosse para o elevador com tanta pressa quanto hoje.

Surpreendente.

Ou não.

dinner [orochinho]Onde histórias criam vida. Descubra agora