Capítulo 3 - Sunny

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Acordei muitas vezes naquela noite. Qualquer som estranho me despertava. Tinha sido uma noite bastante longa. Consegui um sono mais profundo quando já estava amanhecendo, porém, um barulho que meu subconsciente registrou, me fez abrir os olhos, assustada.

Eu não estava mais sozinha.

Sentei em um pulo, procurando por meus óculos no processo.

- Ei, não precisa se assustar - disse uma grave voz masculina.

Encontrei os óculos e os coloquei no rosto, piscando para clarear a visão. O homem em minha frente era alto e eu estava me sentindo ridícula sentada ali no chão, enquanto ele me analisava atentamente.

- Eu não roubei nada - falei, com medo de que ele me denunciasse, já que dormi no lugar sem sua autorização.

- Você está bem? - perguntou, sentando em uma cadeira próximo a porta.Observei seu rosto, sua barba por fazer cobrindo seu maxilar e o queixo, seu cabelo castanho, algumas mechas caindo sobre sua testa e os olhos... De onde estava não conseguia decifrar a cor deles, mas sabia que ainda estavam em mim.

- Estou... - Comecei a recolher minhas coisas e jogar tudo dentro da mochila. - Eu só precisava de um lugar para passar a noite. A porta estava aberta e...

Parei de falar, me erguendo desajeitada. Eu estava uma bagunça. E não só externamente.

As lembranças de minha mãe me expulsando rodavam em minha mente como um lembrete constante de que eu estava oficialmente sem um lugar para morar.

- Desculpa por ter invadido - falei apressada, indo em direção à porta.

- Espere...

- Juro que não vai mais acontecer - cortei-o.

Ele tentou segurar meu braço quando passei por ele para alcançar a porta, mas me afastei com um pulo. Ele ergueu as mãos, como se dissesse que não me tocaria mais.

- Desculpa - falei mais uma vez, antes de fugir dali, impondo distância entre nós.

Andei pela praia por alguns minutos, pensando no que faria. Primeiro, precisava de algo para comer. E precisava urgentemente usar um banheiro.

Parei em uma lanchonete e pedi ovos mexidos, e já que estava sem casa e ninguém para mandar em mim, pedi também uma porção de fritas e chá. Eu odiava café. Justine costumava dizer que eu não era normal por não gostar de cafeína.

Enquanto esperava o pedido, decidi ir ao banheiro. Fiz o que tinha que fazer, lavei o rosto e escovei os dentes. Antes de sair de casa consegui pegar alguns itens de higiene pessoal e agradeci por ter conseguido pensar nisso na hora. Aproveitei e troquei de roupa também. Eu precisaria estar o máximo possível apresentável se realmente procuraria um emprego.

Saí do banheiro e sentei-me à uma das mesas, esperando o meu pedido que logo me foi entregue por uma garota sorridente. Agradeci a ela e devorei a comida rapidamente. Parecia que havia dias que eu não me alimentava. Depois de pagar tudo que consumi, saí da lanchonete, me perguntando por onde começaria.

Andei algumas quadras durante a manhã, entrando em lanchonetes, restaurantes, lojas de roupas e biquínis, sem muito sucesso. Fiz uma parada para almoçar enquanto observava o mar da sacada do restaurante. Coloquei uma mão sobre a barriga e me perguntei como pude ser tão ingênua. Como fui me deixar levar por palavras e gestos doces. Olhares que julguei serem somente para mim.

Balancei a cabeça para me livrar desses pensamentos. Teria que me livrar de outra coisa também.

Quando saí do restaurante, andei sem rumo por alguns minutos, até parar em frente a uma loja de artigos esportivos. Estava preparada para passar direto quando uma pequena placa chamou minha atenção.

Eles estavam precisando de funcionários.

Respirando fundo e ajeitando o cabelo com os dedos, entrei na loja, rezando para quem quer que estivesse me ouvindo, me ajudar a conseguir aquele emprego.

Havia um cara atrás do balcão que sorriu assim que me viu andar em sua direção.

- Oi, em que posso ajudá-la?

Ajeitei os óculos e apontei para a placa por cima do meu ombro.

- Vim pela oferta de emprego - falei, tentando soar firme.

As pessoas não empregavam gente insegura.

Se possível, o sorriso dele aumentou ainda mais depois de me ouvir.

- Mãe, temos uma candidata! - ele gritou.Logo uma mulher surgiu do fundo da loja e me olhou, com um sorriso contido e um olhar avaliativo.

Era a ela quem eu deveria convencer a me contratar.

- Está interessada na vaga?

- Sim, senhora - respondi, mas uma vez erguendo os óculos na ponte do nariz, em um ato nervoso, então estendi a mão, decidindo me apresentar. - Me chamo Sunshine Lawrence.

- Sunshine? Sério? - o garoto perguntou, divertido.

- Sim, mas pode me chamar de Sunny.

- Eu me chamo Emma, e ele é o Eric. - Ela entrelaçou os dedos de suas mãos e as apoiou no balcão. - Tem experiência com vendas?

- Não, senhora.

- Sabe alguma coisa sobre itens esportivos? Olhei em volta, sentindo meus ombros murcharem.

- Não, senhora - respondi, em um fiapo de voz.

Mas então lembrei que eu precisa de uma emprego. Eu precisava tentar com mais afinco.Ergui meus ombros e fiz minha voz soar firme quando falei.

- Mas eu aprendo rápido. Sou boa em aprender coisas novas. Eu posso ser uma excelente funcionária se a senhora me der uma chance.

Ela trocou um olhar significativo com o filho antes de olhar minha mochila e minha bolsa.

- E essa bagagem?

- Estou a procura de um lugar para ficar também. Conseguindo o emprego, irei poder resolver essa questão com facilidade - falei, esperançosa.

Emma assentiu, ficando em silêncio por alguns segundos que pareceram se arrastar eternamente.

- Certo, nós podemos fazer um período de experiência e ver se você se adapta bem à loja. Vou precisar de seus documentos e que esteja disposta a começar seu treinamento hoje mesmo.

O sorriso que se abriu em minha boca deve ter sido o maior que dei em dias.

- Estou pronta para começar agora mesmo - garanti, já pegando meus documentos na bolsa e entregando a ela, que os avaliou com precisão.

- Certo. Temos um quartinho nos fundos que não estamos usando. - Ela olhou minha mochila mais uma vez. - Enquanto estiver aqui, poderá usá-lo. Mas terá que arrumá-lo e limpá-lo para que consiga dormir adequadamente.

Senti meus olhos ficarem úmidos mas não permiti que nenhuma lágrima escorresse. Eu seria forte na frente dessas pessoas.

- Muito obrigada! - falei, a voz falhando levemente. - Eu prometo que a senhora não vai se arrepender por me contratar.

- Irei me arrepender facilmente se continuar me chamando de senhora - alertou, mais em seu rosto tinha um sorriso suave que me fez relaxar instantaneamente.

- Venha, vou te levar até o quarto enquanto minha mãe lida com seus documentos - Eric falou, me mostrando o caminho até o quartinho.

Eu consegui um emprego. Teria que me esforçar para aprender tudo com rapidez. E daria o máximo de mim.

Aquele era o primeiro passo. O próximo era eliminar tudo e qualquer coisa que me fizesse lembrar dos erros que cometi e da total falta de compreensão de minha mãe.

Precisaria ir a uma clínica especializada com urgência.

Um Minuto Para o Pôr do Sol (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now