Capítulo 7

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— Meus pais morreram quando eu tinha treze anos — comecei, enquanto ela comia seu yakisoba — Minha mãe se foi primeiro, por suicídio. Já o meu pai, bom... Ele nunca quis morrer, foi assassinado. Ambos no mesmo ano.
A garota me olhava atentamente, sua expressão se entristecendo a medida em que eu avançava com a história. Ela parecia compadecida de mim, de minha "dor".
— Eu realmente sinto muito — pressionou os lábios — É tão triste saber que você teve que passar por tudo isso tão cedo.
— Não sinta — endureci-me na cadeira, pronunciando as palavras com desgosto — A única coisa boa que fizeram por mim foi morrer.
Seus olhos saltaram levemente e ela enfiou uma garfada com macarrão e legumes na boca, mastigando-os lentamente, parecendo querer ganhar tempo para pensar no que dizer.
— Não precisa ter medo de mim — dei de ombros — Você pode até me achar uma pessoa ruim, mas acredite quando eu digo que eles estão melhores mortos.
Ela engoliu a comida e me encarou por um longo minuto que perdurou ao nosso redor, fazendo-me sentir como se tivesse levado um soco no estômago. Relembrar tudo aquilo não era uma coisa simples, muito menos algo fácil para mim. Contorci a boca, recostando-me sobre a cadeira e abocanhando um sushi.
— Por que se sente assim sobre eles?
Engoli o sushi, que de repente pareceu não ter sabor algum. Suspirei.
— Isso é história para outro dia, Ayla — abri um sorriso forçado, sabendo que esse "outro dia" provavelmente nunca chegaria — O importante é o que vem agora.
Bebi um pouco de meu suco de laranja.
— Lucinda era uma das empregadas da minha mãe, ela tinha muito amor por mim e esteve comigo desde os meus sete anos de idade — aquela era realmente a parte boa da história (a melhor e única parte que valia a pena contar) — Quando eu perdi meus pais, fui para uma casa lar. Passei um ano inteiro lá, mas ela sempre ia me ver — sorri — Até que finalmente, conseguiu me adotar.
Eu sentia um amor imenso por aquela mulher, ela sim era a minha mãe de verdade, aquela que não me carregou em seu ventre, mas sim em seu coração. Um coração grande e amoroso, disposto a tudo para me proteger de todos os males que pudessem me açoitar.
— O dia em que ela me levou para casa, foi o mais feliz da minha vida — sorri com carinho — Eu ganhei um lar, uma mãe e até uma irmã mais velha, Luíza.
Ayla estava perceptivelmente envergonhada, fazia algum tempo desde que não a via com as bochechas coradas daquela maneira. Ela ponderou sobre o que falar, comendo sua última colherada de yakisoba.
— Eu sinto muito pelo que falei dela. Não fazia ideia de que era sua irmã.
Dei de ombros, mostrando-lhe um pequeno sorriso de lado.
— Não tem problema — pisquei para a garota — Desde que não faça de novo.
— Não farei — garantiu-me.
Eu paguei a conta e nos dirigimos até o meu carro. Abri a porta para que ela entrasse, e então fui até o banco do motorista. Dei partida no carro, mas não quis funcionar. Franzi o cenho, tentando novamente. Nada. Após a quinta tentativa, sob os olhos atentos de Ayla, que tinha um leve sorriso brincalhão nos lábios, desisti.
— Acho que terá de ser da moda antiga hoje — sorri, descendo do veículo, abrindo a porta para que a garota saísse e estendendo-lhe a mão.
— Parece que sim, meu bom senhor — riu.
Tranquei o carro, deixando-o estacionado ali. No dia seguinte teria que encontrar um bom mecânico para dar um jeito naquilo. Eu fazia minhas gambiarras, mas não em meu tão precioso porsche.
Nós andamos pelas ruas escuras, iluminadas apenas pelos postes e pela luz da lua. Conversamos e gargalhamos sobre coisas fúteis.
Após dez minutos de caminhada, a chuva começou. Nos primeiros segundos foi apenas uma fina garoa, mas então, como um monstro descendo do céu, ela se fez furiosa e implacável, e nós corremos.
A garota ria contra as gotículas espessas de água que caiam, até que de repente, escorregou. Meus braços foram de encontro ao seu corpo no mesmo segundo, impedindo-a de cair. Nossos rostos ficaram tão próximos que por um segundo, tudo o que eu pude pensar foi em como seria maravilhoso beijá-la, e peguei-me desejando isso. Mas então, um raio ecoou no céu, deixando-o claro por um segundo. Ergui a garota, como a um bebê, sentindo meu ferimento reclamar do esforço.
Ayla tentou inutilmente se soltar de meu aperto, mas por fim, aceitou que eu a carregasse. Andei a passos largos, até me ver diante do portão da minha casa.
— Vamos ficar por aqui até a chuva passar, tudo bem? — falei alto contra a chuva que escorria por nossos corpos e caía forte.
Ela assentiu enquanto eu abria o portão. Entramos na sala, pingando água, e dando de cara com as duas curiosas que assistiam televisão. Luíza lançou-me um olhar malicioso assim que teve a chance e mamãe apenas nos encarou por segundo, tentando disfarçar uma risada.
— Oi — Ayla se pronunciou, suas bochechas corando no mesmo instante.
— Olá — mamãe e Luíza disseram em uníssono.
— Fiquem aí que eu vou buscar uma toalha — dona Lucinda se dirigiu até o meu quarto, voltando pouco depois com duas toalhas pretas e dois pares de chinelos.
Nós nos secamos, enquanto alimentávamos os dois pares de olhos curiosos que nos encaram, famintos por qualquer gesto ou palavra que deixássemos escapar. Por fim, minha irmã atirou-me uma piscadela, puxando a outra curiosa para a cozinha, supostamente para fazer um chá.
— Você está tremendo —sorri para a garota ao meu lado, cuja toalha que segurava já estava totalmente encharcada e os chinelos nos pés, mesmo sendo de Luíza, caberiam no mínimo mais um pé.
— Estou com frio —bateu os dentes, tentando sorrir de volta.
— Vem aqui — puxei-a para o meu quarto.
Ela adentrou-o, passando os olhos por ele. Empurrei-a para o banheiro, contra suas tentativas de me impedir.
— Tome um banho quente, têm toalhas limpas e uma escova de dentes nova no armário sob a pia — indiquei — Pode ficar tranquila, quando terminar, haverá roupas limpas sobre a cama — ela me lançou um olhar desconfiado. Sorri — E eu não estarei mais aqui — garanti.
Ayla riu, fechando a porta atrás de si e eu me dirigi até a cozinha, sabendo que aquela chuva não passaria tão cedo, o que a condenaria a ficar ali até o amanhecer.


Olá, pessoinhas. Como vão? Tiveram um bom dia? Contem-me!
Aqui está mais um capítulo para vocês, escrito com muito carinho no meu único tempo livre dessa semana, que foi: agora kkkkk.
Espero que gostem.
A vocês, só tenho a agradecer pelas leituras e votos. Um agradecimento especial a SthefaniAlexandre, uma mulher incrível e que me apoia muito em minha jornada (obrigada por me ajudar tanto 💞❤). Obrigada também RoselianaDoCarmoViei, por ter acompanhado "O Beijo da Morte" e por agora estar lendo também "Nenhum de Nós" 😘❤. Por fim, um último obrigadinho ao meu amado GabrielZRocha, por estar sempre comigo, me ajudando, votando e lendo meus capítulos desde o início ❤❤.

Nenhum de NósOnde histórias criam vida. Descubra agora