John Pequeno

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No fim de tarde retornamos a Nottingham pela portão do outro lado da cidade, tomando o cuidado de retirar as capas que usávamos e enrolá-las como se fossem trouxas trazidas sob os braços. Estávamos imundos, exaustos e, devo confessar, bastante assustados.

Os cavalos já não estavam mais presos às estacas próximas ao mercado e seguimos para a casa de Elizabeth. Ao entrarmos nos pátio, nos deparamos com Percy a lavar e escovar os animais como um bom escudeiro, e eu suspirei de alívio.

Ele nos cumprimentou com uma saudação fingida, enquanto passávamos em direção ao salão.

— Tudo bem, Percy? — Ergui uma sobrancelha curiosa, mas também disfarçando minha ansiedade. Dois cavalariços o ajudavam.

— Algumas nuvens de tempestade no horizonte... — ele me alertou, escovando a crina de Bucéfalo que relinchou feliz, alheio aos nossos problemas.

Gillian fez um sinal de queixo, chamando-me. Eu rezava para que ninguém perguntasse onde havíamos passado o dia e pudéssemos nos esgueirar despercebidos para nossos aposentos.

Contudo, não tivemos esta sorte. Assim que entramos no salão demos de cara com John; ele andava de um lado para o outro com as mãos cruzadas atrás das costas e um ar furioso, enquanto Elizabeth sentava-se diante da lareira e bordava.

Elizabeth bordava? Logo vi que havia algo errado. Jamais a vira bordar, e muito menos sentar-se encolhida e com uma aparência submissa.

— Onde estavam? — John encarou-nos com o cenho franzido e olhos atentos como os de um falcão.

— Estávamos... na... — O arqueiro lembrou-me de meu pai em seus piores dias, e isso fez minha mente apagar-se, enquanto o maldito anjo e até mesmo o demônio que habitavam minha alma batiam asas e fugiam.

— Treinando na floresta — Gillian respondeu calmamente e nos salvou.

Os olhos de John estreitaram-se.

— Com estas roupas? — Ele apontou para meu peito. Tanto eu como Gillian vestíamos apenas as camisas usadas por baixo das túnicas e calças justas de caçada. As espadas pendiam da bainha dos cintos, amarrados de maneira displicente às cinturas. Parecíamos dois camponeses voltando de um dia duro de trabalho, e não filhos de lordes, mesmo que deserdados.

Mais uma vez, foi Gillian quem falou:

— Ouvimos boatos de bandidos... Não podíamos andar por aí como se fossemos à uma festa!

— E não levaram os cavalos?

— Percy queria trocar as ferraduras e prepará-los para seguir viagem — Gillian continuou, enquanto eu permanecia em silêncio e tentava não morder os lábios.

— Eu perguntei a Robert! — John rugiu, sem desviar os olhos dos meus.

Ele ainda não se esquecera dos dias em que interrogava os bandidos caídos em suas mãos. Estremeci, perguntando-me se os torturava.

Abri a boca, e depois a fechei, emitindo apenas um som estranho. Elizabeth, quieta até agora, foi quem me salvou desta vez.

— Deixe-o, querido... Preciso de você, Robert! — chamou-me, batendo a mão no assento do sofá onde se sentava.

Corri para lá o mais rápido que pude e sentei-me ao seu lado.

— Você também, Gillian! Ajude-me! — Elizabeth pediu e Gillian também voou e ajoelhou-se .

Ela estendeu o bordado para nós. Eu nunca vira algo tão mal feito.

— Já me contaram que aprenderam a bordar quando eram crianças. Acho que errei este laço... — Mostrou um amarfanhado de fios em um canto do tecido.

SOBRE AMOR E LOBOS Vol. 2,5: Regras de Amor e Guerra (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora