Um Duelo

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Estávamos sozinhos sobre o penhasco. A hospedaria estava a uma milha de distância, muito longe para que alguém escutasse um pedido de socorro,  o qual eu jamais faria em voz alta de qualquer maneira.

— Como me encontrou? –indaguei, recuando alguns passos. Tentava ganhar tempo, enquanto rezava ao anjo pedindo por ajuda.

Gawain torceu os lábios em seu sorriso perverso. Como sempre, percebia meu medo e divertia-se.

— Quando voltei à Aslan e descobri que fora roubado, imaginei que fosse você o culpado. Sabia que seguia para a Aquitânia, então bastou cavalgar rapidamente até Dover e esperá-lo. Conclui que a comerciante procuraria a melhor hospedaria da cidade e pacientemente aguardei durante os jantares – ele ergueu uma mão – e surpresa! Estou aqui! Feliz com o encontro?

Praguejei por dentro. O rapto de Aline nos atrasara, e assim ele pudera passar à nossa frente. Como de costume, eu subestimara meus inimigos.

— Sim! Aguardava o momento de acabar com você! — menti, apertando o punho da espada.

Ele soltou uma risada estranha, que mais parecia o grasnado de um corvo, e fez um sinal com o queixo, chamando-me para a luta.

Franzindo a testa e estreitando os olhos, rugi como um lobo acuado e parti para cima dele.

Trocamos golpes de espada. O encontro das lâminas ressoava com o vento, misturando-se aos nossos rugidos de ódio. Gawain atacava-me com golpes controlados e eu percebia que ele me poupava. Queria algo de mim.

— Onde está meu dinheiro? — ele enfim urrou a pergunta entre os golpes. — Diga e o deixarei vivo!

Eu consegui sorrir.

— Distribui aos pobres de Nottingham. Não ouviu os comentários?

Rugindo de novo, ele investiu e juntou o corpo dele ao meu, prendendo meu braço e a espada, envolvendo-os com o braço dele e pressionando-os entre nós. Nossos olhares se cruzaram, desafiando-se. Quase ri de mim mesmo com a ironia do destino; imaginara uma bela garota em meus braços mas, ao invés disso, tinha agora Gawain.

O rosto dele contorcia-se de raiva.

— Você fez o quê? — vociferou, incrédulo.

Meu sorriso se alargou.

— Dei aos pobres, panaca! — repeti. — Se é isso o que procurava, perdeu seu tempo. Não tenho mais nada comigo!

Com um berro enfurecido, ele me empurrou para longe. Meus pés escorregaram nos seixos da trilha e eu tombei para trás. A espada escapou de minha mão.

Gawain atacou com um pulo, erguendo a lâmina e depois descendo a ponta em direção ao meu peito. Consegui rolar para o lado e tentei levantar, mas ele impediu-me com um chute e jogou-me ao chão novamente; golpeou, desta vez mirando a lâmina para minha barriga. Desesperado, virei o corpo e as pernas, atingindo-o com um forte chute na lateral do tronco.

Ele caiu e eu fui para cima dele. O maldito também perdera sua espada na queda e rolamos, grunhindo e trocando socos.

No calor da luta meu medo se desvanecera e eu descobria que o infindável treinamento com John ao menos servira para alguma coisa. Consegui passar o braço pelo pescoço dele e prendi sua cabeça, golpeando-o com um soco violento. Ele arquejou e tentou escapar. Soquei de novo, rolando o corpo por cima dele, prendendo-o ao chão com meu peso e continuando a envolver a garganta dele com meu braço.

— Devia me agradecer por ter ajudado alguém com seu dinheiro... Quem sabe passará menos tempo no inferno! — provoquei-o.

Urrando como um animal feroz, ele tentou livrar-se do meu aperto. Urrei de volta e comprimi sua garganta com mais força.

Eu começava a ficar confiante. Gawain arquejava sem ar, o rosto retorcido em uma máscara de cólera, enquanto eu o mantinha preso firmemente. Enfim, depois de um tempo o corpo dele amoleceu sob o meu e seu rosto tombou para o lado.

Com um suspiro de alívio, relaxei o aperto e comecei a me erguer. Porém, de súbito algo acertou minha têmpora, fazendo luzes explodirem em minha cabeça.

Deixei escapar um grito de dor e caí, atordoado. Em meio à névoa que toldava meus olhos percebi que Gawain levantava-se e ajoelhava-se; ele tinha uma pedra na mão com a qual me acertara. O farsante fingiu o desmaio!, compreendi tarde demais. A mão dele se ergueu e ele bateu de novo.

Apaguei.

Quando abri as pálpebras, descobri que ele me arrastara para a beirada do penhasco. O mar rugia abaixo e devorava as pedras sob o precipício. O vento fustigava meu rosto. Apavorado, crispei as mãos no chão tentando me agarrar na grama e voltei os olhos a procura de Gawain.

Não devia ter feito isso! Estremeci e mordi os lábios para esconder um gemido de pânico. Ele estava agachado ao lado e os olhos dele me examinavam, como uma serpente prestes a dar o bote.

— Acordou? Queria que soubesse vai morrer... e que depois alcançarei seu amigos e os matarei um a um— ele sibilou, torcendo os lábios em um sorriso pérfido.

— Não! — gritei um protesto, soerguendo o corpo e rastejando para longe dele. Minha testa latejava de dor e eu tremia com o coração disparado, vendo as ondas baterem nas pedras como se me aguardassem. Ainda aturdido pelas pancadas, esforcei-me para me erguer e consegui apoiar um dos joelhos no chão.

Gawain também se levantara e me seguia, devagar, saboreando a vitória. Ele recuperara a espada e, por fim, encostou a ponta da lâmina em minha garganta.

Ainda ajoelhado, ergui o queixo, cerrei os punhos e o encarei com orgulho. Ao menos enfrentaria a morte com o mínimo de dignidade.

— Não vou sentir sua falta — ele disse e, soltando uma risada que ecoou ao vento, deu um chute em meu peito e empurrou-me para o abismo.

— Não vou sentir sua falta — ele disse e, soltando uma risada que ecoou ao vento, deu um chute em meu peito e empurrou-me para o abismo

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