Capítulo 3

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Sobre Poções

-Isso você aprendeu em alguma escola de Comensais da Morte?

Pansy parou de cortar e apoiou a faca na mesa.

- Como? – fez-se a desentendida porque ela não havia gostado nada da brincadeirinha.

- Uma pessoa normal não sabe manejar uma faca dessa maneira, convenhamos.

- E então eu devo ter aprendido numa escola de Comensais? – perguntou sarcástica.

- Onde mais vão ensinar algo assim?

Pansy deu de ombros e decidiu terminar o pouco que faltava, afinal teria que sair dali o antes possível para começar a ronda noturna e seria a glória manter-se distante daquela sangue-ruim de merda.

- Vamos, Parkinson, você é uma covarde, sequer assume que participava desse maldito círculo.

- Eu já te disse que tira conclusões rápido demais, talvez eu deva repetir – murmurou despejando as folhas no caldeirão e misturando.

Pansy sabia que a outra lhe olhava atentamente, e aquilo era incômodo demais. Ao menos que falasse algo, que confabulasse mais sobre seus devaneios absurdos, ou que parasse de uma vez por todas de olhá-la como se fosse um bicho raro.

- O que? – Pansy a olhou, esperando que ela respondesse o que lhe parecia tão interessante nela, porque estava até os nervos de sentir-se observada.

- Não me diga que não te aceitaram no círculo, e então para que te aceitassem você fez o que fez, tentando entregar a Harry.

Pansy revirou os olhos, cruzando os braços e observando a outra.

- Ou então você era do Circulo, igual que Malfoy e o trabalho de vocês era tentar facilitar as coisas – seguiram olhando-se – Por que não reage?

- Você é ridícula, Granger.

Hermione encrespou os lábios com raiva, aquela maldita parecia não sentir nenhuma daquelas palavras, como se ela não houvesse dito absolutamente nada. Talvez ela realmente fosse comensal e dentro de seu treinamento havia aprendido a fazer uma cara neutra para quando a acusassem ou qualquer coisas assim.

- Covarde. Sequer assume o que fez, o que era, o que é, e sempre será: uma covarde!

Pansy respirou fundo, cansando-se daquela lenga lenga, porque Hermione Granger era demasiado simplista, e isso era muito cansativo.

- Você está me cansando... – murmurou vendo a outra acrescentar os ingredientes da segunda parte da poção, enquanto ela mexia.   

- Você é bastante egocêntrica, não é mesmo, acha que só você se cansa das pessoas, mas seguramente o resto das pessoas deve estar bastante cansado de você, dessas suas mentiras. Dessa sua cara cínica – seus olhos se fixaram nos braços da Parkinson – É por isso que você só anda com mangas longas? Para que não vejam a sua marca negra?

Pansy a olhou nos olhos, e encontrou bastante maldade. Ela nunca imaginou que a Granger fosse tão irresponsável. Depois da guerra muitos assuntos viraram tabus, e lá estava ela arriscando-se para encontrar respostas.

Parkinson olhou no livro o que faltava e começou a distribuir os últimos ingredientes, que era uma série interminável de pós de cores diferentes.

- Por que me ignora? Como é capaz? Depois de tudo o que fez!

- Tem muita gente que fez coisa pior, mas você não está enchendo o saco deles, ou está?

Hermione ficou quieta. Podia ser verdade, mas aquela sonserina havia tentado entregar seu melhor amigo para a morte, fazer com que o mundo entrasse numa espécie de escuridão e tudo mais, e isso para Hermione era razão suficiente para ser um pé no saco com quem quer que fosse.

- Por que não diz a verdade? Simplesmente diga: sim eu era comensal, queria ser ou o que seja! Mas não se faça à desentendida!

- Não, eu não era Comensal. Satisfeita?

- Eu não acredito em você!

- Eu não preciso que você acredite, sua bastarda de merda! - Gritou Pansy, fazendo a outra arregalar os olhos e encher-se de um nervosismo típico das discussões.

- Mas eu preciso saber!

Pansy arregaçou as mangas até os cotovelos, com raiva, sem pensar ou olhar e estendeu os braços na direção da outra.

- Está satisfeita? – gritou, enquanto os olhos de Hermione não viam nada de errado a não ser uma fina cicatriz em cada pulso.

A mente de Hermione agiu rapidamente e ela arregalou os olhos. Pansy havia tentado cometer suicídio, era por isso que usava as mangas longas, para esconder as cicatrizes. Ela soltou o ar, percebendo que o havia prendido quando a outra levantou as mangas, e respirou fundo.

Pansy pareceu sair rapidamente do torpor raivoso em que entrara, após ver Hermione encarando suas cicatrizes. Então ela percebeu o que fazia e retraiu os braços, baixando as mangas da camisa e começou a jogar seus pertences dentro da bolsa.

- Eu preparei toda a poção desde que cheguei, por que você só soube me aborrecer e conseguiu o seu objetivo. Se não se importa você faz o relatório, porque eu ainda tenho uma ronda por fazer essa noite.

Hermione fez que sim, sem mover-se ou falar, estava estática, aquilo a pegara de surpresa, estava tentando encaixar as peças, mas não podia, não conseguia, algo falhava naquela história. Por que uma menina como Pansy Parkinson tentaria suicídio?

- Se eu fosse você, Granger, eu não me meteria tanto na vida das pessoas que não são suas amigas. Porque eu sou muito pacífica, mas muita gente não é – disse, sua voz soou amarga e Hermione se arrepiou, um pouco envergonhada de ter feito aquilo com a sonserina.

A porta bateu com força, deixando Hermione perdida no silencio da classe.

E, naquela noite, ela não conseguiu dormir, olhando para o teto de seu quarto vazio, sem interferência de ninguém. E pela primeira vez teve raiva de ter um quarto só seu, por ser a única grifinória do sétimo ano extra de volta a Hogwarts.

Por quais motivos aquela menina sempre tão esnobe e metida, que tinha tudo o que queria e mandava e desmandava nas demais garotas da Sonserina, se cortaria daquela maneira. Tentaria o suicídio. O que levaria uma pessoa a isso? Amor não correspondido ou qualquer uma dessas idiotices adolescentes que a maioria das meninas fúteis padece?

Hermione revirava na cama, de um lado para o outro, buscando uma posição agradável, tentando encontrar a melhor maneira de dormir, buscando o sono na fronha do travesseiro, em vão. A imagem do pulso da menina estava fixada na sua mente.

Se sentia tão idiota. Tão ridícula por ter feito a outra levantar aquela manga da camisa. Por que, no fundo, não queria ter de compartir com Pansy aquele segredo. Era um peso que agora tinha nas costas, uma situação inesperada. Aquilo lhe desgostava e fazia sentir um vínculo estranho lhe prender à outra menina, como se tivesse se amarrado com a outra a força.

A Granger nunca havia imaginado que aquilo seria possível: sentir tantas emoções ao mesmo tempo. Porque, por mais que pensasse que ela teria seus motivos e merecerá aquilo, sentia pena de que Pansy fosse uma menina tão fraca a ponto de tentar terminar com a própria vida. E tinha vergonha do que havia feito ao mesmo tempo em que se contentava em haver-lhe feito passar por uma vergonha dessas, expondo seu maior segredo para uma grifinória.

Então culpou-se, colocando-se no lugar da outra, e culpou-se mais quando percebeu que a pessoa que ela mais odiava no mundo lhe tinha dividido seu maior segredo. Aquela sensação horrível de querer borrar a informação da sua mente, sem chances, sem resultados. Queria desaparecer com aquele dia. Queria que Parkinson desaparecesse da sua vida.

E, na escuridão vazia do quarto, ela quis poder escutar Lavander e Parvati falando sobre meninos ou qualquer besteira, para não ter que aguentar sozinha e no silêncio aquele incômodo que crescia no seu peito: a culpabilidade.

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