capítulo quatro

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Capítulo IV

Minutos mais tarde, já na privacidade de seu escritório, Carver respirou fundo várias vezes, tentando livrar suas narinas daquele aroma sensual e dissipar da mente o caos que aquele inesperado encontro lhe causara.
Definitivamente aquela era a mesma essência de almíscar do perfume de Carmen... Carmen, tão parecida com Katie! Os cabelos, os seios e as curvas perfeitas. Jamais outra mulher lhe correspondera com tanta intensidade.
Seria Katie por baixo daquela máscara?
Sacudiu a cabeça com força, na tentativa de ignorar aquela possibilidade e tudo que ela pudesse significar, contudo era impossível tirá-la de vez de sua mente. Katie estava de volta a Sídnei. Certamente teria acesso às festas das altas-rodas sociais. As relações de seu pai e a escola tradicional que freqüentara, abriam-lhe todas as portas. De fato, poderia ter sido ela.
A necessidade que sentia de esclarecer tudo aquilo, levou-o ao telefone sobre a mesa de trabalho. Apertou o botão para interfonar para Robert Freeman.
Robert era um canal óbvio à informação imediata que ele precisava sobre Katie Beaumont. Afinal, ela estava ali para vê-lo. Ele deveria saber algo sobre ela.
— Como foi a reunião? — O sócio foi logo indagando, sem ao menos cumprimentá-lo.
— Como sempre — respondeu Carver brevemente, evitando entrar em detalhes. — Há pouco subi no elevador com a srta. Beaumont. Parece que você tem uma entrevista com ela esta manhã.
— Dentro de cinco minutos. Algum problema?
— Você a conhece pessoalmente?
— Não, ela veio recomendada por Max Fairweather. Quer montar seu próprio negócio e precisa de capital.
— E precisa que nós o financiemos? — perguntou Carver incrédulo. — Você sabe quem é o pai dela?
— Beaumont Villages — mencionou Robert.
— O sujeito é milionário.
— Uh-huh. Pode ser que ele não aprove os negócios da filha.
Como também sua escolha em relação aos homens, pensou Carver desgostoso.
— Pais muito ricos geralmente gostam de impor sua vontade — prosseguiu Robert. — Poderíamos obter algum benefício se a filha for tão inteligente quanto o pai.
— Muito interessante... — Carver recordou que Katie lhe dissera, no elevador, que estava morando sozinha. Sabia que ela trabalhara como babá na Inglaterra alguns anos atrás, porém o que fazia da vida recentemente era um enigma para ele. Sua presença ali poderia significar um ato de rebelião contra o pai. Talvez agora gostasse de contrariá-lo. E isso incluía encontros sexuais com estranhos, tal como Carmen.
Carver sentiu todos os músculos se retesarem à simples lembrança de como o corpo dela respondera ao seu desejo.
— Haveria alguma chance de transferir essa cliente para mim, Robert? — Carver ouviu-se dizendo, sem ao menos parar para analisar se não seria mais prudente evitar qualquer tipo de envolvimento.
Ele ainda achava que Katie Beaumont lhe pertencia. A tentação de voltar a sentir aquela carga de emoções que só ela conseguia despertar era forte demais para ser ignorada. Se tivesse sido Katie atrás da máscara de Carmen, ainda poderia existir algo muito forte entre eles.
Sabia que não eram mais tão jovens, e as circunstâncias agora eram muito diferentes.
— Estou livre o resto da manhã. E devo admitir que estou curioso para ouvir os planos empresariais da srta. Beaumont.
— Humm... Ela deve ser deslumbrante!
— Você é um homem casado, Robert — lembrou-lhe secamente, não se importando com o que o sócio pensaria a respeito daquela insistência, contanto que transferisse Katie para ele.
— Só não esqueça de fazer uma análise imparcial da proposta dela diante da figura indubitavelmente deleitável. Vá em frente, Carver. Avisarei Laura para encaminhar a cliente para você.
— Fico lhe devendo uma, Robert.
— Esteja certo de que cobrarei.
Feito isso, Carver recolocou o fone no gancho, sentindo uma enorme onda de satisfação. Katie Beaumont seria dele pelo menos durante a próxima hora. A única dúvida era como agir para conseguir aquilo que realmente queria?
Katie ficou aliviada por Robert Freeman não estar disponível para atendê-la de imediato. Recostou-se na poltrona de couro, tentando aliviar a tensão, devido ao encontro inesperado com Carver naquele elevador. Sentia-se completamente despreparada. Precisava de algum tempo para redirecionar sua mente ao propósito que a trouxera ali.
O choque da semelhança entre Carver e o rei dos piratas deixara-a em pânico e a fizera lembrar da maneira libertina como se comportara com aquele homem mascarado. Julgava que tal segredo estivesse seguro. E certamente estaria. Tinha que estar. Normalmente, não se portava como uma devassa que saía por aí correndo riscos. Porém, não agiria do mesmo modo agora. Não, estava se afligindo sem motivo. Mesmo que Carver fosse o pirata, provavelmente não sabia que ela fora Carmen.
O melhor a fazer era relaxar e tentar manter os pensamentos sob controle. Desejava ardentemente esquecer o passado e se concentrar apenas no futuro. Só o futuro interessava agora e nem Carver nem o rei dos piratas faziam parte dele.
Estava só.
Entraria na sala de Robert Freeman e provaria que valia a pena investirem no seu projeto.
— Srta. Beaumont?
O coração de Katie disparou à simples chamada da recepcionista. Uma mulher jovem, educada e simpática, obviamente treinada para deixar as pessoas à vontade. A pessoa ideal para recepcionar uma companhia de investimentos, pensou Katie, forçando um sorriso.
Laura, o nome que Carver mencionara, falou com um gesto educado:
— Sinto informar-lhe que o sr. Freeman está muito ocupado com um assunto urgente.
— Tudo bem. Não me importo de esperar — respondeu Katie, avaliando que isso lhe daria mais tempo para controlar seus nervos e então dar o melhor de si.
— Não será necessário, srta. Beaumont — replicou Laura, com um sorriso conciliatório. — Um dos outros sócios está livre para assumir os compromissos do sr. Freeman. Na realidade, você entrou com ele... o sr. Dane.
— Sr. Dane? — Foi tudo que Katie conseguiu articular. Subitamente, sentiu sua língua paralisar, assim como o resto do seu corpo ao simples pensamento de ficar outra vez frente a frente com Carver. E o que era pior, pedindo-lhe dinheiro.
— Ele é muito experiente — Laura assegurou. — Não desperdiçará seu tempo com o sr. Dane, srta. Beaumont.
— Mas não me importo em esperar pelo sr. Freeman. Não há nenhum problema para mim — balbuciou Katie, lutando para não entrar em pânico.
— Não se preocupe. Já está tudo acertado com o sr. Dane.
Deveria argumentar com ela? Não teria qualquer direito de decidir com quem gostaria de tratar aquele assunto?
Anunciando tal decisão, Laura levantara-se por detrás da escrivaninha, para conduzi-la ao escritório de Carver. Katie manteve-se na cadeira. Sua mente fervilhava cheia de indecisão, sentia calafrios percorrerem todo o seu corpo. Era como se naquele momento o futuro e o passado colidissem violentamente.
— Vou acompanhá-la até o escritório do sr. Dane — informou a recepcionista com um sorriso solícito.
Reunindo todas as suas forças, Katie levantou-se da poltrona, agarrando-se à pasta de couro, como se fosse alguma forma de proteção contra as setas do destino.
— Por aqui, senhorita... — Um braço encorajador conduziu-a em direção ao corredor por onde Carver seguira minutos antes.
O que acontecera entre eles pertencia ao passado, Katie argumentou consigo mesma, tentando afastar seus temores. Se desistisse agora, não passaria de uma empregada sem qualquer chance de vencer na vida. Além disso, tratava-se de uma transação comercial. Se Carver levasse para o lado pessoal, poderia simplesmente sair dali com bons motivos para exigir uma entrevista mais objetiva.
— Srta. Beaumont?
Laura estava parada à sua frente, examinando-a com uma expressão interrogativa.
— Desculpe-me. Estou um pouco atordoada pela mudança.
— Não há necessidade, o sr. Dane segue exatamente as mesmas políticas de financiamento que o sr. Freeman — retrucou a mulher com um sorriso compreensivo.
Katie respirou fundo para aliviar a tensão que se formara em seu peito.
— Certo. Podemos ir.
Katie tentou convencer-se de que tanto quanto ela, Carver não desejava aquele encontro.
Fora designado para aquilo porque estava disponível e Robert Freeman, ocupado. O que certamente significava que, a despeito do que houvera entre os dois, ele não deixaria que as questões pessoais interferissem no relacionamento profissional.
Ou as lembranças da intimidade que o pirata compartilhara com Carmen estariam tão vivas em sua mente quanto estavam na dela?
Imediatamente afastou tal pensamento, porém, seu estômago contraiu-se e uma onda de excitação invadiu-lhe o corpo trêmulo.
Naquele exato momento, Laura parou, deu uma leve batida na porta e, em seguida, girou a maçaneta abrindo-a.
— Sr. Dane, a srta. Beaumont — anunciou polidamente.
— Obrigada, Laura. — A voz de Carver dominou o ambiente.
O mesmo timbre do rei dos piratas! Por que não notara isso antes? Porque ficara tão chocada ao encontrá-lo e só sentira o aroma da água-de-colônia quando ele deixara a recepção. Mas agora... Katie podia ouvir as batidas do próprio coração.
Laura afastou-se para que ela entrasse.
Teria que entrar no escritório de Carver, ficar frente a frente com ele, e fingir que tudo o que viveram antes eram águas passadas, inclusive aquela recente e deliciosa fantasia.
Esforçou-se por manter suas pernas sob controle e mover-se sem cambalear. Agradeceu a Laura, e então entrou no escritório de Carver, que secretamente apelidara de câmara de tortura.
— Olá, novamente.
Aquela saudação forçou-a a encará-lo. Percebeu que estava parado de pé ao lado da mesa e notou que a olhava, provavelmente avaliando a reação dela diante daquela mudança inesperada. Então, levantou o queixo desafiando qualquer julgamento que Carver pudesse fazer sobre ela.
— Para ser franca, não esperava reencontrá-lo — declarou ela, abruptamente.
É um prazer enorme revê-la, Katie — disse, em um tom tranqüilo. Seus lábios se curvaram em um sorriso cínico. — Ajudaria se fingíssemos que estamos nos encontrando pela primeira vez?
Impossível! Ele tirara o paletó, e os olhos dela involuntariamente mediam os ombros largos, suscitando recordações antigas e recentes. E seu corpo pulsava ante a visão de cada músculo daquele belo espécime masculino.
— Por que você não se formou em medicina? — disparou Katie, totalmente incapaz de assumir uma postura profissional.
Carver deu de ombros e caminhou alguns passos à frente, encostando-se na mesa em uma pose que sugeria estar pronto para ouvi-la pacientemente.
— Isso foi há muito tempo, Katie. Eu também poderia perguntar o que faz aqui em busca de um financiamento. Por que não fez o curso que pretendia para se tornar professora de jardim-de-infância?
Porque não poderia agüentar permanecer na mesma cidade que ele depois da separação. Nem mesmo no mesmo país!, pensou ela.
— Como você bem disse, isso foi há muito tempo. Sempre o imaginei trabalhando como médico — falou, tentando explicar sua impetuosa intromissão e curiosidade. — De repente, encontrá-lo aqui...
Carver fitou-a por alguns segundos, e uma tristeza profunda o invadiu. Por quanto tempo ela pensara nele? Certamente não o bastante para levá-la à Austrália e descobrir se havia restado algo entre eles. Trabalhara duro todos aqueles anos, tentando provar a si mesmo e ao pai dela que poderia chegar a ser alguém na vida. E ela? Teria lhe dispensado mais do que um simples pensamento?
Podia recordar com nitidez quando partira para a Inglaterra e ela viajara para a Grécia e a Turquia, gastando dinheiro em viagens, distanciando-se cada vez mais dele. Permanecera fora por tanto tempo, que ele desistira de qualquer resposta à carta que lhe escrevera e aventurou-se em um casamento forçado, tudo porque não conseguia esquecê-la.
Bem, ela que pensasse o que quisesse. Ele não lhe contaria quanto sofrera. A atração sexual ainda era forte, mas jamais deixaria que Katie Beaumont entrasse novamente em seu coração. Aquilo era coisa do passado. Qualquer relacionamento íntimo entre eles agora seria baseado única e exclusivamente em sexo, o que definitivamente gostaria que acontecesse.
— Bem, você quer ver minhas credenciais antes de tratar qualquer assunto comigo? — perguntou ele, divertindo-se ao ver que o rosto dela estava tão vermelho quanto o vestido provocante de... Carmen.
— Tenho certeza de que devem ser as melhores possíveis — Katie se apressou em dizer. — Se não fossem, você não estaria nesta posição.
— Mas é difícil para você aceitar — escarneceu ele, imaginando se Katie compartilhava da mesma visão que o pai dela tinha em relação a ele: um sujeito que estava perseguindo a filha de um homem rico para conseguir subir na vida.
— Não. Eu... — As palavras morreram-lhe na garganta.
Os olhos dela chamejaram. Olhos amendoados, esverdeados com pontos dourados, lembrou ele. Olhos grandes, bonitos para se mergulhar... quando ele era muito mais jovem. O rosto dela ainda era o mais fascinante que vira. Os cachos pretos emolduravam-lhe a pele alva com textura de seda, as sobrancelhas eram perfeitamente desenhadas, o nariz delicado e os lábios que beijara tantas vezes irresistivelmente sensuais.
Será que ela se lembrava de como se beijavam?
Agora, era ela quem estava encurralada em um canto, debatendo-se para sair. Levando-se em conta o passado, era uma mudança e tanto! Agora era ela quem precisava de dinheiro, não ele. Uma ardilosa armadilha do destino!
Carver notara que a boca de Katie estava ligeiramente entreaberta, acentuando a sensualidade de seus lábios, e os beijos que dera em Carmen foram intensamente evocados, incitando-lhe o desejo de prová-los novamente.
— Claro que aceito suas credenciais. Espero que esteja preparado para aceitar as minhas.
Sem sombra de dúvida deveriam ser fascinantes, mas Carver não estava nem um pouco interessado nelas.
— Bem, estou aqui para ser convencido de que sua proposta está bem fundamentada e é potencialmente lucrativa — disse ele, sorrindo satisfeito. — Você pode começar...
Com um gesto, ofereceu-lhe a cadeira em frente à sua. Sem esperar que ela se movesse, endireitou-se e contornou a mesa sentando-se, um sinal evidente de que a transação comercial estava prestes a começar.
Estava no controle e pretendia mantê-lo.
Até mesmo se a beijasse.
E era exatamente o que pretendia fazer antes que Katie deixasse o escritório.

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