CAPÍTULO SÉTIMO

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Calmaria

Finalmente amanheceu e a tempestade acabou, Sr. Passion começara a abrir a porta da frente. Ele terminou de tirar o trinco e olhou para nós, sonolentos, mas animados. A luz refletia no chão liso ao abrir da porta. Está tudo muito claro, parece até mais colorido. Prigritia saiu por último, devagar e cuidando a cada passo, como se estivesse em um lugar novo. Os sois já estão aparecendo, feixes de luz atrás das montanhas, bem ao fundo, quase escondido no céu; Todo o gramado dourado em volta da casa devastado; Pedaços de árvores, pedras e até tecidos jogados por toda parte; A terra não está mais plana como antes, o relevo está bagunçado, com buracos e pequenos montes; A plantação dos Passion não existe mais, nem sinal das frutas azuis ou mesmo das penas; Não há borboletas no céu, nem pássaros, nenhum animal; Ao longe, a floresta por onde viemos, quase não existe mais; Uma espécie de pó compunha o ar, agora fresco; E por entre a terra, haviam raízes, escuras e com espinhos, Sra. Passion parecia ter medo delas, se distanciando com as mãos perto do queixo;

Sr. Passion andou em volta da casa, recolhendo os papiros que nós deixamos. Estavam mergulhados na terra. Fui pelo lado contrário, no que eu havia feito, cavei com a mão até chegar no papel.

Ele estava... rasgado.

Diferente dos outros, o meu estava inciso, cortando o símbolo no meio que parece com um sol. Sr. Passion olhou levemente assustado para o meu papiro, depois pôs a mãos no meu ombro e disse algo, com um sorriso. Deveria ser um "Não se preocupe".

Depois de recolher todos e coloca-los dentro da casa, Sr. Passion foi ao lado de onde era a plantação e nos chamou para ir ali também. Ele apontava para o horizonte, tentando nos mostrar algo, depois estendia a mão para nós, nos pedindo para esperar. Eu via nada, apenas o céu limpo e azul. Parados, esperando por algo, ficamos ali, meio acanhados, contrariando o ânimo dos Passion.

Um chiado estranho... algo no horizonte, crescendo... não, vindo na nossa direção. Som de... água.

Era água.

Um pequeno mar de água veio em nossa direção, molhando nossos pés e levando os destroços. Era azul, mas já estava um pouco suja, meio marrom. Estendi minha mão, me abaixando e tocando na água. Fiz uma concha com a mão, peguei um pouco da água e levei a boca, lentamente, tomei um pouco.

Salgada.

Cuspi imediatamente, estava salgada, horrível. Sr. Passion olhou, com um sorriso malicioso – quase rindo de mim. A água trazia algas também, eram bem verdes e brilhantes, pareciam suculentas. Talvez isso tudo seja algo corriqueiro para eles, essa tempestade, a água e a comida que ela traz, é assim que sobrevivem aqui.

Sr. Passion pegou uma pequena vasilha dentro da casa e encheu com a água salgada, já sumindo. Tirou uma das penas de sua cintura – não sobraram muitas – e tocou a ponta dentro da vasilha, deixando cair um pouco de tinta na água. Ela mudou de cor, ficou mais clara, quase branca. Quando o mar que nos envolveu já havia abaixado e só sobrara nos buracos – como poças gigantes – Sr. Passion envergou um pouco a vasilha sob as raízes dentro da terra, derramando essa água branca nelas. Era como um veneno, fez o verde escuro se tornar cinza imediatamente e secou a raiz.

A água...

Seria aquela água que caiu sob os selvagens que nos atacaram na saída da Domum igual a que os Passion usam?

O resto do dia se resumiu ao Sr. Passion enchendo barris com água que sobrou nos buracos e eu tentando ajudar, depois todos comemos. Não sobrara tanta comida, percebi nesse momento que estava chegando a hora de partimos, os Passion são muito preparados e cativantes, mas não podem nos hospedar por muito tempo, ainda mais eles perdendo plantações dessa forma. Mas antes, precisávamos voltar ao objetivo, achar outra domum.

ASINUS PRIMAOnde histórias criam vida. Descubra agora