OLIVIA
Num movimento rápido, estou em frente ao espelho. Encaro meu próprio reflexo dos pés à cabeça, perplexa. O vestido preto coube como luvas ao redor do meu corpo, como se tivesse sido feito sob medida para mim. Me viro de um lado para o outro lentamente, observando cada detalhe: as laterais, a costura, a fenda, o decote, talvez procurando algum defeito, mas não o encontro. É muito, muito, muito bonito.
— Posso saber onde arrumou este vestido? — consigo perguntar após alguns instantes.
Meg aparece atrás de mim logo em seguida, maquiada e pronta em seu vestido azul marinho e sandálias brancas de salto alto.
Ela deposita gentilmente as mãos em meus braços e encosta cabeça em meu ombro direito, me olhando nos olhos pelo reflexo.
— Trouxe de Nova Iorque.
Levanto às sobrancelhas, surpresa. Meg voltou faz quase um ano.
— Como assim? Deixou guardado esse tempo todo? Como sabia que ainda serviria para mim?
Ela balança a cabeça negativamente. Não tinha mesmo como saber. Com as mudanças que meu corpo no último ano, eu duvidava que ele voltaria ser ao que era antes.
— Sabia que precisaria deste vestido uma hora ou outra quando o vi na vitrine. — ela responde simplesmente. — Imaginei você nele.
— Então ficou esperando o momento certo?
Ela pisca para mim e abre um sorriso.
— Touché!
Sorrio de volta, observando meu reflexo mais um vez, tentando me imaginar daqui a poucas horas naquele salão, e meu sorriso se desfaz rapidamente enquanto olho para Meg, porque uma lembrança me atinge de repente. Engulo em seco, sentindo um nó se formar dolorosamente na garganta. Um aperto não bem-vindo se instala em meu peito e respiro fundo. Aquele mesmo aperto que jurei me livrar esta noite.
— Eles estarão lá...
Minha amiga me olha mais atentamente, depois me vira, fazendo-me ficar frente a frente com ela. Ela também respira fundo antes de começar a falar, fazendo-me olhar através de suas íris pretas.
— Eu sei que você tentou evitar isso o máximo que pôde, mas sabíamos que essa hora ia chegar.
Abaixo a cabeça, checando as minhas unhas recém-feitas, numa tentativa ridícula de esconder as lágrimas que se formam. Acho que não estou emocionalmente preparada para nada, por mais que eu tenha tentado arduamente. Engulo o choro e limpo a garganta para evitar que minha voz falhe. Não quero parecer fraca ou vulnerável. Não agora.
— Fico feliz que você vai estar comigo. — digo, levantando a cabeça para encara-la.
Seu olhar é preocupado. Meu queixo treme, de medo e gratidão por tê-la aqui, mas ao mesmo tempo, ela me transmite a esperança de que tudo ficará bem. Sua mão vem de encontro ao meu rosto maquiado, e com cuidado para não borrar meu delineador fino, ela limpa o canto dos meus olhos com um lenço. Um puro gesto de carinho.
— Sempre, para onde você for.
Seus braços fortes me afagam por um instante e não choro mais. Tenho que me manter forte para hoje à noite, não importa o que venha a acontecer.
— Hora de ir. — anuncia ela e estende a mão para que eu pegue. Aperto-a. — Pronta?
Seguro o riso, e acabo sorrindo.
— Tenho que estar.
Quando soltamos nossas mãos, pego minha bolsa em cima da cama e dou uma última olhada no penteado que consegui improvisar usando um modelador de cachos, alguns grampos pretos e um spray fixador. Minha amiga sai andando à minha frente e a vejo se despedir de minha mãe com um leve aceno e um beijo no ar.
No meu caminho até a porta, meus olhos param no colar que joguei com raiva no chão a dias atrás, exatamente no mesmo lugar que caiu. Olho em volta, em dúvida, pensando se devo ou não fazê-lo. Mas me recordo que Meg está me esperando lá embaixo, e não quero fazê-la esperar por muito tempo. muito menos me atrasar. No entanto, caminho rápido até o canto do quarto, seguro a beirada do vestido com uma mão só e me abaixo diante dele. Ao tê-lo em minhas mãos, uma enorme emoção enche meu coração, e o aperto em meus dedos até o material gelado quase machucar meus dedos, já duvidando se terei essa coragem.
Pensando bem, por quê não? Me foi preciso grande coragem para chegar até aqui, afinal. Se eu não tivesse coragem, já teria ido embora a muito tempo. De tantas coisas eu teria desistido...
Rapidamente prendo-o na parte de trás do pescoço, fazendo com que lembranças dolorosas me venham a mente, mas ajeito minha postura e levanto o nariz, visualizando o conjunto no espelho. Se vou usar esse vestido, tenho que saber usá-lo direito. Há uma fenda até um pouco acima do joelho, deixando minha perna esquerda a mostra, destacando a sandália prateada de salto alto. As alças finas do vestido são delicadas, formando um decote redondo comportado, sem chamar muita atenção. A cintura marcada é o que mais gostei neste vestido e há muito tecido na parte debaixo, não deixando-me desconfortável ao caminhar. Nunca me senti tão bonita antes, nem mesmo na formatura da faculdade. O colar de diamantes combinou perfeitamente com todo o conjunto, incluindo os brincos pequenos que ganhei de meu pai ainda adolescente.
Sorrio com a imagem diante de mim. Ninguém sabe que tenho esse colar, ninguém sabe o que ele significa para mim, mas vai atingir exatamente quem eu quero.
No meu caminho até a saída, paro na porta do quarto ao lado para me despedir. A luz está apagada e a cortina entreaberta, deixando somente a noite estrelada iluminar o quarto pintado em tons pastéis, deixando o ambiente aconchegante e silencioso. Minha mãe está em pé, de costas para a porta, em seu vestido florido e o cabelo num coque recém-feito, balançando de um lado para outro lentamente, e se eu aguçar bem minha audição, consigo ouvir sua voz em uma melodia vagarosa, cantarolando a mesma música que cantava para mim quando criança. Sorrio em pensamento. Quando ela nota minha presença, abre um pequeno sorriso, seguido de um movimento leve com a cabeça em direção a porta. Consigo ler seus lábios dizendo que vão ficar bem.
Sorrio de verdade desta vez.
— Não vou demorar muito. — digo sem emitir som e caminho devagar até a porta da sala para que o atrito do salto não faça barulho.
Assisto àquela mesma cena antes de sair, observando de longe, e me sinto em paz, pelo menos um pouco. Estou feliz que ela também esteja aqui.
Quando fecho a porta atrás de mim, respiro fundo algumas vezes. Minhas pernas tremem um pouco enquanto caminho até o carro, sabendo o que me espera a seguir. Sinto um incômodo nos nós dos dedos e viro a palma de minha mão para cima, analisando alguns vergões, provavelmente causados pelo colar quando o apanhei do chão. Toco ele em meu pescoço delicadamente, contando mentalmente até dez e ignorando o olhar de Meg enquanto me acalmo aos poucos, procurando palavras positivas em minha mente. Quando olho em sua direção, ela me lança um olhar acolhedor e em seguida, liga o carro para partirmos. Percebo quando ela mira o olhar em meu pescoço por um instante, mas não fala nada. Não precisa.
Pode ser que essa seja uma noite difícil e intensa, mas sei que depois de tudo, tenho forças para encarar qualquer coisa. Não por mim, mas por nós. Olho para o quarto andar pela última vez antes de virarmos a rua.
Somente por nós.
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While We Wait
RomanceEu nunca gostei de clichês, além do fato de serem mal elaborados, ainda havia a questão de que o mocinho nem sempre de fato é um mocinho, porém, eu havia de concordar que, enquanto todos os meus planos vinham por água a baixo e desaceleravam ao mes...