04. entre posters e discos de vinil.

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Quando era ainda um pré adolescente, eu e minha família tinhamos costume de subir no maior vale da cidade, e sentar perto do canto do relevo, com um rádio velho na grama e uma câmera fotográfica na mão. Às vezes a gente se deitava e apreciava as luzes dos variados prédios se chocando contra as estrelas do manto escuro, somente apreciando. E às vezes eu enxergava toda aquela vastidão de lares, e examinava outra metade do mundo. Era divertido.

A minha mãe costumava levar torta de limão e suco de maracujá numa pequena cesta, e naquela época eu odiava ambas as frutas. Na verdade, eu ainda odeio. Sempre preferi manga ou uva, e suco de laranja era o meu favorito, apesar de não tomar ele faz anos. Porque mesmo que seja doloroso pra mim ficar sem progenitores, e sentir uma raiva constante deles, beber suco de maracujá e comer torta de limão eram as únicas formas de me sentir ligado a eles. Fingindo ser um amante eterno das duas coisas, quando na verdade só sentia ânsia e enjoo. Mas mantive segredo, porque era vergonhoso.

Mostrar as suas fraquezas aos outros é vergonhoso. Eu sempre aprendi isso.

Na primeira vez que me descobri gay foi aos catorze anos. Os meus amigos ficavam bebendo e alguns até fumando com uma idade tão pequena ainda, porém a gente se passava por galera santa e inteligente na escola. Outros andavam com facas na sola do sapato, já outros consumiam drogas de uma maneira tão promíscua quanto o resto. E eu? Eu sempre fora o rapaz do canto, esquisito que preferia andar de bicicleta e sonhar com o céu ao invés de poluir o organismo e relaxar. O típico bunda seca.

Mas em meio a uma explosão de inseguranças, um garoto do outro canto enxergou algo em mim. Não humilhação ou pena. Compreensão. É, isso aí. Ao invés de se enturmar com os seus amigos e zoar qualquer coisa que se movesse, ele chegou perto de mim com os seus cabelos vermelhos coloridos e se sentou a meu lado. Me oferecendo um pacote de leite e biscoito, e um dos sorrisos mais bonitos que eu já tivera presenciado em toda a minha vida.

"— Uhm... é natural ou você pintou? — perguntei me encolhendo mais contra a árvore, examinando de relance os fios ruivos balançarem em conjunto do vento.

O garoto arqueou uma sobrancelha em confusão, e me encolhi denovo com medo de ele me achar intrometido e me zoar também.

— Ah, você está falando dos meus cabelos?! —gargalhou. — São naturais sim, mas eu não gosto muito. Prefiro o simples, sabe? Cabelo preto, castanho ou loiro... Como o seu! — sorriu novamente.

— Mas ele é bonitinho... — senti o arder das minhas bochechas se alastrando por todo o resto do meu corpo, fazendo com que a fervência se espalhasse em qualquer pedaço de pele minha. E então cobri meus dedos com o sweater grosso que usava, pela insegurança que tinha deles.

O ruivinho reparou, e prontamente segurou nas minhas mãos rechonchudas examinando os anéis simples que colocava ali.

— Porque está as escondendo?

Fingi uma falsa tosse, puxandoo meu pulso dos seus dedos longos e veiudos demais para a sua idade, aproveitando para colocar o canudinho do leite na minha boca, e engolir.

O garoto que eu passava a denominar na minha cabeça como sem-nome, me encarava atentamente, e parecia satisfeito ao notar a maneira como as minhas unhas retiravam os biscoitos de forma desajeitada. Não queria que nenhum pedaço de pele a mais fossemostrado. Mas ele parecia se sentir bem ao saber que eu estava comendo.

— Não mate tartarugas, Jeon. — notando o meu olhar confuso, ele apontou pro canudo dentro dos meus lábios cheios. — Não use isso, faz com que tartarugas morram.

— Porque me deu então? — perguntei desconfiado. Ou ele era pirado ou tinha veneno ali.

Deu de ombros.

o sol e os seus taehyung's. [taekook]Onde histórias criam vida. Descubra agora