— Para onde foram depois do bar? — Anthony questionou e eu suspirei relembrando.— O tempo começou a mudar drasticamente. Nuvens escuras e pesadas tomaram todo o céu, o vento se tornou gélido e a necessidade de nos abrigarmos da tempestade que começara a cair se tornou cada vez maior. O forasteiro parou em um lugar na beira da estrada, onde o letreiro fluorescente com defeito estava escrito "desejo".
— Dois quartos, por favor! — Ele pediu e a atendente mascando chiclete com a boca aberta olhou para ele e depois para mim, em completo choque.
— Só temos um quarto. — Avisou olhando novamente para uma revista sobre o balcão. — E são setenta e cinco dólares a noite. — Avisou passando a página com força, enquanto estourava uma bolinha de chiclete na boca.
— Tudo bem. — Ele colocou o dinheiro amassado sobre o balcão, ela pegou as notas e desdobrou uma por uma, depois virou para trás onde o painel de chaves havia apenas uma brilhante, a qual ela o entregou.
— Quarto meia, meia, meia. — Ela comentou rindo para mim de forma estranha. O forasteiro revirou os olhos com a brincadeira dela e me mostrou na chave o número sessenta.
— Vamos! — Ele chamou e eu segui incerta atrás dele. Logo achamos o quarto e ele abriu a porta revelando um lugar estranho, com paredes vermelhas e apenas uma cama redonda no meio. Paralisei na porta e ele entrou procurando por algo na pequena geladeira. Depois me olhou ao abrir uma latinha de cerveja. — O que foi?
— Não vou dormir aqui com você.
— Por que não? Não ouviu dizer que esse é o único quarto livre?— Questionou e eu balancei a cabeça como se fosse óbvio. — Não confia em mim?
— Sinto que não deveria confiar.
— Olha... — Disse largando a cerveja no móvel pequeno ao lado da cama. — Eu sou Harley Baker! — Me estendeu a mão e eu o olhei intrigada.
— Por que está me contando seu nome agora?
— Para mostrar que eu confio em você. — Respondeu e abaixou a mão quando notou que eu não pegaria nela. — Não se preocupe, ficaremos aqui só até a chuva passar. Depois prosseguimos viagem. Além do mais, eu durmo no sofá! — Apontou para um sofá marrom próximo da janela por onde a luz do letreiro piscante entrava. — Eu jamais te faria mal. Acredita em mim?
— Você iria bater naquele homem com uma garrafa quebrada. — Rebati e ele suspirou sentando no sofá e tomando um gole da cerveja que havia pegado.
— Eu não suporto tipos como ele. — Respondeu entredentes.
— Você teria o matado se continuasse.
— Mas eu não continuei. — Enfatizou e me olhou parecendo sincero. — Desculpa se eu te assustei! Não era minha intenção. Porém aqueles homens só entendem as coisas na base da porrada. Eu só queria te defender, nada mais. Você é muito inocente para entender o que aconteceu lá, entretanto confia em mim, eu só fiz o que tinha que ser feito. Agora vamos descansar porque amanhã cedo se não estiver chovendo vamos pegar estrada.
— Tudo bem. E não tenho muita escolha mesmo. — Respondi sentando na cama e ela pulou comigo. Olhei confusa ao redor e ouvi uma risada baixa.
— A cama é de molas. — Ele explicou e eu o encarei interrogativa. — E eu jamais vou te explicar o porquê disso. Ainda mais com você vestida assim.
— O que tem minha roupa?
— Eu já te disse, você precisa vestir roupas normais. — Deu de ombros e eu segurei meu crucifixo pendendo no meu pescoço. — Temos que dar um jeito nisso. — Apontou para o meu hábito. — Não é mais uma noviça, lembra? — Questionou deitando no sofá.
— Sim. — Respondi me levantando. — Mas ainda sou uma serva do céu. — Falei tirando a lata de cerveja da mão dele e jogando no lixo. Ele ameaçou reclamar, mas desistiu quando o encarei. — Temos que orar antes de dormir.
— Está brincando, não é? — Questionou com um sorriso enorme e eu permaneci séria. — Ok, não está brincando.
— Faça o que eu fizer! — Falei me ajoelhando no tapete e ele arqueou a sobrancelha. O encarei do mesmo modo e ele respirou fundo e levantou se ajoelhando em seguida ao meu lado. — Agora vamos fechar os olhos e concentrar nossas mentes na oração que vem do coração. Vamos agradecer por todos os livramentos do dia e por termos um lugar seguro da chuva para passar à noite. — Expliquei orando em voz alta em seguida. No final fiz o nome do pai e quando abri os olhos notei Harley sorrindo. — Qual a graça?
— Um pecador rezando ao lado de um anjo. Essa é a graça. — Respondeu e eu levantei do tapete o olhando sem entender. Harley também levantou e ameaçou pegar outra cerveja, eu lancei um olhar desencorajador e ele voltou a sorrir. — Tudo bem. Vamos dormir! — Disse deitando novamente no sofá e eu deitei na cama. Ao olhar para o teto notei um enorme espelho. Que quarto mais estranho!
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O Caso Harley
Short StoryAngeline Morgan foi entregue para o convento como pagamento de uma promessa feita pela sua mãe. Obrigada a ficar enclausurada dentro dos muros altos, vivendo uma disciplina rígida, cada vez mais ela deseja conhecer o mundo e abandonar a vida de reti...