Capítulo II

5.7K 681 42
                                    

— Mas, madre, Deus não manda socorrer os necessitados? Este homem está precisando de cuidados. — Argumentei ciente que isso a deixaria mais irritada. Entretanto eu precisava interceder por ele.

— Não podemos colocar um homem desconhecido nas nossas dependências sagradas. Não sabemos o que levou a acontecer isso com ele. Pode ser um mandado pelo diabo para nos desvirtuar. Ou ser um fora da lei.

— Não podemos negar estender a mão para ninguém, irmã. — Ouvimos a voz do padre Gregory atrás dela e meu coração se embalou na esperança.

— Sua bênção, padre! — Pedi e ele assentiu ajoelhando ao meu lado e tocando no pescoço do homem.

— Está muito fraco, precisa de cuidados urgentemente, senão morrerá. — Constatou e a madre pareceu desconfortável.

— Mas ele pode ser um criminoso. Talvez ele mereça morrer assim. — Insistiu​ e o padre a olhou serenamente.

— Somente Deus pode julgar como e quando iremos morrer, irmã. Achei que isso já fosse algo claro dentro de suas concepções. — Repreendeu e ela abaixou a cabeça sem jeito. — Agora me ajudem a acomodá-lo lá dentro! — Todas nos unimos e ajudamos a tranpostrar o homem pelo pátio, chamando a atenção das freiras que estavam por ali.

— Colocamos ele na cama de um quarto próximo da despensa. — Expliquei e Anthony entrelaçou as mãos me observando. — O padre pediu minha ajuda e com uma gaze e água morna eu limpei o sangue rubro que formava uma máscara em seu rosto. Aos poucos foi se revelando a beleza dele. Limpei também o sangue em sua orelha e pescoço e ele mexeu, provavelmente com dor pelos pontos que o padre estava dando em suas feridas abertas nas mãos.

— Ele está tremendo muito. Provavelmente tomou toda a chuva da noite passada. Angeline, vá buscar folhas de salgueiro-branco na horta e ferva com água! Esse chá irá baixar a febre dele e diminuir suas dores!

— Sim, senhor. — Segui rapidamente para a horta e colhi as ervas. De longe Marry Ann me observou interrogativa enquanto colhia legumes. Voltei rapidamente para o cozinha e após lavar as folhas deixei ferver por alguns minutos. Depois de coar, segui com a xícara para o quarto onde o homem estava. Passei pela madre superior que me olhou de canto de olho. — Aqui está!

— Tente fazê-lo beber, mas com cuidado para que não engasgue. — Advertiu e eu sentei próximo da cabeça dele. Quando toquei no rosto dele, seus olhos claros me fitaram confusos. Ele pareceu um pouco assustado e tentou levantar.

— Calma! Eu sou a Angeline! Não vou te machucar. — Expliquei e ele continuou hesitante. — Você vai ficar bem. Fiz um chá para você. — Mostrei a xícara e ele a encarou. — Beba um pouco!

— Beba, filho! Se sentirá melhor! — O padre incentivou e o homem voltou a me fitar. Abriu lentamente os lábios e eu soprei o líquido para que não se queimasse. Derramei cuidadosamente o chá em sua boca e ele fez uma careta. — O gosto é ruim, mas é para você ficar bom. — O padre disse sorrindo. O forasteiro concordou e tomou todo o chá, depois voltou a fechar os olhos. O cobrimos com um cobertor e eu me lavantei. — Assim que ele estiver recuperado iremos transferir ele para a cidade.

— Mas não podemos cuidar dele aqui. — A madre disse e o padre a analisou em silêncio.

— Compaixão, irmã. Deus nos ensina a ter compaixão pelo próximo.

— Nós não sabemos quem esse próximo é. E nem o motivo para estar tão ferido. — Insistiu. — Pode ser perigoso abrigá-lo aqui.

— Ele não parece perigoso. — Me intrometi na conversa e ela me lançou um olhar fulminante.

— O diabo não possui a cara de monstro e sim de um anjo. — Ela rebateu e eu fiquei quieta.

— Não se preocupe, irmã! Eu virei para vê-lo todos os dias. — O padre tentou tranquilazá-la, mas pareceu em vão. —Vamos deixá-lo descansar agora. — Assentimos e ele saiu na frente. Quando eu estava passando pela porta, a madre me segurou pelo braço.

— Você fica e cuida dele! — Ordenou em voz baixa. — Foi sua ideia trazê-lo, agora fique de babá. — Ordenou saindo logo em seguida. Respirei fundo e voltei para o pé da cama, esticando melhor o cobertor.

— É melhor você ouvir a mulher. — O forasteiro disse fraco, me assustando. Levei a mão ao coração e o encarei.

— O que está dizendo?

— Sobre ela não me querer aqui por me achar perigoso. Você não devia confiar em quem não conhece.

— A confiança é a base da fé. — Rebati e ele ficou sério. — O mundo precisa disso.

— Cuidado para que sua bondade não destrua seu coração! — Ele murmurou antes de adormecer novamente me deixando completamente confusa.

O Caso HarleyOnde histórias criam vida. Descubra agora