Capítulo Um

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Sempre me senti uma estranha ao estar com os outros.

Minha mãe, assim como todos os outros que moram no pequeno condomínio escondido sob o cemitério da cidade de Monte Louiur, são vampiros sangue puro. Anos atrás o nosso Mestre Cristopher Talus, descobriu esse lugar e com ajuda de alguns outros vampiros construíram a pequena vila para proteger todos da nossa raça dos caçadores de criaturas diabólicas, como ele costuma dizer.

Muitos dos fundadores já não estavam mais morando na nossa comunidade quando chegamos. Haviam histórias sobre um julgamento que tirava o poder mágico dos vampiros, e, sem magia, nenhum deles conseguiria se manter jovem. Como eram todos vampiros antigos, viraram pó por causa da idade. Nunca disseram o motivo para o julgamento ter acontecido, mas ao final apenas o Mestre Talus ficou para manter a promessa de nos proteger.

Diferente da minha mãe e, por mais surpreendente que possa parecer, meu pai, é humano. Por isso eu me sento estranha. Como metade do meu sangue é humano, os outros sangues puros me consideram uma aberração. Até onde sabiam, vampiros não podiam ter filhos, então quando minha mãe chegou carregando um bebê alegando que era dela os vampiros mais velhos foram à loucura dizendo que era mentira.

Até hoje não sabem como isso foi possível e acho que também nem se importam mais, afinal, acostumaram-se com minha presença andando de um lado para o outro no condomínio. E de certa forma, também me acostumei a ser ignorada por quem ainda acreditava que eu não deveria nem existir.

Certas coisas você deixa para lá para evitar estresse. Foi o que a minha mãe me disse uma vez, quando perguntei o motivo de alguns vampiros, apesar de nos ajudarem nos momentos em que precisávamos, me olhavam de forma estranha. Eu devia ter dez anos quando tivemos essa conversa. Hoje tenho dezesseis e não ligo para mais nada. As coisas são o que são.

A rotina dentro da comunidade seguia de forma rigorosa. E eu percebera que era algo involuntário de todos os moradores.

Pela manhã, o lugar parecia deserto. Se alguém entrasse ali, acharia estranho um lugar tão arrumado estar vazio. Todas as casas ficavam trancadas, e nós, dentro delas. Tudo o que era necessário para nossa sobrevivência tínhamos ali dentro. A praça que fica no centro de tudo, contém uma grande fonte onde uma estátua do Mestre Talus decora no topo. A água que jorra da base da estátua é a única coisa com vida pela manhã. A Academia para Sangue Novos, o banco de sangue e a biblioteca que circulam a fonte, também ficam fechadas. Poucos se atrevem a sair quando o sol ainda está brilhando.

Ao lado direito da praça, uma estradinha de terra batida leva em direção a mansão do Mestre Talus e as outras casas.

A casa dele era a maior de todo o condomínio. Tem três andares, com topos que mais pareciam torres de um castelo, todo coberto de pedaços de mármore escuro. A única porta de acesso era igualmente grande e era feita de madeira escura. Na frente, as iniciais dele estavam gravadas em dourado brilhante. Um tanto chamativo para quem gostava de dizer que descrição era a chave de tudo.

O resto das moradias são simples. Grandes blocos quadrados de concreto, com telhados de tijolos vermelhos e sem janelas. A única coisa que as diferencia são os jardins. Alguns vampiros não se importam muito com jardinagem enquanto outros, passam horas limpando cada planta e arrancando as ervas daninhas.

Quando o sol começa a se pôr, é a hora que todos acordam e saem das suas casas. Sem a luz forte, as ruas ficam movimentadas até o dia seguinte um pouco antes do nascer do sol. Os vampiros Sangue Novos, devem ir para as aulas, aprender sobre história, criação da raça, a forma correta de tomar sangue e sobre como usar os poderes. Muitos dos vampiros Sangue Novos haviam sido transformados recentemente. Todos eram adultos com vinte e poucos anos, nunca mais do que isso. Eu era a única na turma que ainda era menor de idade e continuava a envelhecer.

O Livro de AurumWhere stories live. Discover now