"Agradeça por todos que passaram por sua vida para engrandecer suas experiências."
É realmente impressionante nossa facilidade de adaptação. Os seres vivos em geral se adaptam muito rapidamente às mudanças, ganhos e perdas. Hoje faz 6 semanas do fatídico dia em que Tim se fora. Dia após dia, pensava constantemente que aquilo não podia ter sido verdade. Que fazia parte de uma piada sem graça ou de um pesadelo que iria terminar. Todo o som de moto frente ao meu apartamento levavam a lembrar de Tim e pensar que poderia ser ele vindo fazer uma visita. E quanto mais o tempo passa, menos essas sensações aparecem. Mais me convenço de que é tudo verdade e de que a vida simplesmente continua. Tim não deixou muito legado mas sua determinação em manter-se feliz foi o maior exemplo e ensinamento que poderia deixar.
Ouço uma chave rodar na fechadura da porta de meu apartamento. Não me espanto pois sei que Lu está para chegar. Sim, Lu tem a chave da porta de minha casa. Do dia em que nos conhecemos pra cá, Lu tem sido uma presença forte em minha vida. Não só por minha fragilidade com a perda de meu amigo, mas também com o ensinamento que recebi de Homero no dia em que nos viu juntos.
Estou me permitindo experimentar melhor a vida. Arriscar mais e relutar menos. Resgatar minha leveza de criança e minha alegria interior. Os últimos meses foram intensos. Sair da inércia, da mesmice e da zona de conforto mexeu não só comigo mas com todos a minha volta. Não só eu sou outra pessoa mas Homero e Lu também tem me acompanhado nessa trajetória.
A porta abre e Lu entra com algumas sacolas de supermercado, auxiliada pelo menino Léo que está sempre por perto desde que Lu passou a frequentar minha casa.
— Oi Amor, olha quem convidei para almoçar com a gente.
— O pequeno Léo. Claro! Sempre muito bem-vindo.
— Léo confessou que gosta muito de vir aqui.
— Entre Léo, pode deixar que pego suas sacolas.
Conheço Léo de longa data. Não tão longa por ser uma criança de apenas 8 anos, mas quando estou com Léo parece que já nos conhecemos há muito tempo. Nos víamos pouco mas agora Léo frequenta mais minha casa. Este menino me ajuda no resgate de minha criança interior. Sempre que me vejo "pesado" demais, penso que se fosse Léo em meu lugar, seria diferente. E assim, consigo achar um equilíbrio.
— Sabe tio, eu gosto muito de cozinhar. - diz Léo, olhando as compras sobre o balcão.
— Ótimo Léo. É uma boa hora para fazermos isso juntos.
E assim, sob o olhar cuidadoso de Lu, estávamos os dois, com a missão de fazer um delicioso almoço. Situações como essa faz o tempo não ser mais importante. Sem pressa no preparo, sem pensar demais. Só deixar fluir, sem fazer muitas medições, usando os ingredientes na medida que se acha ser boa. Ficamos nessa interação, entre panelas, farinha, ovos, molhos e temperos. Se adicionar imagens em câmera lenta e uma música ao fundo , saberás exatamente como eu estava me sentindo naquele momento.
Alguém bate a porta e nos olhamos, uns para os outros, como se perguntando, quem poderia ser. Lu, que era a mais livre dos três, vai a porta e recebe o velho Homero, trazendo em suas mãos, uma garrafa de vinho e claro, uma flor para Lu.
Como havia falado, não só a mim essa tempestade trouxe mudanças, mas aos que me rodeavam. Homero resgatou sua vida social. Hoje conversamos e interagimos muito. Já podemos dizer que somos amigos. Além disso, seus cadernos de anotações, que descobri em seu apartamento, antes escondidos, hoje nos tem trazido grandes ensinamentos. Hora ou outra, nos juntamos para ler e discutir suas anotações. São todas muito inspiradoras e por isso podemos ficar horas conversando sobre uma única frase.
Tinha medo de transformar-me no velho Homero mas o próprio me ajudou a ver que deveria mudar minhas ações e pensamentos para que isso não acontecesse. Por sorte, Homero também mudou o jogo aos 44 minutos do segundo tempo, e isso está fazendo muito bem a todos nós. Se mesmo o escultor de mármore pode mudar, por quê eu não poderia também? O novo Homero, se assim posso dizer, está se tornando um bom exemplo de como envelhecer. Nossa "casca" envelhece, mas mesmo assim devemos cuidar dela o melhor que pudermos, e nossa mente, essa pode ser eternamente jovem, se permitirmos e formos vigilantes para isso. Até mesmo Léo não tem mais medo de Homero como antes, mas ainda não trocam muitas palavras.
— Pensei que pudessem estar precisando de uma garrafa de vinho para seu delicioso almoço. O cheiro está de arrasar.
— Claro Homero, será um prazer almoçarmos todos juntos e abrindo esta garrafa ficará melhor ainda. - diz Lu que recebe Homero pegando de suas mãos, a garrafa e a flor.
Homero respira fundo, como se tivesse dado um passo importante na sua nova busca. Para ele, que ficou muito tempo isolando-se do convívio social, encarar Lu e subir as escadas para convidar-se para o almoço era um movimento muito diferente.
Léo, entretido em amassar a massa do macarrão, vez ou outra, dava uma olhada para nós, adultos, buscando entender o que se passava por ali. Para Léo as coisas eram mais práticas. Não havia o drama que colocamos nas situações. E era essa essência de criança que ajudava a equilibrar o ambiente.
O grupo estava formado. E que grupo bom! Todos com seus papéis bem definidos. Todos crescendo juntos e se cooperando com o objetivo único de viver bem.
Lu, a mais nova integrante deste grupo, tinha o importante papel de trazer a energia feminina para nossas vidas. Uma energia forte, transformadora, com vontade de viver e de fazer o bem. Ela conquista meu coração cada dia mais e sinto que isso só pode ter acontecido porque passei a me permitir.
Olho para a porta de minha geladeira e lá, ao lado de uma foto que guardei de Tim, está o recorte que Homero fez questão de me dar depois que relatei ter lido esta frase em um de meus sonhos:
"Faça por você o que farias ao seu melhor amigo. Seja seu melhor amigo permitindo-o viver de forma leve, prazerosa e construtiva".
Assim, penso sorrindo: Obrigado, amigos!
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Tempestade do eu
General Fiction"Reflita sobre seu caminho e redesenhe se assim for preciso" O personagem desta história sente que é hora de dar um basta no 'deixar rolar' de sua vida e resolve encarar a tempestade de frente para se reencontrar, resgatando sua criança interior e...