Contos de Rouxinol

Calafrios de uma histerectomia total

Pedi que nos contasse sobre aquele dia. Disse-nos que se lembrava de tudo, como se tivesse sido ontem... 

Assim que entrou na menopausa, percebeu que o seu fluxo menstrual havia aumentado, parecia mesmo que estava com hemorragia todas as vezes que menstruava; sentia mal estar pelo menos uma vez ao mês.

Quando não aguentava mais, foi aí que decidiu procurar ajuda médica. Passou por vários ginecologistas. Uma ginecologista lhe receitou um medicamento que julgou até mesmo ter piorado sua situação, nos contava indignada. 

Ao longo de alguns anos, curtiu com angústia a condição de ter útero. Por alto, foi diagnosticada com caso de mioma. Quando não aguentava mais os tratamentos e as confusões médicas, decidiu que retiraria o útero.

Por causa da sua decisão, teve que fazer uma bateria de exames, o que lhe causou desgaste psicológico absurdo. Um médico lhe aconselhou que, além do útero, retirasse, também, o colo do útero. Aceitou porque lhe animava a ideia de que, finalmente, poderia estar livre da sangria mensal que lhe causava sensações chatíssimas por todo o corpo.

Depois dos exames feitos, a cirurgia foi marcada. 

Foi internada com outras mulheres na noite anterior ao dia da cirurgia. Contou-me, várias vezes, com incredulidade, o quanto desumano eram os médicos.

Disse-nos que, momentos antes da cirurgia, foi levada a uma sala muito fria (mais parecia um abatedouro), onde teve as mãos amarradas ao alto e o corpo totalmente nu, pronto para ser cortado por um bisturi, na altura do pé da barriga.

A última coisa que lembra de ter ouvido antes de o sedativo surtir efeito foi o anestesista -- um homem careca com muito mais que 50 anos de idade -- dizer a seguinte frase ao médio escalado para a cirurgia:

-- Olha só, vamos andar rápido com isso, porque eu não quero que sobre pra mim, não!