last christmas

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Era a época do ano que eu mais amava. Passeava pela cidade e notava os milhares de papais noéis diferentes: inflável, de papelão em frente à alguma loja, homens velhos vestidos de papai noel e entregando presentes para crianças na rua. As luzes brilhantes piscavam e paravam. Piscavam e paravam. Vermelho. Azul. Amarelo. Verde.

Eu usei o verbo no passado, pois eu não amo mais o natal. Eu não amo a maneira como as crianças saem saltitando por aí. Eu detesto as luzes piscando e enganando meus olhos. Eu desprezo os biscoitos e comidas especiais de natal, me dão ânsia.

Mas eu nem sempre fui assim, um odiador oficial do natal e tudo que ele representa, mas no último natal eu havia ido até uma festa da empresa onde eu trabalho, e onde meu namorado também trabalhava. Quando cheguei na festa, eu o vi com outra pessoa.

Foi um caos, eu queria fazer um barraco digno de reality show, mas apenas fiquei o encarando. A pessoa em questão trabalhava conosco, e como eu não era obrigado a vê-los, saí da festa e no dia seguinte me despedi.

Loucura perder o emprego por um homem infiel. Loucura começar a detestar uma data tão legal por causa da falta de noção das pessoas. Mas foi assim que tudo mudou em apenas uma noite.

Quando passei em frente à uma cafeteria resolvi entrar e tomar um café enquanto tirava uma folga de todas aquelas coisas de natal.

Mas assim que entrei, quis dar meia volta. Todo aquele lugar tinha enfeites e coisas de natal. Os atendentes estavam vestidos de papai e mamãe noel e os pedidos estavam sendo entregues em pequenas caixas de presente.

- Alguém ama muito o natal nesse lugar - um garoto, devia ter mais ou menos a minha idade, entrou atrás de mim na cafeteria e disse aquilo, dando uma risada. Eu o encarei, concordando com o que ele havia dito e me encantei com aqueles olhos verdes e a barba mal feita. Ele olhou para mim e sorriu - você parece a coisa menos natalina aqui.

- Estou num período contra o natal e o que ele representa. - eu disse enquanto procurava uma mesa menos natalina possível, mas o enfeite de mesa era uma pequena árvore de natal e a toalha de mesa era vermelha com um desenho do papai noel.

- E o que o natal representa pra você? - ele perguntou enquanto sentava-se comigo na mesa. Eu o encarei, incrédulo com a falta de noção de espaço. - Pra mim representa Jesus e presentes - ele deu de ombros e chamou um dos garçons, que estava vestido de elfo natalino. - eu quero um chocolate quente com dois biscoitos de natal sortidos - ele disse, apontando para o cardápio. O garçom anotou seu pedido e olhou para mim, esperando.

- Café preto sem açúcar - disse simples e rapidamente para que ele saísse logo - escuta, você pode ver, mas tem outras mesas disponíveis.

- Achei que você merecia minha companhia - ele disse e eu ri. Ele franziu o cenho e me encarou - eu sou um cara legal, juro.

Quando o garçom levou meu pedido, ele me encarou e disse:

- Café preto e sem açúcar. Você é amargo também? Ou só seus gostos?

Queria responder algo para lhe fazer calar a boca, mas eu dei uma leve risada e ignorei tudo que ele estava dizendo.

O garoto ficou conversando sozinho enquanto eu lhe respondia apenas o que estava com vontade de responder. Ele não cansava de me incomodar e não parecia querer ir embora, então eu levantei e saí da cafeteria.

- Ei - ele disse, gritando atrás de mim - desculpa ser chato, mas eu realmente não tenho com quem ficar e não gosto de passar o natal sozinho.

Eu queria dizer a ele que eu não tinha nada a ver com seus problemas e que ninguém aguentava ficar perto dele porque ele era extremamente chato, mas olhei melhor para ele. Suas roupas, seu rosto. Ele parecia sozinho no mundo, parecia ter sofrido alguma coisa, mas ali estava ele na minha frente: sorrindo com uma expectativa que eu não fazia ideia de onde havia tirado.

- Vamos passear então - eu disse, sem saber bem o que fazer ou falar, mas resolvi ficar quieto e deixar que ele mesmo falasse o que bem quisesse.

Sentamos no parque da cidade, que estava todo decorado com enfeites de natal e diversas pessoas com toucas vermelhas do papai noel. O garoto, Bernard, estava comendo pipoca enquanto contava sobre algum natal que ele havia ganhado um cachorro, mas ele havia morrido duas semanas depois. Ele ainda sentia falta do cão, mesmo fazendo tanto tempo que o haviam perdido.

- O nome dele era Noel - ele riu - eu não tinha criatividade, mas era criança e amava o natal. Eu ainda amo, não sou você - ele olhou para mim e deu de ombros - mas não sei porque você não gosta...

- Uma pessoa me decepcionou...

- Elas decepcionam sempre - ele revirou os olhos - o natal deveria ser intocado.

- O natal nem é tudo isso. A gente fica reunido com quem nunca vê durante o ano, ganha presente que nem quer e ainda tocam as músicas ruins e chatas...

- Você não deveria ser tão amargurado - ele disse, tocando no meu ombro - as coisas são tão belas e você aí, com essa cara de bunda.

Eu o encarei e pela primeira vez naquele dia, seu semblante não era amigável.

- Você não tem noção da sorte que tem. Ter uma casa quente para comemorar o natal. Ter uma família por perto para te dar um presente que você não quer...

Bernard terminou de comer a pipoca e levantou do banco, olhou para mim e disse, antes de se afastar:

- Dê uma chance para o natal.


E eu dei uma chance para o natal. Passeamos por todos os lugares meramente natalinos e eu não conseguia parar de sorrir um segundo. Não sei dizer bem o que me fez mudar de ideia. O garoto insistente. O rancor querendo ir embora. A vibe do natal, que deixa a gente nostálgico e amante das coisas. Mas tudo que eu olhava, achava lindo.

A árvore de seis metros no meio do centro da cidade, cheios de caixa de papelão vazias simbolizando presentes. As luzes que não paravam de brilhar. O papai noel dando um tchau tímido em cima do seu trenó. As renas de pelúcia gigante em frente ao trenó. As crianças abanando para o papai noel.

- Viu? É lindo - Bernard disse, enquanto pedia outro biscoito de natal em um dos quiosques.

- Sim. É lindo - eu disse, sentindo meus olhos brilharem. Sentindo meu coração acelerado.

- E agora, já ama o natal de novo? - ele sorriu, e limpou as migalhas que caíam no seu suéter.

- Eu acho que sim - eu sorri para ele.

Bernard se aproximou de mim, eu sentia que ele queria me beijar. Sentia que aquele era o momento. A noite estava prestes a invadir a cidade e as luzes piscantes simbolizavam toda a mágica que eu estava sentindo dentro de mim. Eu segurei seu rosto e lhe dei um selinho, foi rápido, mas o suficiente para sentir todas as coisas boas me invadindo novamente.

- Obrigado por salvar meu natal.

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