Anna não queria se apaixonar no Natal. Ela estava com vinte e dois anos, e pediu a Papai Noel que desta vez não ficasse nas nuvens por alguém que iria embora antes do ano novo. Este ano ela queria ser esperta. Não que o amor a fizesse menos inteligente, no entanto, ela sempre amou com intensidade, mesmo os romances de verão. O Natal era a época mais luminosa, enfeitada, romântica do ano. Como não se apaixonar ela ainda não havia descoberto.
Ainda era manhã do dia dezenove de dezembro, Anna desviava dos viscos para não ter de contar com a sorte de se apaixonar até ser amor verdadeiro. Quantas vezes ela passou embaixo dos viscos e se apaixonou por uma gentileza, um sorriso, um beijo que nunca mais iria sentir. Este ano ela não entraria no clima. Ela não queria passar a próxima noite de Natal sozinha. Ela não queria se apaixonar de novo se não pudesse passar com uma pessoa ao seu lado ano que vem.
- Papai Noel, eu nem sei se você esta aí. Mas se estiver, eu peço que se exista alguém que se importe comigo, me deixe saber.
Desde os seis anos de idade Anna sabia que o Papai Noel era uma invenção de seu pai e de sua mãe. Ou melhor, de todos os adultos para que as crianças pudessem sentir a magia do Natal. Ela sabia que era uma fantasia, que não havia um Papai Noel de verdade, mas nunca deixou de acreditar na magia natalina. Talvez fosse por isso que ela sempre se apaixonava nessa época. Há sempre um mistério no ar da qual Anna queria sempre se entregar. Se ao menos pudesse contar com um romance que fosse durar até o ano novo...
''Não!'' – Anna gritou em pensamento. Ela não podia jogar tudo para o alto se não houvesse alguém que quisesse permanecer no ano que vem.
Anna já havia estado nessa situação antes. Ela apaixonou-se por uma garota argentina na noite de Natal. E no dia vinte e seis, ela já não estava mais ao seu lado. Teve também, uma garota que morava no seu prédio. Era final de novembro. Anna havia ficado animada, pois talvez elas estivessem juntas no próximo ano. Mas chegou dia vinte e quatro e a garota não pode vê-la. No dia seguinte, ela descobriu que não era a única que estava saindo com sua vizinha. E tantos outros romances que não passavam de janeiro. Este ano Anna queria algo diferente. Queria um amor que durasse de janeiro a janeiro. Tal como nos filmes. Mas ela sabia que a vida real era muito mais complicada.
Não era pedir muito que tivesse alguém ao seu lado a abraçando. No dia vinte e cinco de mãos dadas andando pelas ruas vazias. E seria pedir demais que esse amor durasse até agosto do próximo ano, ou mesmo pelos próximos cinco anos? Ela não queria seu coração partido. Este ano ela usaria uma armadura, um escudo, um capacete, nada iria fazê-la se apaixonar. Talvez Papai Noel fosse como um cupido. Mas este ano não.
Anna estava preparada para as flechas do amor. Nada iria passar pela sua armadura.
Ela desviou dos viscos. Evitou sair. Desviou os olhos quando viu casais abraçados perto das árvores. Ela revirou os olhos para um casal de duas mulheres mais velhas andando de mãos dadas. Talvez Anna estivesse sendo um pouco dura consigo e com os outros. Ela só queria algo verdadeiro. E que pudesse durar o tempo que fosse. Mas ela sempre teve o pensamento de que quanto mais se esta com alguém, mais as outras pessoas acreditam que é um amor de verdade, e com isso, ela também acredita. Ou melhor, acreditava. Ela se lembrou de uma garota que se apaixonou na noite do Natal. Elas haviam pegado o mesmo táxi para casa sem querer, e conversaram até cada uma ir para o seu destino. Ela nunca mais viu aquela garota, e mesmo assim, nunca a esqueceu. Aquele foi um amor que durou vinte minutos, e a fez se sentir escutada, querida, amada até agora. Ela tinha dezenove na época. Nunca soube onde morava, ou o que fazia, pois desceu antes da garota. A única coisa que sabia era um nome: Louise.
No dia vinte e quatro, Anna passou por um Papai Noel na rua do hotel onde estava hospedada. Ele ofereceu um biscoito da sorte, e ela balançou a cabeça em negativo, ele insistiu mais uma vez e ela respirou fundo, pegou, e guardou na bolsa. O Papai Noel sorriu satisfeito, e disse para ela ''você é uma garota de sorte, muita sorte!''. Anna arqueou as sobrancelhas como se fosse uma pegadinha, e sorriu afastando-se. Enquanto caminhava procurando uma cafeteria para um café quente ela resmungava do tempo frio de Londres. Ela que viera do clima tropical do Brasil não estava acostumada. Entrou na cafeteria, olhou o cardápio, e esperou ser atendida. O lugar estava quase vazio se não fosse por ela e uma senhora, e mesmo assim não tinha ninguém para atender. Anna pegou o biscoito da sorte que recebeu do Papai Noel. Desdobrou com cuidado o papel que dizia ''coisas boas acontecem para quem olha para frente''. Ela dobrou o papel, incrédula pela bobagem que acabara de ler. E então olhou para frente e a viu. Louise estava na sua frente e disse:
- Você é a garota do Brasil? Eu estive lá há três anos. Dividimos um táxi.
Anna parecia em choque, mas conseguiu responder:
- Espera! Você mora aqui?
- Meus pais são brasileiros, mas eu decidi sair do país tem um tempo. Parece que só nos encontramos na véspera de Natal.
- Parece que sim.
Louise serviu um café e panquecas a Anna. Elas conversaram a noite toda. Anna nunca pensou que na véspera de Natal poderia se apaixonar, sem criar expectativas do que viria a seguir. Ainda que ela soubesse que no dia cinco de janeiro estaria longe, ela não se preocupou de estar se apaixonando. E ela queria estar com Louise. Nem se deu conta se havia passado por viscos nas ruas de Londres enquanto caminhavam lado a lado. Não precisava deles para dizê-la se estariam com sorte. Seria ótimo se tivessem, e seria igualmente bom se não tivessem, pois tinham amor naquele instante, e isto era o bastante.
autoria de @giges_(Giovanna Fraga)
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all i want for christmas | ✓
Short StoryEspecial de Natal com contos lgbt. Autores: @giges_ @escalart_cold @sacredmoon_cry @amoxina