Era terrível. Era isso que eu pensava enquanto a via dançar na minha frente. Era terrível saber que nós duas nunca poderíamos colocar um filho nosso no mundo.
A criança não teria os olhos cor de mel dela, nem meus cabelos crespos. Não veria um mundo onde o amor venceu. Não veria suas duas mães tentando ensiná-lo a andar.
Ela olha para mim pelo espelho e começa a rir.
- Lá vai você de novo.
- Vou pra onde? - eu levantei da cama e a abracei por trás. Nos encarei no reflexo. Éramos lindas. E seríamos lindas misturadas.
- Pra esse mundo aí dentro - ela disse, tocando com o dedo indicador na minha cabeça.
- Eu quero ter um filho com você - eu disse, sem delongas.
Daisy riu.
Ah, a criança nunca ouviria essa risada.
- E então vamos ter um filho - ela disse, me abraçando pelo pescoço - eu seria uma ótima mãe.
- Você será maravilhosa - eu disse - mas eu quero que ele tenha nossas características. É tolo pensar assim?
- Tá brincando? - Daisy me encarou. Seus olhos brilhavam mais do que nossas luzes de natal no apartamento. - eu iria adorar uma criança nossa correndo por esse apartamento - ela disse e encarou o chão, como se pudesse ver a criança engatinhando.
- E o que vamos fazer? - eu a encarei, sentindo toda a frustração bater com força nas minhas costas.
Daisy se afastou e colocou as mãos na cabeça, dando uma risada chorosa.
- Eu quero que essa criança não tenha nenhum pai. É ridículo pensar assim?
- Não.
Eu disse simplesmente, mas ela tinha razão. Era injusto precisar de outra pessoa para sermos felizes, do nosso jeito. Eu queria que a criança tivesse duas mães. Porque o amor de uma mãe sempre vai ser o maior.
- Não chora - Daisy se aproximou de mim, mas eu nem havia notado que estava chorando. Ela se agachou na minha frente, ao lado da árvore de natal e colocou as mãos no meu rosto.
- É injusto - eu comecei a dizer, mas resolvi ficar quieta porque Daisy estava tão mal quanto eu.
Naquela noite não conseguimos dormir.
Daisy estava lendo uma biografia de alguma pessoa muito famosa e eu estava pensando naquela criança que não nasceria. Daisy também estava pensando nisso, eu podia sentir.
- Qual seria o nome da criança?
Ela perguntou depois de duas horas que estávamos deitadas na cama.
- Rosa.
- Rosa? - ela pensou por alguns segundos - achei interessante. Sua mãe iria amar - ela disse, tão baixinho que quase passou despercebido por mim.Eu olhei para cima. Era impossível não pensar na minha mãe e não olhar pra cima, porque ela era um anjo e eu tinha certeza que ela continuaria me protegendo depois que foi embora.
Senti as lágrimas vindo, mas funguei e encarei Daisy.
- Eu sei.
Dois dias antes da véspera de natal, Daisy apareceu correndo na minha direção quando estava no horário de almoço.
- Eu estou grávida - ela disse, seu semblante indicava tudo que eu estava pensando: como diabos aquilo poderia acontecer? - eu juro por Deus que nunca traí você - ela começou a dizer, apavorada com o que eu iria pensar.
- Eu sei - eu comecei a rir do absurdo de tudo aquilo - amor - eu comecei - você sabe muito bem que esses testes de farmácia são fodid...
- Justamente por saber disso eu fiz todos os testes possíveis. Até o de sangue - ela pegou sua bolsa e retirou o papel dali. E lá estava: positivo.
Eu não sabia bem o que pensar. Havia algum erro, isso era um fato. Daisy nunca me trairia, não somos assim.
Um papai Noel passou por nós duas enquanto conversávamos no restaurante. Ele estava entregando algumas coisas para as pessoas ali dentro.
Quando se aproximou da nossa mesa, seus olhos pareciam familiares e todo meu corpo se arrepiou. Eu podia jurar que conhecia aqueles olhos.
- Feliz natal - ele disse, com a voz rouca e entregando para nós duas um pequeno embrulho. Antes mesmo de agradecermos, ele já havia se afastado.
Daisy abriu o pequeno presente e começou a sorrir com o tanto de chocolate ali dentro.
- Parece que ele leu minha mente - ela disse, enquanto abria um dos chocolates e começava a comer.
Enquanto eu a admirava se deliciar na trufa de chocolate, notei uma pequena folha de papel vermelha com algo escrito.
"Vocês serão ótimas mães para essa menina".
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all i want for christmas | ✓
Short StoryEspecial de Natal com contos lgbt. Autores: @giges_ @escalart_cold @sacredmoon_cry @amoxina