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-Sinhô. - um dos jagunços se aproximou com o chapéu entre as mãos, meio cabisbaixo. O suor pingava pelo rosto redondo rumo ao colarinho apertado pelo pescoço largo. O homem ergueu o olhar da tangerina que descascava para comer. O homem de meia idade queria muito se abanar para diminuir o calor, provocado pela carreira que dera até ali, mas o medo o fazia congelar no lugar.

É melhor esperar as ordens do seu patrão para não cometer erros, pois ele está furioso.

-Achou ela?

Os outros, recém-chegados e igualmente ofegantes, se entreolharam nervosos de dar a notícia que sabiam que causaria uma grande mudança no humor do patrão, porém se era ruim a perspectiva da verdade, era muito pior que nada fosse dito a quem conheciam desde sempre como Barão.

-Lá embaixo, Barão. - por pouco não gaguejou. - Me confirmaram que tá lá embaixo. - alguns apertaram os olhos, esperando a pancada.

-Lá embaixo onde? - a última palavra soou como uma pancada na testa suada.

-Na festa. - sua voz soou bem perto de um miado.

A faca parou.

Nenhuma palavra a mais foi dita, o Barão, a quem demonstravam respeito por sua icônica figura, apenas abaixou o olhar para a fruta emanando o perfume cítrico ao ser aberta, balançou a cabeça de maneira incomodada e acenou para o homem de meia idade se afastar.

Este respirou mais aliviado.

De todas as coisas ruins que poderiam acontecer naquela noite, essa era a pior.

Um homem com cabelos vermelhos como fogo chegou perto e subiu a varanda, chegando tão perto quanto era seguro para alguém que bem sabia do que o Barão era capaz.

-O cavalo tá solto, patrão. Num pé e outro. - mirou o outro lado. Seu capataz, Gaara, era um dos poucos que não temia o seu olhar. Encostou o corpo numa das colunas de madeira que sustenta o teto da varanda, mastigando a folha de capim que catou no caminho, e parou de limpar as unhas com a faca. Os jagunços preocupados ficaram mais afastados. - Mando ajeitar o carro?

-Ô Raúl. - o Barão convocou em tom firme depois de comer um gomo da tangerina. Um rapaz de cabelos escuros e magro de pernas longas veio correndo do interior do casarão. Um tanto sem jeito, sussurrou "sinhô, meu pai." - Pegue a chave da S10 e vá com Gaara pra cidade. Bora buscar sua irmã. - deu a mesma resposta baixa de antes e voltou para dentro. Estava descalço. - Deixe o menino dirigir.

-Sim sinhô. Levo uns dois cabras? Danado de ter uns fí de Deus que pensam que tão na casa das raparigas deles. - seu patrão retomou o silêncio, mas, em seu julgamento particular, Gaara sabia que era melhor seguir seu pensamento. Sua mãe dizia que é melhor prevenir do que remediar. E quando diz respeito ao seu patrão, a prevenção é a melhor escolha.

Sempre.

Enquanto os jagunços escolhidos se preparam buscando armas, o Barão comeu a tangerina olhando para os rastros que seus homens deixaram na terra. Levantou-se do batente onde esteve sentado todo aquele tempo e limpou sua faca num lenço que foi para o seu bolso. Raúl voltou pronto e acompanhou Gaara, um pouco animado para assumir o volante do carro do pai. A pintura prateada bem polida se destaca facilmente na escuridão da noite cheia de estrelas, a lua estava invisível e um tanto tímida, mas com razão: aquela é uma noite muito perigosa.

Limpou seu chapéu na perna onde apoiava o peso quando ergueu os olhos para o céu estrelado, o fato de estar longe da cidade lhe permitia uma visão única de uma noite que deveria ser tranquila. Estava quente, com pouco vento, mesmo para ele que era acostumado com a quentura vinda da terra. Dali ouvia os relinchos rumorantes, quase fantasmagóricos, e batidas fortes do casco contra o chão como martelos. Era a forma do animal exigir a sua presença. Estava além do cercado de Pau de Ferro, solto dentro do estábulo, ansioso e irritado, porque o cavalo sabe que noites sem lua são propícias para cavalgadas do tipo que o animal mais aprecia.

O Anjo e o Barão [EM REVISÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora