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Parte 1
"Onde não puderes amar, não te demores." (Frida Kahlo)
Brianna

A primeira coisa que vi no meu chefe foi a bunda dele. Não, sério. Entrei na casa dele na manhã do primeiro dia de trabalho e ele estava nu na cozinha, me viu, cobriu o que importava com um pano de prato e ergueu as duas sobrancelhas.

— Você de novo? — ele disse.

Naquele momento, eu pensei que ele tivesse me confundido e ignorei o comentário. Foi só um mês depois que entendi.

Tínhamos ficado dois meses antes, e eu tinha desaparecido porque o síndico havia me ligado para dizer que havia um cheiro de gás no meu apartamento. Ele não guardou mágoa do meu sumiço, mas guardou para mim tudo que eu menos desejei na vida, e não, não estou falando da visão da bunda. Comparando com todo o resto, isso foi até agradável. Onde estou agora? Encarando o delegado do condado, esperando a minha liberação.

O filho da puta do Harvey chamou a polícia e foi cuidar da própria vida quando caí na piscina há três horas e disparei o alarme aquático. Vamos começar pelo início: ele não precisa de um alarme aquático morando na cobertura de um prédio de mais de vinte andares. Ninguém vai escalar tudo para escolher pular na piscina, se uma pessoa aguenta subir tantos metros, aguenta uma quedinha de poucos. E não custava ter olhado quem era antes de chamar a polícia, ou mesmo quando os policiais vieram me buscar. E o principal: ele não sentiu a minha falta, sendo que eu estava na casa dele trabalhando e de repente sumi!

— Seu advogado acabou de mandar a prova que você trabalha lá. — o delegado diz, encarando o computador. — Da próxima vez, acredito que seja mais fácil contatar o seu empregador.

Bufo.

— Se ele atendesse. Não tem alguma multa para quem chama a polícia sem necessidade?

— Neste caso, seria para o seguro, e não para o Harvey. — ele me olha por cima dos óculos — E não, felizmente não tem, ou vocês dois estariam sendo perseguidos pela seguradora.

— Ei, eu nunca chamei para ele. Vocês foram lá para ajudar ele, eu estava muito tranquila dormindo na minha casa, como a Julia provou.

— Você vai negar que foi quem afrouxou os parafusos da cama dele?

Não vou negar porque foi uma ideia genial e eu quero ter os créditos por ela, ainda que tenha me inspirado em uma das minhas irmãs. Ele empurra a cadeira para trás com o meu silêncio e levanta para abrir a porta para mim.

— A questão, Brianna, é que a polícia tem muito trabalho para ficar cuidando dessa guerra de vocês dois. Um trabalho que diz respeito aos dois, já que são cidadãos de Boston. Espero ficar pelo menos três meses sem te ver aqui.

Levanto da minha cadeira.

— Queria ter tanta esperança assim.

— Vocês deveriam parar com isso antes que algo mais grave aconteça. — ele sugere com paciência.

— Só no dia que ele admitir que Star Wars é melhor que Star Trek jogarei a toalha. — foi assim que nossa briga começou, na verdade.

Era uma bela quarta-feira de maio de dois mil e dezoito, eu ainda não tinha começado a odiar o meu chefe. Vesti a minha melhor camisa de um personagem da gloriosa Star Wars e fui trabalhar. Ele viu a minha camisa assim que entrei e disse as seguintes palavras: "é uma blasfêmia você usar essa camisa na minha casa," como se eu estivesse usando uma camisa ofendendo a mãe dele, "e ele ser o pai do menino lá? Eu nem fiquei surpreso."

Claro que ele disse o nome do menino lá. Ele disse que não sabia que eu não sabia, e eu disse que se ele não sabia que eu não sabia, poderia ter pensado na possibilidade de eu não saber e... pronto. A guerra foi declarada. O próximo passo, claro, foi meu. Em um dia de tédio em que ele estava em uma festa e eu trabalhando para nenhuma das fotos dele na festa virar notícia, eu fazia um bolo para ele, sem açúcar e nem manteiga e com uma pitadinha de nada de sal. Acordei e tinha uma nova regra na casa "Brianna está proibida de cozinhar". Até hoje ele não come o que eu cozinho.

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