"Eu sinto falta das vezes que paramos para contemplar às coisas deste mundo, tipo, o céu, as estrelas, a lua. Se existe algo que, particularmente, atrai a minha atenção é a própria natureza, seja florestas, desertos ou até o próprio Polo Norte. É tudo tão incrível que o próprio ser humano não consegue copiar, apenas estragar.
Tenho vagas memórias de férias no campo, admirando a natureza e seu presente. Posso dizer com certeza que meu sonho começou ali, querer transmitir aquela beleza para outras pessoas. E esse sentimento combinou com o meu dom para pinturas, transformando toda a minha infância em algo único. As telas, a tinta, o jeito de colocar todo aquele sentimento em um só quadro e transmitir tudo aquilo para outras pessoas.
E essa jornada que começou naquelas férias em família no campo, guiaram o meu universo por todo a minha adolescência, e eu guardo isso em meu coração, seguindo com esse sonho, esse desejo, essa semente."
Posso jurar que já podia ver as lágrimas nos olhos do meu pai.
"O caminho para as artes já estava concreto desde criança, e agora olhando por todo o caminho que eu percorri, tenho orgulho de dizer que aquele sonho está só começando, aquele sonho, aquela semente está começando a florescer. Para todos nós, certo?"
Respirei fundo, uma, duas, três vezes, as lágrimas brigavam para descer.
"Tenho orgulho por todos nós, um carinho pelas amizades feitas, e que agora, indo em direção a faculdade, que essa semente possa florescer mais ainda, para de tornar uma bela flor. Muito obrigado por todos esses anos, eu amo todos vocês. "
E esse foi o meu discurso de formanda, as palmas cresceram junto com as minhas lágrimas, e eu não sabia como segurar aquilo. Tudo ia mudar, para longe das minhas amigas, da minha cidade, do meu lar. Quando desci do palco fui direto para o abraço da Camille, o que seria de mim sem ela? Era tudo tão excitante mas assustador ao mesmo tempo.
Em um instante estava abraçada com todas as minhas amigas, todos nós estávamos chorando, até a Luana dizer a frase que acabou com cada uma:
É o fim de uma era.
O que seria de nossa amizade sem uma referência de friends até no final?
Eu só desejo do fundo do meu coração em não perder esse brilho, essas amizades, esse meu amor. Posso dizer com orgulho, e lágrimas, que estou formada e vou buscar o meu sonho na maior faculdade de artes do país.
Quantas vezes o mundo dá voltas em quatro anos? O que é mais assustador terminar essa jornada que eu tanto sonhei, mas com tamanho sufoco, contando os dias para enfim acabar.
Destino consegue causar peças em sua vida, e eu só consigo rir das que aconteceram comigo, já que chorar vai mudar nada. Formando no ensino médio como a aluna exemplar da escola, guiando todo mundo em direção aos seus sonhos. Agora uma ninguém que mal consegue tirar o mínimo de nota para ganhar a aprovação.
Eu não consigo responder com minhas palavras o que realmente nesses quatro anos que me tornaram uma pessoa completamente diferente. O choque foi grande, e eu nem sei por onde começar.
Posso afirmar com certeza que o maior choque foi com as minhas pinturas, que em determinado momento deixaram de transmitir aquele meu sentimento e hoje não passam de técnicas vazias em uma tela. A técnica melhorou com certeza, juntamente com os elogios e a fama. E em meio a todo esse processo algo dentro de mim sumiu e eu não sei dizer como ou quando. Para piorar, o que exatamente eu perdi? Nem disse eu lembro mais, eu só sinto o vazio, a falta que faz. Tudo que eu dizia e pregava viraram contra mim como um soco no peito. As noites chorando por esse vazio inexplicável são incontáveis, buscando por algo perdido dentro de mim, aumentando a minha ansiedade com todo o resto. Como é viver exatamente? Por qual motivo é tão difícil viver sem isso dentro de mim? Como é difícil viver sem algo que nem lembro mas faz falta? Onde exatamente eu comecei a errar para chegar ao ponto de estar perdida no meu próprio caminho, de não entender se sigo em frente ou se estou voltando. Esse peso é o mais difícil de carregar.
O outro choque veio no amor. Já passei por diversos romances e pessoas na vida, mas ninguém foi como esse garoto. Eu não sei dizer em outras palavras sem transformar em um clichê, já que tudo que vivemos pareceu como um sonho para mim. Ele não foi o meu primeiro nas coisas, mas eu desejo que ele fosse o último. Eu entreguei o meu coração, e para piorar, eu segurei o dele, seus sonhos, medos e anseios. Toda a sua dor, junto com a minha, nós conectou para algo tão único que eu não tenho palavras para descrever o meu amor por ele, não tenho palavras para descrever as nossas memórias. Não existe essa de romance perfeito, acontecia nossas brigas sim, mas o jeito como lidamos com aquilo era incrível, sempre abrindo espaço para melhorar, crescer juntos. Eu pensei, junto com meu coração, que iria casar com aquele garoto. Mas de repente, acabou. Como acabou? Sinceramente eu me pergunto isso frequentemente, como todo aquele amor, como aquele nosso romance acabou? Construímos toda a base, caminhamos juntos, apoiados um no outro, um casal. Tudo que é bom dura pouco. Eu não acreditava, mas agora, faz todo o sentido. Esse peso rasga o meu coração.
O choque da solidão tinha que estar aqui né? Em algum momento nessa caminhada eu estava completamente sozinha, sem as minhas amigas mais íntimas, como se tudo o que vivemos por todos aqueles anos significasse nada. Eu realmente precisava de uma mão amiga, e talvez ainda precise, porém nada disso ocorreu, já que todas as amizades acabaram em um piscar de olhos. Igual o romance, essa aqui também falhou e eu me pergunto se o problema foi comigo. Esse peso enche os meus olhos de lágrimas.
O toque final eu deixo com a minha depressão. Eu acho engraçado o quanto ela veio somada com tudo. Cada choque eu tive que processar individualmente, menos esse aqui. Igual um tumor, simplesmente apareceu e agora eu lido com isso. Eu não processei, eu não busquei uma solução, apenas deixei existir. E cresceu. Todos os choques faziam crescer mais. Eu não sei mais se é possível cair mais lágrimas dos meus olhos. Eu não sei mais se é possível gritar. Existem noites que eu não tenho mais certeza se estou viva, perdida nos meus pensamentos. E nesse tempo eu aprendi a conversar menos, ficar mais no quarto fingindo estudar mas apenas encarar o teto e ver as horas passar. Eu acho que talvez na minha infância eu admirava outra coisa, o que aumenta a tristeza dentro de mim? O que houve comigo? Onde eu comecei a ser algo assim? Onde as coisas ficaram tão difíceis por eu me odiar? Talvez eu deveria mandar um pedido de desculpas para o meu eu de anos atrás, que sonhava e desejava algo, aquela criança inocente que buscava aquele sentimento. Esse peso tirou a minha vida.
Apesar de todos os adeus, eu agradeço por cada um de vocês que passaram pela minha vida, e não se preocupem, a culpa não é de vocês, e sim minha. No final, é sobre quem aguentar as porradas que ganha nessa vida, e essa pessoa não era eu. Obrigado por todas as memórias, obrigado por todos os abraços, eu vou sentir falta disso.
Para o meu eu, sinto muito não ser aquilo que você esperava e decepcionar os seus sonhos, talvez se eu tivesse sido mais corajosa ou conversado com alguém, as coisas teriam sido diferentes.
Talvez em outra vida, ou não.
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My Last Words
Short StoryConfissões, arrependimentos, gratidões. Nossas últimas palavras definem do que estamos cheios. O quão profundo você se conecta?