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Jeon Jungkook - 17 de março de 2025

Era irrelevante jogar flores aos mortos. As flores do seu próprio jardim. Quando eu ou Heejin arrancávamos uma única flor, nossa mãe brigava conosco, dizendo para não arrancar o direito de vida de uma planta sem um motivo. Iríamos conseguir admirá-la por mais tempo se ela estivesse ligada à terra, do que se estivesse em nossas mãos. A atitude do meu pai de enfeitar o túmulo de minha mãe todas as flores de seu jardim me pareceu péssima, as minhas irmãs concordariam comigo, mas não tinham forças para reclamar ou opinar. Elas só choravam.

Jeon Seoyeon foi morta acidentalmente por um policial que a confundiu com uma ladra. Parecia uma história daquelas que se vê em notícias da internet. Mas no fundo eu sabia que aquela manchete era somente uma farsa para esconder o fato de que minha mãe foi morta por ser uma cardinal. Talvez nunca iríamos saber qual foi o real motivo da morte da minha mãe e eu sinceramente preferia fingir que foi só um acidente, era menos doloroso. Nossa família engoliu aquela mentira que desceu amarga por nossas gargantas. Depois de alguns meses ela voltou a nossa boca queimando como uma azia. A família Jeon não ficaria quieta até fazer justiça, embora eu quisesse somente viver uma vida normal. Não obstante, o número "134340" tatuado no meu braço não deixaria eu viver uma vida humana, nem todo o dinheiro do mundo faria isso.
Meu pai era um humano normal, um humano aceitável. Era CEO de uma empresa bilionária, o que fez que eu e minhas irmãs nascessem em berço de ouro. Mas minha mãe era um cardinal. Tinha poderes de cura e regeneração acelerada. Eu, Jieun e Heejin nascemos cardinais como ela. Em outras famílias, sinônimo de decepção, azar e praga. Em nossa família, um motivo de orgulho.
Em casa, Heejin de oito anos estava com seu olhar fixado na tela de seu celular. Jieun tinha ido dormir após chorar o bastante para seu rosto ficar inchado. Eu tinha chorado, não o necessário para expulsar todas as mágoas.

A mais nova arrancou suas botas de couro com os próprios pés e se sentou no sofá, ao meu lado. Heejin era a que estava levando o falecimento da mamãe de maneira mais leve, provavelmente por ser nova demais.

- Se eu fosse uma heroína, a mamãe não tinha morrido. - Continuou vidrada nas atividades do celular.

- Não existem heroínas cardinais, somente humanas.

Apertei minhas mãos. Eu não queria que ela se decepcionasse. As heroínas em HQ's e nos filmes são humanas e as vilãs são cardinais não registradas. Sempre somos os vilões. Eu estava tenso em pensar que quando ela desse conta disso, poderia ficar triste. Mas Heejin deu risada, para a minha surpresa.

- Eu nem preciso do Namjoonie pra saber que você está mentindo, Kookie! - A pequena me deu o celular. - Olhe, eu achei uma história sobre uma heroína cardinal. Ela controla a água. Quando eu crescer, quero ser igual ela.

Ela estava certa, era um heroína com super poderes e uma capa estilosa. Verifiquei o site e Heejin tinha achado um site de conteúdo pirata, com vários livros e HQ's de cardinais como protagonistas. Esse tipo de conteúdo era censurado e proibido, nem sei como Heejin conseguiu achar um site desse, entretanto, o fato dela ler aquela história em quadrinho a fez esquecer da morte da mamãe. Ela estava alegre novamente, como uma criança deve ser. Heejin continuou falando sobre seu novo sonho de ajudar as pessoas. Jieun apareceu na sala e se sentou ao meu lado. Ela comprimiu os lábios segurando o choro. Jieun se parecia com a mamãe em personalidade e até seus poderes eram parecidos, porém ela parecia outra pessoa naquele dia.

- Heejin, não tem como você usar seus poderes. Nós tomamos a vacina e consequentemente seus poderes não funcionam, como se nunca existissem. - Jieun confirmou o que já sabíamos, vagamente.

A vacina. Todos os bebês com sangue cardinal tomam depois de nascer. Ela faz com que nossos poderes não se aprimorem e nem se manifestem. Jieun tomou a vacina, mas era uma exceção do sistema. A vacina não surtiu efeito, já que um de seus poderes é resistência evoluída. Mas ninguém além de nossa família sabe disso.

Heejin fez um bico tristonho e guardou o celular no bolso.

- Se eu tivesse seus poderes mana, talvez eu pudesse ser uma heroína de verdade. - Heejin murmurou.

A feição de Jieun mudou completamente. Ela estava com um sorriso largo no rosto, fitando a tv desligada como se tivesse arranjado a solução dos problemas da humanidade. Bem, da humanidade eu não sei, mas dos cardinais, ela achou.

Dystopia - jikookOnde histórias criam vida. Descubra agora