s e i s

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O bar está atulhado de gente que se aglomera entre as mesas e a pista de dança. A música tem uma melodia agradável e reconheço imediatamente a voz do homem que se apresenta em cima do palco.

Zac não mudou muito. Os cabelos permanecem longos, num castanho claro quase loiro, um caos, cheio e revolto. Ele está mais magro, embora a estrutura corporal esteja indiscutivelmente mais definida, a musculatura do braço marcando o tecido da camiseta enquanto dedilha o violão.

Paro alguns minutos para vê-lo tocar. É inevitável não lembrar de Thamy me atazanando a cabeça, gastando todo o seu vocabulário para elencar cada qualidade daquele garoto. O sorriso malandro, a pele aveludada, a voz sacana, o senso de humor negro. Ela era apaixonada por Zac desde pequena.

Minha mente vagueia e se perde entre as lembranças, as boas e as ruins. Até que vejo o meu alvo loiro, sentado na banqueta do bar, encostado em uma das colunas de madeira, bebendo cerveja e observando a mulherada passar.

Olho para as roupas que visto e, subitamente, bate uma insegurança dos diabos. Eu sou uma droga no papel de fêmea fatal, não gosto de usar maquiagem nem roupas sensuais, sou desastrada e com problemas de equilíbrio. Só que depois de ser menosprezada por ele, preciso de tudo isso para me vingar com o mínimo de dignidade.

Taylor está sério, a boca dura e os maxilares retesados.

Agora, mais de perto, percebo que ele não olha para as mulheres dançando na pista. Não. Fixa o olhar perdido num ponto qualquer do horizonte, pensativo, emburrado. E mesmo no meio da multidão, parece tão sozinho.

Esse homem me confunde.

Eu não me aproximo muito. A coragem vai dando lugar ao pior dos sentimentos: a culpa.

Ele tem razão em me querer longe. Eu menti.

Continuo mentindo. Para ele e, principalmente, pra mim mesma.

Eu também tenho meus motivos para me manter afastada. Taylor traiu toda a confiança que depositei nele.

Eu sei, eu já cogitei terapia. Não importa quanto tempo passe, essa merda simplesmente não sai da minha cabeça.

Vê-lo assim, o olhar distante, absorto no vazio... Se eu o conhecesse bem diria que a nossa pequena discussão de hoje cedo é o motivo para tamanha tristeza e melancolia.

O problema é exatamente esse. Eu o conheço bem.

Sei que é orgulhoso demais pra admitir que eu ainda mexo muito com ele.

Sei que quando sorri seus olhos se apertam e dois sulcos se aprofundam ao redor de sua boca irreverente e pronta para largar um palavrão ou palavras de duplo sentido, maliciosamente maldosas. Sei também sobre o tom do azul de seus olhos e que precisa cortar o cabelo loiro a cada dez dias, e ele raramente cumpri esse cronograma, deixando-o fora do corte a maior parte das vezes, emprestando aos seus 1.85 de altura um ar de bandidão sedutor quando também não se barbeia.

É incrível como pequenos detalhes se transformam em verdadeiras obsessões.

Quando ele me vê ali parada, os olhos azuis escurecem como um céu prestes a desabar água.

Uma cobra parece ter picado o seu traseiro, pois se coloca de pé em meio segundo, quase derrubando o garçom com a bandeja e as bebidas.

O que estou fazendo?

Não tenho a menor condição de continuar com isso.

É exatamente no momento que viro de costas para ele, pronta para ir embora e esquecer essa vingança imbecil, que eu o vejo.

Sempre foi você (concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora