· • • • ✤ • • • · • • • ✤ • • • · • • • ✤ • • • ·A última badalada do relógio misturou-se ao som da primeira palavra do prefeito.
- Jacquemin - disse ele -, espero que dona Antoine esteja variando. Ela me transmitiu seu recado, segundo o qual sua mulher foi morta e foi você quem a matou.
- É a pura verdade, sr. prefeito - respondeu Jacquemin. - Devo ser preso e julgado o mais rápido possível.
Proferindo tais palavras, ele tentou se levantar, apoiando-se no marco com o cotovelo, mas, após um esforço, caiu de novo, como se os ossos de suas pernas estivessem quebrados.
- Que ideia! Você está louco! - exclamou o prefeito.
- Olhe as minhas mãos - insistiu Jacquemin.
E ergueu as duas mãos ensanguentadas, às quais seus dedos crispados davam a forma de foices.
Com efeito, a esquerda estava vermelha até acima do pulso, a direita até o cotovelo.
Além disso, na mão direita, um filete de sangue fresco corria ao longo do polegar, proveniente, segundo toda probabilidade, de uma mordida que a vítima, ao se debater, dera em seu assassino.
Nesse meio-tempo, os dois policiais haviam se aproximado, feito alto a dez passos do protagonista da cena e, montados em seus cavalos, observavam.
O prefeito fez-lhes um sinal e eles apearam, jogando a rédea de suas montarias para um garoto de quepe policial, que parecia ser um cavalariço mirim.
Em seguida, aproximaram-se de Jacquemin e o suspenderam pelas axilas.
Ele não ofereceu resistência alguma, demonstrando a inércia do homem cujo espírito está absorto num único pensamento.
Nesse instante, o comissário de polícia e o médico chegaram. Acabavam de ser avisados do ocorrido.
- Ah, venha, sr. Robert! Ah, venha, sr. Cousin! - chamou o prefeito. O sr. Robert era o médico e o sr. Cousin, o comissário de polícia.
- Aproximem-se, ia mesmo chamá-los.
- Ora, ora! Vejamos, o que houve? - perguntou o médico, com o ar mais jovial do mundo. - Um caso de simples assassinato, pelo que ouvi dizer?
Jacquemin não respondeu nada.
- Fale então, seu Jacquemin - continuou o médico -, é verdade que foi o senhor quem matou sua mulher?
Jacquemin não emitiu um som.
- Trata-se no mínimo de uma autoacusação - comentou o prefeito. - No entanto, ainda torço para que seja uma alucinação, e não um crime real, que o fez confessar.
- Jacquemin - pediu o comissário de polícia -, responda. É verdade que matou sua mulher?
Mesmo silêncio.
- Não importa, logo saberemos - opinou o dr. Robert. - Ele não mora no beco dos Sargentos?
- Mora - responderam os dois policiais.
- Muito bem, sr. Ledru![13] - sugeriu o médico, dirigindo-se ao prefeito.
- Vamos ao beco dos Sargentos.
- Eu não vou lá! Eu não vou! - gritou Jacquemin, desvencilhando-se dos policiais com um gesto tão violento que, se pretendesse fugir, estaria decerto a cem passos dali antes que alguém cogitasse persegui-lo.
- Mas por que se recusa a ir? - perguntou o prefeito.
- Que motivos teria eu para ir, se confesso tudo, se estou lhe dizendo que a matei, e que o fiz com aquela grande espada medieval que roubei do Museu de Artilharia ano passado? Recolham-me à prisão, não tenho nada a fazer na minha casa, recolham-me à prisão.