· • • • ✤ • • • · • • • ✤ • • • · • • • ✤ • • • ·Como na primeira pausa da história do sr. Ledru, fez-se um momento de silêncio.
Silêncio ainda mais respeitado que da primeira vez, pois sentíamos o final da história se aproximando e o sr. Ledru havia declarado talvez não ter forças para chegar lá.
Mas, quase imediatamente, ele prosseguiu:
- Três meses haviam se passado desde a noite em que cogitáramos a partida de Solange e, desde aquela noite, nenhuma palavra de separação fora pronunciada.
Solange quis morar na rua Taranne. Como eu continuava sem saber seu nome, chamava-a de Solange, e ela, pelo mesmo motivo, a mim de Albert. Consegui-lhe uma vaga em certa instituição de moças como professora-auxiliar, a fim de protegê-la das buscas da polícia revolucionária, mais intensas que nunca naquele momento.
Passávamos os domingos e as quintas-feiras juntos, no pequeno apartamento da rua Taranne. Da janela do quarto, víamos o lugar onde nos havíamos encontrado pela primeira vez.
Diariamente recebíamos uma carta, ela em nome de Solange, eu em nome de Albert.
Foram os três meses mais felizes de minha vida.
Apesar de tudo, eu não desistira da ideia que me ocorrera após a conversa com o auxiliar do carrasco. Pedira e obtivera autorização para realizar experimentos sobre o prolongamento da vida após o suplício, e esses experimentos me haviam demonstrado que a dor sobrevivia ao suplício e era, decerto, terrível.
- Ah, eis o que me recuso a aceitar! - exclamou o médico.
- Vejamos - continuou o sr. Ledru -, o senhor nega que o cutelo golpeie no lugar mais sensível de nosso corpo, em virtude dos nervos nele concentrados? Nega que o pescoço encerre todos os nervos dos membros superiores: o simpático, o vago, o frênico e, por fim, a medula espinhal, que é a própria fonte dos nervos associados aos membros inferiores? Nega que o rompimento, que o esmagamento da coluna vertebral óssea produza uma das dores mais atrozes que é dado sentir a uma criatura humana?
- Isso não - admitiu o médico. - Mas essa dor dura apenas alguns segundos.
- Ah! Isso é o que eu, de minha parte, recuso-me a aceitar - exclamou o sr. Ledru, com profunda convicção. - E depois, ainda que dure alguns segundos, durante esses segundos a sensibilidade, o temperamento, o eu permanecem vivos. A cabeça entende, vê, sente e julga a separação de seu ser, e quem é capaz de afirmar que a curta duração do sofrimento compensa sua horrível intensidade? [56]
- O senhor então considera um erro filantrópico o decreto da Assembleia Constituinte que substituiu a forca pela guilhotina, e prefere o enforcamento à decapitação?
- Sem dúvida alguma, muitos dos que se enforcaram ou foram enforcados voltaram à vida. Pois bem! Estes puderam relatar o que sentiram: uma apoplexia fulminante, isto é, um sono profundo sem nenhuma dor específica, sem nenhuma sensação de angústia, uma espécie de chama que brota diante dos olhos e que, gradativamente, adquire a tonalidade azul, escurecendo quando cedemos a uma síncope. E, com efeito, doutor, o senhor sabe melhor que ninguém: se pressionarmos o dedo contra a cabeça de um homem numa região onde falta um pedaço do crânio, esse homem não sente nenhuma dor, apenas adormece. Muito bem! O mesmo fenômeno acontece quando o cérebro é comprimido por um excesso de sangue. Ora, no enforcado, o sangue se acumula em primeiro lugar porque entra no cérebro pelas artérias vertebrais, que, atravessando os canais ósseos do pescoço, não podem ser comprimidas; depois, porque, tendendo a refluir pelas veias do pescoço, ele é obstruído pela articulação que conecta o pescoço e as veias.
