24 de Janeiro de 2020
Já tínhamos transado incontáveis vezes. Tínhamos aquele fogo inicial de toda paixão, onde o corpo de um súplica pelo toque do outro. Mas de todas as nossas transas, se uma tivesse de estar entre essas correspondências, com toda certeza, sempre seria essa. Porque entre todas as suas mentiras, pesquei momentos, olhares e alguns gestos seus, que foram reais, mesmo que não por amor e somente por puro desejo e excitação. Eu adorava o jeito que você me tinha na cama, como se soubesse melhor que eu, todas minhas vontades e desejos. Meu corpo aprendia a estar em perfeita sintonia com o teu, no mesmo ritmo acelerado enquanto perdíamos junto o fôlego. Enquanto você me beijava, apertava meu corpo inteiro contra o teu, me colocava em seus lábios e me mordia e fodia olhando no fundo dos meus olhos, eu gemia apaixonadamente. O sexo contigo era incrível, mas aquela noite foi surreal. Teu corpo era totalmente meu, e o meu estava à mercê de toda a luxúria que você pudesse cometer, como se a transparência de nosso maior pecado, acendesse uma chama que queimava aquele quarto num calor que nos dava ainda mais tesão e vontade de foder. Sim, Miguel. Essa transa, em especial, em que o tempo todo manteve o olhar preso ao meu enquanto a gente transava de mãos dadas, foi de longe uma das coisas mais sinceras da nossa relação.
— Uau! O que foi isso? — você tombou para o lado da nossa cama enquanto eu me contorcia entre orgasmos que se intensificavam vendo teu corpo brilhando de suor.
Você se ergueu para me assistir e eu senti vergonha. Mas quando queria você sabia ser uma pessoa indescritível. Ao momento em que percebeu que estava envergonhada, você virou-se e me beijou. Quando parou você deitou a cabeça sobre meu peito.
— Você acha que ficaremos juntos pra sempre? Aconteça o que acontecer? — você disse.
Em nossos inalterados e respectivos lugares te respondi:
— Se depender de mim, nunca vai acontecer nada que seja suficiente pra que não fiquemos juntos.
Você se levantou nu e foi indo em direção ao banheiro. Ouvi quando ligou o chuveiro e voltou me convidando para um banho.
Me levantei e te acompanhei.
No banheiro você ficou em silêncio por alguns instantes enquanto me lançava um olhar que mapeava meu corpo e meu rosto, como se coletasse fragmentos suficientes para dizer um adeus. Fragmentos que te fariam lembrar de mim — eventualmente como já cheguei a pensar — exatamente como posteriormente fosse me lembrar de você.
— Tenho medo de que você desista de mim... Pelo meu jeito.
— Do que você está falando?
— Sou muito complicado, Tessa. Tenho medo de que minha complicação afete você.
E afetou. Fui muito burra em pensar que não. Quando você finalmente disse uma verdade, te sabotei como uma bússola que deixa de apontar para o norte. Neguei que você pudesse ter algo de complicado que seria difícil de suportar, porque te amar me passava a sensação de que tudo seria suportável.
— Sinto que não existe ninguém no mundo que me deixe tão bem quanto você. Suas complicações eventualmente serão acompanhadas das minhas. Estaremos juntos lidando com cada uma delas.
— Você já disse várias vezes que pareço aéreo em relação a nós... Mas tenho medo de te perder, por que sei que nunca vou conseguir encontrar alguém melhor.
Teve certa tremulação em sua voz, totalmente inédita para mim. Talvez você até tivesse chorado, mas o banho foi seu álibi. Tudo que eu sempre quis foi ver você desmoronar para mim, para que eu pudesse te ajudar a se recompor. Sei que é um pensamento egoísta, mas você fez crescer em mim essa vontade de te ver ser frágil.
— Deixe as coisas irem acontecendo... Quando suas complicações surgirem, vamos descomplicar juntos.
Afinal, o amor também é sobre isso, não é? Você talvez nunca tenha aprendido, mas amar requer paciência e cuidado, e você se descuidou de nós.
— Eu amo estar com você.
E aqui eu pondero entre a certeza e a incerteza, pois quando penso que é certo dizer que aquilo era verdade, que você deixava transparecer que minha companhia te confortava, vem a incerteza de que havia um desvio naquela frase, que poderia ter sido um "não te amo tanto quanto sei que me ama, mas sua presença me faz bem e não quero abrir mão disso".
Você me teve por completo, mas eu nunca soube o quanto te tive, se é que tive. Essa incerteza, acima do que penso sob minhas interpretações do que você quis dizer, não me deixam dizer se aquilo era umas das poucas verdades ou só mais uma das incontáveis mentiras, por isso, é uma das únicas lembranças que tem minha imparcialidade.
— T.
19h01min
VOCÊ ESTÁ LENDO
Por Isso Você Nunca Poderia Me Amar
RomanceTessa faz uma introspecção nesse romance epistolar, quando escreve para o ex companheiro, que não vai mais aceitar essa forma ilógica de amor. Todos os direitos desta obra estão reservados Obra registrada ®️