Dezessete

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Ele

Vivian acerta seu rosto em cheio com um jato d'água.

-- Hadouken! -- Ela ri exageradamente da própria piada e da expressão indignada que ele faz.

Dante prende o fôlego e afunda, nadando depressa até alcançá-la, totalmente distraída. Ele puxa Vivian pelo pé, fugindo em seguida, ainda sem retornar à superfície, e ela, recuperando-se do susto, o persegue debaixo do curso constante de água. Eles estão próximos da cascata, por isso nadam com um certo custo. Precisam usar muito mais força nos braços e pernas para não afundarem de vez.

Ele se esconde na parte de trás da cachoeira, próximo da caverna, observando Vivian através das frestas de água. O sol está alto, lançando no ambiente seus raios ultravioletas que trespassam os galhos das longas árvores que ladeiam o rio. Ela, a mulher que faz seu debilitado coração dar fortes golpes no peito, se encontra de costas, mais adiante, com a silhueta da cintura para cima sendo envolvida com feixes dourados de luz solar.

É o ápice.

Dante subitamente sabe. É uma constatação inesperada, que lhe traz uma pitada de aflição.

Jamais poderia imaginar que depois de perder Paloma outra pessoa poderia penetrar sua alma de jeito tão fácil.

Vivian.

Como isso pôde ocorrer em tão pouco tempo?

-- Ei, isso não tem graça! -- reclama ela, girando o corpo de um lado para o outro, procurando-o com os olhos díspares semicerrados. -- Dante!

Adiantando-se, ele atravessa a cachoeira, a segura firmemente pelas mãos, trazendo-a para seus braços e posiciona-os na torrente, que jorra água abundante em seus corpos.

E Dante beija-a como se o mundo fosse se acabar no minuto seguinte.

Meio-dia em ponto Vivian e Dante saem da campina, entrando na trilha silenciosa rumo ao centro do município. Vivian colocara uma espécie de bata curta e branca com tecido diáfano por cima do biquíni vermelho, já ele vestira de volta a camiseta.

-- Quando você soube que queria ser veterinário? -- questiona ela do nada, prendendo o cabelo já quase seco num coque alto e bagunçado.

Dante nem precisa parar para pensar no que responder a ela. Ele permite que um sorriso diminuto apareça em seus lábios.

-- Quando eu tinha onze anos. -- responde. Seus olhos perdem o foco, rememorando o fatídico dia. -- Estava com meu pai no carro e ele, por acidente, atropelou um tatu. Fiquei o tempo todo do lado do bichinho, dizendo baixinho que a dor já ia embora. Ele morreu antes de o socorro chegar, e então prometi a mim mesmo que ajudaria qualquer outro animal que se encontrasse nessa situação ou que precisasse de qualquer ajuda.

Eles caminham mais um pouco com Dante, o cão de Bruno, prestando atenção no balançar das folhas e no barulho que seus pés - e patas - fazem.

-- Eu e minha irmã tivemos uma cadela quando éramos crianças. -- Vivian confidencia depois de um tempo. -- Também a vimos morrer.

-- O que houve?

-- Ela estava prenha. Fugiu uma noite sem que nós percebêssemos. No dia seguinte, vimos que a cabeça dela sangrava. Provavelmente alguém jogou uma pedra nela ou, não sei, bateram nela. Ela perdeu muito sangue, tadinha. Nem ela nem os filhotes aguentaram chegar na clínica. Acho que eu tinha uns oito anos. Lembro que eu chorei muito. Não entendia como alguém podia fazer mal para um animal indefeso.

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