1. Contextualizações

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- O que você pensa que está fazendo?
- Você sabe exatamente qual é a resposta.


 Eu e Caroline, minha melhor amiga, nos preparávamos para nossa primeira festa. Os ex-colegas de classe não nos atraíam, mas a boate em que estariam todos espremidos sim. 

 - Como se sente? - perguntei quando terminamos de nos arrumar.
 - Jovem, e você? - ela riu enquanto se olhava no espelho. 
 - Um pouco humilhada porque deveríamos ter vivido isso aos 15 anos, não aos 20.
 - Antes tarde do que nunca!

 Chegamos suficientemente atrasadas e pelo menos 90% dos convidados já haviam chegado. Logo na entrada reconhecemos alguns rostos, a contragosto.

 - Estou começando a me arrepender de ter vindo - murmurou Carol.
 - Logo não estaremos reconhecendo nem à nós mesmas - observei com humor.

 Encontramos dois banquinhos em uma localização que nos oferecia uma visão privilegiada de toda a festa, afinal precisaríamos saber onde ficavam as saídas de emergência se fosse necessário.
 Após 3 músicas e alguns drinks, um rosto do qual eu havia me esquecido completamente destacou-se na multidão. Noah Jacob Urrea  adentrou o local em seu jeans desbotado e camisa preta, quase um Cullen. Seu fã clube logo se mobilizou, fazendo ecoar diversos murmúrios e até mesmo alguns gritinhos completamente incompatíveis com a nossa faixa etária.

 - Certas coisa nunca mudam, pelo jeito... - comentei revirando os olhos.
 - Ai, Gey, eu até entendo... Ele tá realmente bonito.
 - Completamente superestimado.
 - É compreensível você não gostar dele, mas dizer que não é esteticamente agradável...
 - Já deu, mo - levantei-me e peguei seu copo - vou buscar mais um pouco.

 Em uma contextualização rápida, Noah uniu duas coisas completamente improváveis durante o ensino médio: ser estranho e altamente popular. Meninas e meninos moveriam montanhas para receber um pouquinho de sua atenção. O típico garoto problema completamente endeusado e inatingível. Mas por que eu o odiava tanto? Assim que Urrea chegara no colégio, fui encarregada de ajudá-lo a se adaptar. Nossa relação nunca foi muito estreita, apenas conversávamos o necessário com a educação devida. No entanto, assim que o período de adaptação chegou ao fim, o novato educado tornou-se frio e rude, especialmente comigo.

 Ele era um mistério que todos queriam desvendar, mas seus olhares repletos de desprezo me mantiveram sem nenhum tipo de interesse no mais novo badboy. Esse título, a propósito, foi-lhe atribuído exclusivamente devido ao seu jeitinho evasivo, personalidade fechada e respostas curtas e grossas. Noah não era do tipo baderneiro, apenas construiu uma muralha em volta de si com um milhão de armas apontadas a quem tentasse ultrapassar seus limites e, acredite, ele não hesitava em disparar. Obviamente, ele abria algumas exceções, especialmente para garotas tomadas pelos hormônios e pela vontade de experimentar o que ele tinha a oferecer, o que claramente não era uma ajudinha nas questões de geometria.

 Chegando ao bar, pedi duas bebidas das mais fortes, afinal aquela seria A noite. Voltei ao nosso cantinho com visão panorâmica e entreguei a de Carol, que já estava muito bem acompanhada.

 - Tem gente que realmente não muda nadinha... - sorriu Krystian Wang, que abandonara os cachinhos loiros e tinha os fios pretos perfeitamente bagunçados emoldurando seu rosto absurdamente perfeito. 

O programa de intercâmbio o trouxe da China, por motivos estranhos, para nosso colégio no terceiro ano. Apesar de quieto e completamente "na dele", meu jeitinho extrovertido e extremamente desprovido de noção o trouxe para nosso pequeno grupinho. Ele se dava muito bem com Carol, provavelmente devido à semelhança de personalidade e eu, no fundo, acreditava que algo brilhava secretamente entre os dois.

 - Krys! - o abracei com bastante entusiasmo. - Você disse que estava em outro continente! - dei um tapinha em seu ombro.
 - Eu queria fazer uma surpresa, ok? - ele fez biquinho.
 - Estou extremamente surpreendida, meus parabéns!
 - Você tá a exata mesma coisa pessoalmente, talvez mais bonita...
 - Tipo o Noah - Carol murmurou enquanto franzia o nariz, o típico sinal de que estava me provocando.
 - Eu encontrei com ele lá embaixo, devo concordar com você - ele bebia tranquilamente meu coquetel enquanto eu imitava os dois no estilo: dEvO cOnCoRdAr CoM vOcÊ.
 - Ah que ótimo, parece que alguém roubou minha bebida... Bom que eu não preciso ouvir vocês enaltecendo aquele completo boboca.
 - Os xingamentos continuam maravilhosos... - observou Krys enquanto eu ia pegar outra bebida.

 As luzes piscavam veementemente sobre a pista de dança suspensa e os corpos se moviam freneticamente a cada flash. O piso cintilava com pequenos leds circulares, enquanto as paredes possuíam inúmeros desenhos formados por fios de neon colorido. O espaço possuía vários banquinhos, poltronas e puffs. Muitas pessoas já aproveitavam o local da melhor maneira possível: se beijando intensamente sem o menor pudor. É assim que são as festas, afinal... Eu sinceramente começava a ter vontade de me misturar, mas ainda existia sobriedade demais em mim. Entretanto, não demoraria muito para ela deixar de existir completamente. Mas isso teria que esperar uma ida rápida ao banheiro.

 No trajeto dos banquinhos até o banheiro, que atravessava a boate, a cada passo uma voz diferente murmurava o nome dele. Quantos copos eu deveria tomar para ignorar completamente o fã clube do Urrea? Falando nele, por sorte eu se quer o tinha visto mais do que o necessário. Quatro anos já tinham passado, talvez ele tivesse mudado, mas eu duvidava disso. No fundo, eu queria tirar a prova, saber se ele continuava sendo um babaca. Eu gostava de acreditar que as pessoas mudam, mas não achava que seria possível no caso de Noah. Uma pena, assim eu não seria mais uma no time de lambedoras de chão antes do bonitão passar. 

  Pelo menos era o que eu pensava... e talvez estivesse certa.

  Ou completamente errada.

 A música ecoava, preenchendo cada espaço vazio.

Maybe you're right, maybe this is all that I can be
But what if it's you, and it wasn't me?

Talvez você esteja certa, talvez isso seja tudo o que eu possa ser
Mas e se fosse você e não eu?

A porta do banheiro feminino se abriu e uma garota loira, cujo nome eu realmente não conseguia lembrar, saiu com um sorriso malicioso nos lábios enquanto arrumava sua saia. Ignorei-a completamente e caminhei na direção da porta, quando mais alguém passou por ela afivelando o cinto. A festa realmente estava boa para alguns, pensei. Quando seu rosto se ergueu, meu corpo estremeceu por completo e minha respiração ficou descompassada, como se eu tivesse corrido uma maratona. Aqueles olhos verdes. Intensamente verdes. Maldito Urrea.

A Little DeathOnde histórias criam vida. Descubra agora