9. Medo

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 Meu coração disparou e, por alguns segundos, eu me esqueci completamente como respirar. Eu sabia que aquilo iria acontecer e, na verdade, no fundo eu queria que acontecesse.  Ela mandou um pequeno texto sobre como eu era uma ótima pessoa, mas não estava funcionando e merecia uma pessoa melhor, que li rapidamente e respondi de maneira simples e direta. Não demorou muito para que eu perdesse completamente a compostura e praticamente implorasse para que ela não me deixasse, totalmente em vão.

 Eu senti meu peito ser dilacerado completa e lentamente. Não, não estávamos bem. A distância também me corroía, mas eu tentava ser forte. Eu a sentia cada vez mais distante e tinha tanto medo. Medo de perder a ela e, principalmente, à nós.

 Foram três dias sem conseguir comer direito. Meu único desejo era que as horas passassem o mais depressa possível e que o tempo logo curasse aquelas feridas tão profundas. Eu a amava com todo meu coração, Josh. Eu nunca fui de querer me imaginar com pessoas no futuro, nunca consegui, mas com ela era diferente. Éramos idênticos em determinados pontos e complementares em outros, a combinação perfeita. Não se encontra alguém como ela todos os dias e eu não queria encontrar mais ninguém: eu a tinha encontrado. Eu simplesmente não precisava de mais nada.

 E daí se eu ficava ansioso por um mínimo contato? E daí se tivesse alguém melhor? Eu realmente não me importava. Eu poderia esperar, suportar e relevar quase tudo, se fosse por ela.

 Mas isso não era o suficiente.

 Eu não era o suficiente.

 E, a cada vez que me lembrava disso, queria que tudo ao meu redor desaparecesse, inclusive eu.

 - Pelo jeito você gostava muito dessa garota... - Josh parecia sem palavras.

 - Você nem faz ideia.

 Conversamos algumas vezes após o término, mas tudo aquilo apenas servia para fazer com que eu me sentisse mais confuso. Eu queria que ela soubesse que eu estava ali, que não tinha desistido, para que se ela mudasse de ideia não pensasse que eu não a queria mais. Minha consciência dizia o tempo todo de que jamais encontraria alguém que me fizesse rir como ela, que me beijasse como ela.

 E, no final das contas, de tanto medo de não a perder

 Perdi a mim mesmo

 Demorou um pouco, mas consegui me reencontrar. Já não era mais a mesma pessoa e nem queria ser. Foi aí que eu decidi que não me deixaria apaixonar por mais ninguém.

 - E conseguiu?

 - Bem... Você só está doente se for ao médico - sorri.

 - Na verdade, você está doente de qualquer forma, só não vai saber se é sério ou não.

 - Nesse caso, quase sempre é sério o suficiente para te destruir.

 - Não acha que está exagerando um pouco, cara?

 - Claro que estou, eu sempre exagero. É exatamente por isso que quero evitar qualquer tipo de contato, entende?

 - Então você vai se afastar de qualquer possibilidade de se apaixonar por alguém simplesmente porque não quer se magoar de novo?

 - Exatamente. 

 - Desculpa avisar amigão, mas você já está apaixonado - Josh deu-me um tapinha no ombro.

 - Óbvio que não, está tudo sob controle.

 - Isso vai ser interessante...

 - O que, Joshua?

 - Não precisa conhecer a Gey pra saber que ela ama ter o controle de tudo, acho que teremos uma competição.

 Apenas joguei uma almofada nele e fui buscar alguns snacks para cortar o assunto.
 Era bom falar sobre tudo aquilo, como se séculos de emoções acumuladas, de repente, não estivessem mais em meus ombros. Eu me sentia tão leve quanto quando finalmente entendi.

 Entendi que não importa o quanto você ama alguém.
 Não importa quantos eu te amo você diga do fundo do seu coração.
 Não importa quantos incômodos você suporte para não incomodar.
 Não importa quantas músicas ou textos de amor você escreva.
 Não importa que você esteja disposto a tudo.
 Se alguém não te ama, isso não significa nada.

 Talvez eu realmente jamais encontrasse alguém como ela. Talvez nenhum outro beijo encaixasse como o nosso. Talvez não tivesse volta. 

 E, sinceramente? Estava tudo bem. Eu havia dado o melhor de mim do começo ao fim e, sinceramente, não queria que tivesse um fim. Deixaria de amá-la? Provavelmente não, mas não me tornaria refém de um sentimento unilateral. 
 Quatro meses após esse lapso de sobriedade, lá estava eu lutando bravamente contra mais um sentimento. Seria esse meu destino? Reprimir emoções para não ser engolido por elas?

 Comecei a sair com algumas garotas do colégio, afinal todos temos necessidades, não é mesmo? Era divertido, mas nada sentimental, do jeito que deveria ser. Após a formatura, comecei a fazer alguns trabalhos com música e - você nem vai acreditar - como modelo também.

 Quando soube da festa de reencontro nem hesitei, seria ótimo ver de novo meus antigos amigos e... algumas pessoas que não eram tão próximas assim. Seria divertido sentir toda a nostalgia e ver rostos conhecidos.

 Logo que cheguei notei alguns murmúrios, normal para uma celebridade, talvez. Observei as expressões ao meu redor e, ao longe, encontrei um semblante que continha todas as emoções possíveis. Não saberia dizer se estava com raiva, triste, feliz ou com fome, mas Geysa estava estonteante com um vestido preto e os cabelos longos emoldurando as infinitas expressões. Por sorte, eu estava profissional em esconder minhas emoções através do desprezo no olhar.

 - Ela está extremamente gata, não é? - Josh apareceu do nada, dando-me um abraço apertado.

 - E aí, cara? - sorri.

 Em alguns minutos o trioestava reunido novamente: Sabina, Josh e eu. Bebemos alguns drinks e logo Jasmyne apareceu balançando seus cabelos loiros que pendiam em cachos pesados em seu ombro.

 - Noah - sorriu segurando meu braço. - Emergência no banheiro, "aquela" emergência.

 Apenas a acompanhei em silêncio. Jasmyne era uma das amigas populares de Sabina, completamente apaixonada pelo intercambista chinês, Krystian. Ele era um cara legal, apesar de não sermos exatamente melhores amigos.

 - Você é tão discreto que me... - sorriu, assim que fechamos a porta do banheiro.

 - Claro, claro... Por que não podemos fazer isso lá fora?

 - Ousado... Mas não. Sabe que não quero que vire fofoca.

 - Ninguém liga se você toma remédio pra vertigem.

 - Eu ligo - estendeu a mão. - Passa logo pra cá.

 - Você é impossível... - a entreguei a cartela com duas cápsulas.

 - Não tanto quanto você - sorriu. - Vamos?

 - Pode ir na frente, preciso usar o banheiro.

  - Você sabe que esse é o banheiro feminino, certo?

 - Já estou aqui mesmo...

 - Levante a tampa. Obrigada, Noah - beijou minha bochecha.

 - Disponha - sorri. - Acho que sua saia está torta.

 Jasmyne mostrou o dedo e em seguida saiu do banheiro ajeitando a saia.

 Eu pretendia sair o mais rápido possível dali, era uma festa, mas ainda assim haviam regras básicas de convivência.
 Ao abrir a porta, lá estava ela.

 E, naquele momento, tudo o que eu mais queria era...

A Little DeathOnde histórias criam vida. Descubra agora