Ele

43 8 9
                                    

• A V I S O •
Esse conto é passível de gatilho! Se você tem algum distúrbio psicológico ou tem gatilhos por temas como suicídio, por favor
NÃO LEIA O SEGUINTE CONTO



⚠️⚠️⚠️⚠️






Vagabunda.

Vadia.

Imprestável.

Inútil.


Ele gritava em meus ouvidos. Sentia meu corpo vibrar, tremer com cada ofensa que meu sentido auditivo absorvia.

Eu não aguentava mais aquilo.

Eu não aguentava mais ele.

Não importava se meus olhos estavam abertos ou fechados ou se meus ouvidos, de alguma forma, fossem tapados, ele continuava lá, gritando. Ao meu lado.

Existiu um tempo em que eu usava fones de ouvido, músicas. Não precisava ser do gênero que eu gostasse, só do gênero que o fizesse ficar quieto. Que o fizesse calar a boca.

Por um tempo funcionou, não nego. Me afastei de tudo e de todos, mas era por uma boa causa. Eu não o ouvia.

Pouco importava.

Ele estava ali, mas eu não o ouvia.

Como eu disse, a música funcionou por um tempo.

Mas como tudo que é bom dura pouco, de alguma forma, de alguma maneira ele fez com que sua voz se tatuasse em minha mente. Eu não o ouvia só do lado externo.

Sua voz ecoava em meu ser. Tentei contar aos meus pais, mas segundo eles, amigos imaginários são para criança, Claire.

Faça amigos novos.

Amigos de verdade.


A M I G O S.

Essa palavra ecoou em minha mente quando fora inserida, girando junto com os xingamentos e frases com teor assassino.

Mate-a, Claire.

Uma vagabunda imprestável como você.

Faça isso.

Eu queria gritar. Não tinha para onde ou como fugir. Ele sempre estava ali.

Por um tempo suas frases não penetravam as barreiras dos meus valores. Eu o continuava negando, como um crente nega ao Diabo.

Eu o negava. Sentia orgulho nisso.

Contudo, até que ponto vale seu orgulho? Até quando vale a pena se agarrar nele?

O meu? Durou dois meses e meio.

Pouco, você pensa.

Isso para mim foi uma eternidade.

Dizem que no inferno a contagem de anos, do tempo é diferenciado. Eu estava no inferno. Talvez seja por isso. Talvez seja por tudo isso que estou sendo levada a fazer isso.

Como eu disse antes, eu não aguentava mais ele.

Faça, sua imunda.

Vadia.

Vagabunda.

Ninguém irá se importar.

Foi nesse momento que ele ultrapassou minha barreira e eu pensei: Será que isso era verdade?

Imagens, cenas de minha vida foram passando em minha cabeça como um filme mal feito, fazendo com que eu chegasse à conclusão: Ele estava certo.

Caminhei até o banheiro e pela última vez me olhei no espelho.

Cara de vagabunda.

– Sim. – Concordei com ele pela primeira vez em voz alta.

Ao pegar uma das minhas giletes, retirei uma de suas lâminas e pensei: Agora ele irá dizer algo.

Contudo, pela primeira vez houve silêncio.

O silêncio existia, assim como ele.

Existia até eu não existir.

𝕮𝖔𝖓𝖙𝖔𝖘 𝖉𝖆 𝕸𝖊𝖎𝖆-𝕹𝖔𝖎𝖙𝖊Onde histórias criam vida. Descubra agora